Programa Aprendiz de SP promete 60 mil vagas, mas só criou 291
Lançado pelo governador Tarcísio de Freitas (Republicanos) há mais de um ano com a meta de mediar a contratação de 60 mil estudantes em empresas, o programa Jovem Aprendiz Paulista só resultou em 291 empregados até o momento, segundo a Secretaria de Desenvolvimento Econômico de São Paulo.
O que aconteceu
Estímulo à contratação de aprendizes é promessa de campanha de Tarcísio. Citada no programa de governo registrado na Justiça Eleitoral em 2022, a medida se tornaria realidade por meio do programa Jovem Aprendiz Paulista, lançado pelo governo do estado de São Paulo em 26 de abril do ano passado.
Programa visa contratação de alunos da rede estadual por pequenas empresas próximas às suas casas. Após um curso on-line de 10 dias oferecido pelo Estado, jovens com idade a partir de 14 anos começam a trabalhar por até 6h ao dia, quatro vezes por semana. Está prevista, ainda, uma aula semanal on-line de 4h.
No lançamento do programa, Tarcísio disse que esperava ter 100 mil contratados "em pouco tempo". Durante a cerimônia, o governador afirmou que acreditava muito no "sucesso" do programa e no "poder de transformação" da iniciativa.
Em agosto de 2023, a faixa etária atendida pelo programa foi ampliada. Antes restrita a jovens com idade entre 14 e 18 anos, a iniciativa passou a atender pessoas de até 24 anos. À época, o governo do estado anunciou que pretendia atrair bares, restaurantes e outros setores para o programa com o ajuste.
Houve 57 contratações entre março e maio. Em fevereiro, havia 1751 empresas e 22.089 estudantes cadastrados no programa. Procurada, a Secretaria de Desenvolvimento Econômico não informou o número atualizado de empreendimentos e alunos registrados.
Algumas dúvidas em relação a programa. O UOL perguntou à Secretaria sobre o tempo estimado inicialmente para bater a meta de 60 mil contratações, mas não obteve resposta. O governo também não respondeu sobre os problemas identificados desde a implantação da iniciativa.
O que explica o resultado
Vantagens não estimulam empregadores. O governo do estado oferece às empresas que entram no programa redução de 8% para 2% na fatia de salário destinada ao Fundo de Garantia e isenção de pagamento em caso de demissão, entre outros benefícios. Entretanto, isso não tem sido suficiente para que pequenas empresas se interessem em contratar jovens.
Especialistas afirmam que programa oferece capacitação em áreas nas quais jovens não têm interesse. Áreas do setor agrícola, comércio e telemarketing têm menos apelo entre adolescentes do que setores como marketing digital, que não é contemplado pela iniciativa, explicam.
Salários de até R$ 917,59 são outro problema. Para os jovens, o valor seria baixo demais, segundo especialistas em RH. Já para os empregadores, vale mais a pena contratar alguém treinado pela mesma quantia para trabalhar cinco vezes por semana do que um estudante sem experiência que só pode atuar quatro dias por semana.
Apesar de exemplo local, baixo número de aprendizes também é problema nacional. Superintendente da Febraeda (Federação Brasileira de Associações Socioeducacionais de Adolescentes), Antônio Pasin lembra que apenas 600 mil dos 34 milhões de adolescentes entre 14 e 24 anos no país atuam como jovens aprendizes.
Quais são os próximos passos do governo
Secretaria informa que programa "passa por reformulação" para ampliar adesão. Em nota, o órgão afirmou que tem realizado "oficinas regionais e ampla divulgação" da iniciativa para aumentar o número de vagas disponibilizadas por empregadores.
Regras precisam ser modernizadas, diz especialista. Pasin afirma que o projeto de lei que cria o Estatuto do Aprendiz aguarda votação na Câmara dos Deputados desde 2019. Texto cria requisitos mínimos para capacitação e permite a contratação de jovens aprendizes por órgãos públicos, entre outros ajustes.
Especialista defende reformatação de programa com foco maior em escola. Segundo Amaro, iniciativas ligadas a jovens aprendizes deveriam ofertar capacitação técnica e profissionalizante aos alunos nos colégios — o que facilitaria a identificação e retenção de talentos por empresas interessadas posteriormente.
Há exemplos de sucesso. A empresa de marketing digital Kipiai começou em maio uma capacitação de três meses com 10 alunos da rede pública paulista focada na área e em habilidades comportamentais importantes para o mercado de trabalho. Segundo os responsáveis, a resposta dos jovens foi muito positiva.
O que disseram
O Estado vai abraçar esse jovem para que o crime não [o] abrace. A gente precisa abraçar esse jovem primeiro, abrindo a porta do mercado de trabalho com uma oportunidade perto da casa dele, o que é importante (...) Eu tenho certeza que isso vai mudar trajetórias
Tarcísio de Freitas (Republicanos), governador de São Paulo, no lançamento do Jovem Aprendiz Paulista
A aprendizagem não pode ser vista como uma obrigação, mas como um investimento. No caso do Jovem Aprendiz Paulista, o incentivo para contratação de jovens por micros e pequenas empresas, que legalmente não têm essa obrigação, esbarrou na falta de estímulos -- o que pode explicar o baixo número de contratações
Antônio Pasin, Superintendente da Febraeda
Minha chegada ao mercado de trabalho se deu por meio de um programa de jovem aprendiz dezessete anos atrás. Foi minha porta de entrada para a área de RH, onde estou até hoje. Entrei como jovem aprendiz e, 10 anos depois, saí como diretor de área. Antes disso, eu não sabia nem o que era holerite
Marcello Amaro, Diretor de Recursos Humanos da empresa de gestão de pagamentos Portão 3
A capacitação em marketing digital gerou interesse dos alunos, por se tratar de um tema que eles conhecem. Já na primeira aula, vários chegaram com perguntas prontas e tivemos muitas trocas. Todos os participantes deixaram bem explícito que consideravam aquela oportunidade única.
Silmara Araújo, head de gestão e gente da Kipiai
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