Sorrisos e ambição: as polêmicas de Tavolaro, o novo empreendedor da mídia
O jornalista e empresário Douglas Tavolaro, 47, sempre quer mais.
De jovem produtor na Record, onde chegou a vice-presidente e braço direito do bispo Edir Macedo, ele se tornou um executivo capaz de trazer para o Brasil marcas gigantes do jornalismo dos EUA.
O primeiro voo solo foi em janeiro de 2019, quando deixou a TV paulista para fundar e comandar por pouco mais de dois anos a CNN Brasil, franquia do canal de notícias norte-americano.
No ano passado, lançou o canal de negócios Times Brasil, que tem uma parceria de conteúdo exclusivo com a CNBC. Ele é dono e CEO da nova emissora.
Sorridente e persuasivo, o jornalista é considerado por ex-colegas alguém que sempre tem uma resposta para convencê-los a fazer sua vontade.
Mas, se preciso, Tavolaro encerra ciclos sem olhar para trás. Desfaz amizades de longa data se elas interferirem em seus planos.
Prova disso é que apenas um dos braços direitos que levou para a CNN sobreviveu para o projeto Times Brasil.
Tavolaro também deixou pelo caminho algumas polêmicas em sua trajetória profissional de pouco mais de 20 anos.
O UOL entrevistou dezenas de pessoas que trabalharam com Tavolaro dentro e fora das empresas. Ouviu, ainda, fontes ligadas ao mercado publicitário e empresários. As identidades serão mantidas em sigilo.
Ele carrega consigo acusações de irregularidades em contratos com fornecedores, além de brigas com ex-sócios e falta de transparência com o mercado.
Em entrevista ao UOL, o jornalista nega todas as acusações.
Do bispo a Menin
Tavolaro pensava em comprar a franquia da CNN desde quando era vice-presidente da Record.
O projeto envolvia o bispo Edir Macedo, dono da TV paulista, mas foi abortado porque a CNN não vende franquias a empresas ligadas a igrejas e à política.
Naquele momento, em 2018, a ascensão de Tavolaro e sua proximidade com Macedo incomodavam outros membros da igreja Universal no comando da emissora.
Os laços entre Tavolaro e Macedo se fortaleceram quando o jornalista escreveu a biografia do bispo, publicada em 2007.
Essa relação era sólida a ponto de Macedo sair de Portugal, onde mora, para fazer a cerimônia do segundo casamento do pupilo, mesmo sendo a Universal contrária ao divórcio.
Ainda que prestigiado pelo chefe, Tavolaro se sentia "fritado" por parte do círculo próximo a Macedo.
Somada a esse cenário a negativa da CNN em fechar com a Record, o jornalista viu ali uma oportunidade para mudar de ares e criar uma nova empresa.
As negociações sobre o alinhamento editorial da franquia brasileira foram discutidas em algumas viagens de Tavolaro a Atlanta (EUA), sede da CNN.
Ele foi sabatinado por jornalistas e executivos que queriam verificar se ele atendia aos requisitos.
Como não fala inglês, ele teve ajuda de Sebastian Laver, head de conteúdo e parcerias da CNN para a América Latina.
Aprovado, Tavolaro ainda precisava do dinheiro para a licença e, com isso, poder usar integralmente a marca CNN no Brasil.
O novo investidor em potencial também teria que passar pelo crivo dos norte-americanos.
Para viabilizar o projeto, o jornalista fechou com o empresário e bilionário Rubens Menin para ser esse investidor.
Menin é dono do banco Inter e da construtora MRV, entre outras empresas, além de sócio da SAF do Atlético-MG.
A proposta a Menin, segundo apurou o UOL com fontes próximas ao banqueiro, foi embasada pela ascensão da direita no Brasil.
Tavolaro disse a Menin que, com a eleição de Jair Bolsonaro como presidente em 2018, o empresário teria dificuldades em Brasília.
A MRV, construtora de Menin, foi responsável pelos empreendimentos do "Minha Casa, Minha Vida", projeto de moradia dos governos Lula e Dilma.
Segundo Tavolaro, ser um barão da mídia evitaria que Menin perdesse esse espaço pela sua ligação com os petistas. Ele continuaria se relacionando com a política.
Menin topou, o que permitiu a Tavolaro ousar no projeto.
O jornalista escolheu uma sede na Avenida Paulista, contratou medalhões da Globo, diretores que estavam na Record e montou uma equipe com cerca de 800 profissionais.
A estreia do canal, em março de 2020, fez barulho. Com contratos publicitários e prêmios, o caminho era promissor. Mas Tavolaro queria mais.
No fim, sala trancada na CNN
Ainda na Record, Tavolaro havia ganhado uma fortuna incomum até para os mais bem-sucedidos jornalistas.
