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Escultor do museu de cera no Paraná vira meme, mas agradece: 'é divulgação'

O escultor Arlindo Armacollo e sua Madre Teresa de Calcutá de cera - Fernando Cremonez/UOL
O escultor Arlindo Armacollo e sua Madre Teresa de Calcutá de cera
Imagem: Fernando Cremonez/UOL

Vinicius Konchinski

Colaboração para o TAB, de Curitiba

09/01/2021 04h01

O empresário Arlindo Armacollo, 77, acredita que tudo na vida tem um propósito, e que cada ser humano é capaz, por meio de sua força de vontade, de alcançar seu objetivo. "Se você não sabe tocar violão é porque não quer. Basta querer, se esforçar e aprender", diz ele.

Resoluto, ele mesmo, que já foi bancário e hoje é dono de imobiliária e outros negócios, resolveu virar artista plástico. Pinta e esculpe. Tomou aulas, treinava nos finais de semana e em horas vagas. Criou um ateliê num cômodo vazio de sua casa, em Rolândia (PR).

Foi lá que produziu mais de 80 telas e cerca de 30 esculturas de cera — entre elas, as agora nacionalmente conhecidas de tamanho real. Os Mahatma Gandhi, Ayrton Senna, Martin Luther King e Lady Di fabricados por ele são resultado desse aprendizado feliz e temporão. A técnica de Armacollo é moldar a cera por cima de manequins de lojas de roupas.

Na primeira semana de 2021, as peças sorridentes viraram um dos assuntos mais comentados da internet. Nasceram para virar memes.

O artista acabou viralizando como a devotada restauradora Cecilia Giménez, a espanhola que, em 2012, tentou retocar o rosto de Cristo em um afresco do santuário de Borja. Ele, porém, não se abala. Firme na crença do propósito, afirma: "Toda essa repercussão foi até boa, viu? Divulgou meu trabalho. Era para ser".

E nasce um mito

As postagens e as piadas sobre as esculturas de Armacollo reproduzem fotos e um vídeo do jornal paranaense Folha de Londrina, em 2015. O material faz parte de uma reportagem sobre a inauguração da exposição com obras do empresário, realizada na Paróquia São José.

No vídeo sobre a exposição, ele aparece sorridente, orgulhoso, falando que todos os seres humanos são muito parecidos. Há, entretanto, características peculiares que tornam uma pessoa diferente da outra. "São os detalhes", resume. "As expressões do rosto, a forma de olhar, as curvas da boca, o tamanho dos lábios?"

Boa parte da repercussão do vídeo e da reportagem aponta a carência de semelhança entre "os detalhes" das esculturas e "os detalhes" das personalidades retratadas.

Armacollo rebate. "Fizeram umas fotos de uns ângulos meio esquisitos. Isso aí não ajudou", disse. "Na época em que a exposição foi aberta, foram colocadas fotografias das personalidades retratadas ao lado de cada escultura. Ninguém falou que estavam diferentes, viu?".

O empresário contou que, só mais recentemente, algumas esculturas acabaram perdendo seu traço de realismo — isso porque não foram devidamente conservadas enquanto estavam expostas na igreja. Tiveram também algumas partes roubadas, o que comprometeu seu trabalho.

"As esculturas ficaram abandonadas. Isso causou danos, né", reclamou. "Chegaram a roubar a boina do Chico Xavier, por exemplo. Aí não tem jeito."

Armacollo no Museu de Cera de Rolândia - Fernando Cremonez/UOL - Fernando Cremonez/UOL
Armacollo no Museu de Cera de Rolândia
Imagem: Fernando Cremonez/UOL

Fé e propósito

Armacollo é católico praticante. Pela proximidade com o então padre responsável pela paróquia São José, o monsenhor José Ágius, é que suas esculturas seculares foram parar na igreja.

A história é a que segue: a paróquia tem uma torre, construída décadas depois de sua inauguração em 1942. Na torre havia uma área desocupada, uma espécie de mezanino.

Belo dia, em 2014, Armacollo e padre Ágius conversavam sobre espaço. Na época, o empresário tinha acabado de concluir sua primeira escultura, retratando Madre Teresa de Calcutá. Ele disse ao padre que pretendia produzir outras obras como aquela, e sugeriu expô-las todas na igreja. "O padre era muito 'cabeça aberta', sabe? Topou na hora."

