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MPRJ denuncia presidente da Universal Music que internou ex-mulher à força

O MPRJ (Ministério Público do Rio de Janeiro) denunciou na última quinta-feira (21) o produtor musical Paulo Lima, presidente da Universal Music, pelos crimes de cárcere privado contra ex-esposa dele, a escritora Helena Lahis, e de acesso ao e-mail dela sem permissão.

Lima é acusado de internar compulsoriamente a mulher em outubro de 2019, após ela pedir o divórcio. Helena passou 22 dias numa clínica psiquiátrica e de reabilitação no bairro de Botafogo, no Rio, impedida de contato com quem não fosse da família.

O produtor já havia sido indiciado pela Polícia Civil em julho 2021. O inquérito resultou na denúncia do MPRJ, que inclui os médicos Maria Antonia Serra Pinheiro, amiga do casal, e Gabriel Landsberg, o diretor técnico da clínica. O processo corre em segredo de Justiça.

A reportagem procurou todos os denunciados, mas não obteve retorno até a publicação deste texto.

Retrato da escritora Helena Lahis
Retrato da escritora Helena Lahis Imagem: Lucas Seixas/UOL

Denúncia

A Promotoria também denunciou a médica Maria Antonia Serra Pinheiro por cárcere privado. O documento aponta que o internamento foi "indevido" e "abusivo", que gerou sofrimento moral e mental à vítima.

Segundo o MPRJ, a médica nem "sequer apresentou à clínica —ou mesmo elaborou— laudo médico com o diagnóstico da paciente e as razões pelas quais entenderia imprescindível a sua internação forçada".

O advogado Alexandre Lopes, responsável pela defesa de Maria Antonia, disse em nota ao TAB em novembro que ela "apenas sugeriu a ida de Helena a uma clínica especializada para avaliação psiquiátrica, por conta de relatos da família".

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A defesa alegou ainda que Helena foi avaliada por outros médicos após internação e que a escritora "era visitada todos os dias por seus familiares".

Com relação ao médico Gabriel Landsberg, diretor técnico da clínica Clif, o órgão entende que houve tentativa de fraude processual. Landsberg quis prejudicar o inquérito durante a saída de Helena da clínica, diz o promotor.

"Abordou a vítima, de forma insistente e incisiva, buscou convencê-la a assinar documento declarando que sua internação havia sido voluntária, retirando, portanto, o caráter coercitivo da presença de Helena naquele local", diz a denúncia.

Separação

O TAB contou a história de Helena e Paulo em novembro do ano passado. O casal se conheceu em Petrópolis, por intermédio de um irmão dela que trabalhava com o produtor. Na época, ela tinha 17 anos, e ele, 21. Os dois se casaram em 1995.

Professora e dona de uma editora de livros infantojuvenis, Helena pediu o divórcio pela primeira vez em 2002. O marido "quebrou as coisas em casa, gritava, começou a dizer que era macumba", segundo ela.

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A escritora havia pedido novamente a separação em 28 de setembro de 2019, um mês antes de ser internada. Seguiram-se "pressões psicológicas muito fortes e insuportáveis" de Paulo para dissuadi-la da ideia, relatou à Polícia Civil o psicanalista e psiquiatra Manoel Castro Sá, médico de Helena.

Ela havia mudado de comportamento, diziam os familiares. A mãe da escritora, Maria Luiza Tavares, dizia que Helena estava "fazendo uso abusivo de remédio para emagrecer" e "escrevendo compulsivamente".

Paulo acessou o e-mail de Helena sem autorização e leu trocas de mensagem entre ela e um homem com quem iniciava um relacionamento.

"Um dia, cheguei em casa, e estavam minha mãe, minha irmã e ele na sala, queriam conversar comigo", lembrou Helena à reportagem.

"Ele mostrou todas as minhas conversas com Alex à minha mãe. Voltou a dizer que eu estava possuída. Me levantei e disse que não queria participar daquilo."

Helena Lahis na editora Lago de Histórias, na Urca
Helena Lahis na editora Lago de Histórias, na Urca Imagem: Lucas Seixas/UOL
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Internação

Em 20 de outubro de 2019, dois enfermeiros e a médica Maria Antonia Serra Pinheiro entraram no apartamento onde Helena Lahis morava com as filhas e Paulo. Disseram que iriam levá-la a uma clínica de reabilitação.

"Tomaram meu celular e perguntaram se eu iria 'por bem ou por mal'", lembra a escritora.

Maria Antonia disse à polícia que Helena estava em surto devido ao uso de medicamentos para emagrecer. Helena conta que resistiu, como pôde, ao uso de medicamentos sedativos no período em que esteve internada.

"Cheguei a esconder o remédio embaixo da língua e fingir tomar, para não ser dopada. Passei uns dias tentando falar com o médico, mas me diziam que ele ainda não tinha passado lá ou que ele ia lá."

Ninguém além da família sabia seu paradeiro, segundo ela. A escritora ia lançar um livro na semana seguinte, e o evento foi adiado. "Minhas amigas perguntavam a ele [Paulo] onde eu estava, e ele dizia que eu tinha me isolado devido ao estresse."

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A alta só foi possível com a ajuda da acompanhante de outra paciente da clínica, que levou um bilhete de Helena para o namorado dela.

Um grupo de pessoas próximas a Helena se mobilizou em contratar um advogado para pedir uma ordem judicial para a liberação. Ao pedido foi anexada uma carta do psicanalista da escritora, que atestou sua lucidez.

Ela saiu da clínica em 11 de novembro de 2019 e, no dia seguinte, registrou um boletim de ocorrência contra Paulo Lima.

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