Mas se o "querer mais" característico de Tavolaro o levou a liderar a negociação que trouxe a CNN ao Brasil, o mesmo modus operandi custou sua participação na empresa.
Em 2021, um ano depois da estreia da CNN, ele cogitou tirar Menin do negócio, mas acabou tendo que entregar ao então sócio a emissora que idealizou.
Divergências editoriais, gastos excessivos e disputa pelo controle acionário pautaram a briga.
A família de Menin se incomodava com o fato de o empresário bancar as escolhas de Tavolaro —o banqueiro detinha 75% da empresa.
O jornalista, dono do restante, detestava ter de abaixar a cabeça ao sócio, que começava a opinar na área editorial.
Foi quando Tavolaro traçou um plano para comprar a parte de Menin.
Ele procurou outros empresários e até mesmo o grupo político do então presidente Bolsonaro. Por meio desses contatos, conseguiu um fundo brasileiro para ajudá-lo a controlar a CNN.
Mas Menin, com suas relações, descobriu a articulação.
Em março de 2021, eles se reuniram a portas fechadas com mais de uma dezena de advogados.
Ambos sabiam que, naquele dia, um deles sairia da empresa.
Quando a conversa terminou, o jornalista conversou com os executivos do canal, que aguardavam o desfecho.
"Como foi?", perguntou um deles.
"Péssimo. Estou fora", respondeu Tavolaro.
No mesmo dia, a sala do jornalista foi trancada.
Com algumas dezenas de milhões na conta pela venda de suas ações, ele passaria a planejar a CNBC Brasil, que veio a se tornar o Times Brasil.
Uma produtora por R$ 3 milhões
Enquanto presidiu a CNN Brasil, Tavolaro foi responsável por contratos cujos valores não se justificavam.
É o que contam ao UOL executivos da emissora, que afirmam até hoje ter de reparar os prejuízos.
O mais emblemático deles foi o contrato com a produtora Casablanca, que chegou a custar R$ 3 milhões mensais.
A empresa ainda presta serviços para o canal, mas com valor de contrato reduzido pela metade.
Tavolaro afirma que o discurso de prejuízo é uma tentativa de descredibilizar seu novo negócio, o Times Brasil.
O jovem Douglas
Tavolaro foi contratado pela Record em 2004. Membro da Igreja Universal, caiu nas graças dos bispos na emissora e virou diretor de jornalismo aos 27 anos.
Autor do livro "O Reino - a História de Edir Macedo e uma Radiografia da Igreja Universal", o jornalista Gilberto Nascimento afirma ao UOL que "Douglas foi preparado pela igreja para assumir a função".
Após levar a audiência do jornalismo da emissora a níveis inéditos, virou vice-presidente da Record em 2009.
Mas, antes de chegar à TV, Tavolaro foi repórter da IstoÉ. Na revista, se destacou com uma reportagem sobre uma rebelião no Carandiru —ele estava dentro da penitenciária quando o motim começou.
A história virou livro e, com o dinheiro do projeto, ele comprou seu primeiro apartamento, em frente ao necrotério de um hospital.
"Acordava frequentemente com os gritos de quem recebia a notícia da morte de alguém", conta o jornalista, em sua biografia "Breaking News".
Duas décadas depois, Douglas vive hoje em uma mansão avaliada em R$ 50 milhões no Jardim América, bairro nobre da zona oeste da capital paulista.
As vantagens de um único dono
No Times Brasil, empresa que tem Tavolaro como único sócio, a ala da presidência tem duas salas, uma delas com sofás em linho e iluminação indireta, além de uma recepção própria.
No banheiro, o gabinete da pia é de mármore preto e dourado.
Tavolaro se casou e se separou duas vezes. Hoje solteiro, mas não sozinho, ele se diverte em baladas sertanejas e está em aplicativos de paquera voltados a ricos. Ainda assim, prioriza o trabalho.
Enquanto recebia o UOL na sede da emissora, ele se incomodou com a imagem de um entrevistado no canal.
Pediu um minuto e fez uma ligação: "Olha o fundo desse cara. Não dá, né?", resumiu.
Considerado um chefe centralizador, que não desliga e exige o mesmo de seus cargos de confiança, participa de todas as decisões da empresa.
O plano dele era usar a marca CNBC como nome do canal, mas a falta de dinheiro para a licença e o alinhamento às vésperas do lançamento com a matriz levaram Tavolaro e bancar o projeto como Times Brasil - Licenciado Exclusivo CNBC.
Além de ter de lidar com anunciantes confusos com a mudança, Tavolaro também tenta amenizar a insatisfação dos funcionários.
O UOL conversou com alguns deles e, sob condição de anonimato, todos confirmaram que foram contratados acreditando que o canal se chamaria CNBC.
Sozinho e sem investidores, Tavolaro ainda quer convencer o mercado que o Times Brasil é CNBC.
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