Armacollo, então, começou a produzir em série as outras 19 esculturas da exposição, chamada de "Amigos de Deus". O empresário fez tudo sozinho, aprendendo conforme ia trabalhando nas obras. "Bem, eu sabia que uma estátua de cera era de cera, né? Comprei a cera. Agora, como amolecer a cera, dar cor, fazer as texturas, isso tudo eu fui pesquisando e aprendendo sozinho."

O escultor com o personagem Chaves - Fernando Cremonez/UOL - Fernando Cremonez/UOL
O escultor com o personagem Chaves
Imagem: Fernando Cremonez/UOL

Foi no processo que o empresário descobriu a hora certa de dar cor aos retratados. Pensava que poderia concluir cada escultura e só depois pintá-la, mas o melhor era misturar a tinta na cera antes de esculpir. Pintura posterior, somente nos detalhes.

Armacollo também aprendeu por conta própria que as mãos das estátuas precisavam de uma estrutura de arame para que não quebrassem. Usou cascas de laranja para moldar a textura irregular da pele.

Ainda comprou perucas, unhas postiças e encomendou dentaduras para cada estátua. Importou os olhos da Inglaterra. "Aqui no Brasil não fabricam os olhos como eu precisava", justificou.

Também adaptou com recursos próprios o mezanino da igreja para a exposição. Segundo ele, realizou todos os investimentos pensando no bem da cidade. "Graças a Deus eu posso. Fiz porque quis."

Há cerca de dois anos, padre Ágius deixou a Paróquia São José. Foi após a transferência que Armacollo se deu conta de que suas esculturas não estavam sendo bem cuidadas. "Montaram um estúdio no mezanino. As obras estavam num cantinho. Aí resolvi tirar de lá."

O museu de cera de Rolândia (PR)

Homem das artes

No final de 2019, Armacollo já trabalhava na ideia de abrir um museu próprio, em Rolândia. Resolveu usar um dos imóveis que tem na cidade para expor outras esculturas que havia produzido depois de 2015, além de telas de temáticas variadas que havia pintado desde 2000, quando tomou suas primeiras aulas de pintura.

O museu Izidoro Armacollo, nome do pai de Arlindo, foi inaugurado em 2020. Foram levadas para lá mais de dez estátuas que haviam sido expostas pela primeira vez na igreja. "Estou restaurando uma a uma e expondo novamente", explicou.

A pandemia impediu a visitação ao museu. Disse até que, por conta das críticas que suas obras receberam na internet nesta semana, três de seus netos chegaram a pedir que ele repensasse se deveria mesmo expor seu trabalho ao público e, por consequência, ao escrutínio geral dos internautas.

"Uma de minhas netas, que tem 13 anos, chegou a chorar, sabe? Disse que gostava muito do avô. Não queria ver ninguém zombando de mim, né?" contou ao TAB.

A questão do propósito, então, de novo veio à conversa. "Mandei uma mensagem para todos no grupo de WhatsApp da minha família", disse Amarcollo. Ele conta nem ter visto essa falação toda. Soube pelos filhos (ele tem quatro) e netos (tem sete). "Isso não me afeta, viu? Quando você faz alguma coisa com gosto, sem depender de ninguém, não precisa dar satisfação para ninguém também. Estão é me divulgando."

Arlindo Armacollo termina a conversa fazendo um convite geral para uma visita ao seu museu — mesmo com pandemia. O espaço fica na avenida Romário Martins, 626, no centro de Rolândia, e está aberto ao público às quartas, quintas e sextas-feiras, das 14h às 20h. Aos domingos, das 14h às 18h. A entrada é grátis e, segundo Armacollo, nenhum visitante reclamou do acervo até hoje.

No perfil do museu no Instagram, aliás, são vários os elogios. Um comentário até pede desculpas ao empresário pelas piadas da internet. "Infelizmente a piada tem vindo acima de tudo! Parabéns pelo ótimo trabalho e tempo dedicado", escreveu um internauta na última quinta-feira (7).