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Sóstenes condiciona liberar dinheiro para creche a voto em candidato aliado

O deputado federal Sóstenes Cavalcante (PL-RJ) gravou um vídeo, divulgado em redes sociais, em que promete liberar uma emenda parlamentar de R$ 600 mil para a construção de uma creche se um candidato a vereador em Teresópolis (RJ) for eleito.

O vídeo foi divulgado no dia 12 deste mês nas redes sociais por Vicente Dantas, candidato a vereador em Teresópolis pelo Agir.

Ele aparece ao lado de Sóstenes, que faz a promessa da liberação do dinheiro público caso a população vote no aliado.

"Estou deputado até 2026 e estou assumindo um compromisso", anunciou Sóstenes, autor do polêmico projeto antiaborto.

Se vocês de Vieira [bairro de Teresópolis] votarem nele e elegerem ele vereador, eu vou enviar o recurso para essa tão sonhada e prometida creche. Comigo, é palavra dada, palavra para ser cumprida, compromisso.
Sóstentes Cavalcante, em vídeo gravado com candidato

Procurados pelo UOL, tanto Cavalcante quanto Dantas adotaram uma mesma explicação. Segundo eles, a possível eleição do candidato a vereador faria com que houvesse um representante no Legislativo local para fiscalizar a execução das obras.

"Eu quero alguém local com função pública para fiscalizar que a obra vai ser iniciada e concluída", afirmou o deputado.

"Eu condicionei a emenda à eleição porque é um local distante, e ele [Dantas] é a pessoa que conheço para fiscalizar. Emendas para obras têm muita burocracia e podem acabar não sendo executadas. Tanto que atualmente dou prioridade a saúde e custeio."

Especialistas divergem sobre se existe ilegalidade na promessa. Advogados de direito eleitoral ouvidos pelo UOL afirmaram que o vídeo traz indícios de abuso de poder político, o que pode até tornar os envolvidos inelegíveis.

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Um dos especialistas discorda — ele aponta que o TSE (Tribunal Superior Eleitoral) possui jurisprudência em não condenar esse tipo de prática.

O que dizem os especialistas

Carlos Eduardo Callado, coordenador de pós-graduação em Direito Eleitoral da Escola Paulista de Direito, disse ver no vídeo indícios de três ilegalidades:

Abuso de poder político, "uma vez que o deputado usa seu mandato parlamentar para promover a candidatura do seu apoiado";

Compra de voto, pois "há promessa de vantagem [construção da creche] em troca do voto";

Crime de captação ilícita de sufrágio, "por buscar a troca do voto pela creche".

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Para o advogado, tanto Sóstenes quanto Dantas podem ser punidos até com inelegibilidade.

Já Alberto Rollo, também especialista em Direito Eleitoral, pensa diferente. Apesar de considerar que o vídeo condiciona a emenda à eleição do candidato a vereador, ele afirma que há jurisprudência do TSE no sentido de não condenar práticas semelhantes.

"Há jurisprudência do TSE que decidiu que esse tipo de vantagem oferecida tem caráter genérico. Não é só para uma ou duas pessoas ou um grupo determinado. É uma promessa que beneficia todos indistintamente."

Marlon Reis, advogado, ex-juiz eleitoral e um dos idealizadores da Lei da Ficha Limpa, reforça o entendimento de "três graves ilegalidades eleitorais":

Captação ilícita de sufrágio, que "permite a cassação do registro ou do diploma do candidato beneficiado e a imposição de multa";

Abuso de poder político, que pode levar à inelegibilidade;

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Crime de corrupção eleitoral (ato de dar, oferecer, prometer ou receber, para si ou para outra pessoa, qualquer vantagem em troca de votos).

"Como o candidato e o deputado participam da gravação, ambos podem, em tese, ser declarados inelegíveis por abuso de poder, conforme previsto na legislação eleitoral. Além disso, os dois podem responder pelo crime de corrupção eleitoral devido à gravidade das condutas demonstradas no vídeo", conclui Reis.

Sóstenes e Dantas são velhos parceiros políticos. Em 2022, o deputado chegou a gravar um vídeo agradecendo ao aliado pelo apoio após a boa votação que obteve para a sua reeleição em duas regiões de Teresópolis.

Quem é Sóstenes Cavalcante

Deputado em seu terceiro mandato, Sóstenes Cavalcante é um dos principais representantes do pastor Silas Malafaia no Congresso.

Este ano, o parlamentar ganhou projeção nacional por ser um dos autores do polêmico projeto de lei que equipara o aborto com mais de 22 semanas de gestação ao crime de homicídio.

O projeto chegou a ser pautado para votação em regime de urgência, mas, após repercussão negativa, o presidente da Casa, Arthur Lira (PP-AL), determinou a formação de uma comissão para analisar o tema antes de ser levado a plenário.

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A proposta havia avançado inicialmente porque Lira aceitou votar a urgência, como parte de um acordo com a bancada evangélica. No entanto, a forte pressão popular freou o avanço do projeto.

Cavalcante teve 65.443 votos em 2022, sendo o 32º mais votado no Rio de Janeiro.

Ele já foi líder da bancada evangélica e coordenou a bancada do Estado do RJ durante parte da legislatura passada.

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