Agência SP Regula, que fiscaliza serviços privatizados, só tem 24 fiscais

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Com apenas 24 fiscais para fiscalizar serviços privatizados que movimentam bilhões em São Paulo, a SP Regula tem mais da metade do quadro ocupado por indicações políticas.
78 dos 145 funcionários ocupam cargos de confiança, indicados sem concurso nem necessariamente habilitação técnica, segundo o quadro mais recente.
Esses profissionais atuam em cargos de chefia (diretor, gerente e superintendente) e assessoria, custando mais de R$ 840 mil por mês à autarquia, que fiscaliza serviços de cemitérios, coleta de lixo, iluminação pública e mercados municipais
Entre os 65 funcionários efetivos ou cedidos pelas subprefeituras, há apenas 24 fiscais e 10 técnicos em fiscalização de serviços públicos, tomando conta de uma cidade de 11,4 milhões de habitantes.
A SP Regula foi fundada em 2020 na gestão Bruno Covas para gerir os fundos municipais de limpeza urbana e de iluminação pública.
A agência executou R$ 3 bilhões desses fundos em 2024, aponta relatório interno ao qual o UOL teve acesso.
O órgão tem um orçamento previsto de R$ 105,5 milhões para 2025, conforme dados da Secretaria Municipal da Fazenda.
Até abril, a SP Regula destinou R$ 10,6 milhões para pagamento de pessoal e tecnologia da informação, entre outras despesas administrativas.
Iniciativas de sustentabilidade e projetos de ocupação de espaços públicos, embora listadas como despesas, não receberam nada.
O orçamento de 2024 previa R$ 4.000 para operações nas centrais de triagem de lixo, mas nada foi destinado para a ação.
No fim de 2024, o prefeito Ricardo Nunes (MDB) afirmou a jornalistas que considera extinguir a SPTrans, empresa pública que gerencia o transporte de ônibus. Assim, a responsabilidade de fiscalizar as concessões passaria para a SP Regula.
Diretor-presidente da SP Regula, João Manoel da Costa Neto diz à reportagem que os 24 fiscais concursados fiscalizam diariamente os serviços (leia a íntegra da resposta aqui).
Questionado sobre a suficiência do quadro para fiscalizar São Paulo, Neto afirmou que a agência é recente, opera desde 2021 e deve convocar cerca de 50 fiscais aprovados em concurso em 2023.

24 fiscais, 7 dias por semana
O UOL visitou endereços cujas concessões devem ser fiscalizadas pela SP Regula.
Nos arredores do Mercado Municipal e do Kinjo Yamato, no centro, havia lixo e entulho acumulado —a reportagem voltou na manhã seguinte, mas nada havia sido recolhido.

Dentro do Mercadão, havia boxes abandonados, escada rolante parada e elevador bloqueado por palete de madeira.
No Kinjo Yamato, as obras ainda parecem longe de terminar —os dois mercados estavam em reforma e foram reinaugurados em janeiro, mas com perspectiva de conclusão das obras neste mês.
Neto conta que as obras não serão entregues no prazo e que uma nova prorrogação deve ser aprovada para as concessionárias.
No cemitério da Lapa, na zona oeste, túmulos têm um cartaz que diz: "Não abandone seu jazigo. Faça o recadastramento!".

Segundo Neto, o cartaz é uma política para manter ativo o cadastro das famílias que são responsáveis por jazigos.
A SP Regula aplicou 470 autuações e 330 multas nas concessionárias de cemitérios neste ano, informa a assessoria.
Nas outras áreas, de limpeza urbana e iluminação pública, muitas vezes não se sabe que é a SP Regula a responsável pela fiscalização.
Na rua Teodoro Sampaio, no bairro de Pinheiros, zona oeste, a zeladoria deixa a desejar, relata Gianfranco Canduri, representante de lojistas da área.
Canduri não sabia da agência. Ele conta que procurou a subprefeitura para reclamar no fim de julho. "Tem que ter fiscalização", diz.

Quem fiscaliza quem
A SP Regula foi alvo de ao menos três ações judiciais.
Duas questionaram a prorrogação dos contratos das concessionárias de lixo Loga e Ecourbis sem licitação —os contratos foram firmados em 2004 e renovados neste ano.
Elas foram finalizadas sem prejuízo à SP Regula.
A outra ação, movida pelos vereadores Hélio Rodrigues (PT) e Nabil Bonduki (PT), refere-se a uma área que teria sido cedida irregularmente pela prefeitura à Ecourbis.
Ela ainda tramita.
Em comum, as ações questionam, direta ou indiretamente, o papel da SP Regula.
Agências devem ser blindadas politicamente
As agências reguladoras surgiram no fim da década de 1990, época marcada por privatizações.
A Anatel (Agência Nacional de Telecomunicações) foi a primeira, fundada em 1997. A Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) foi lançada em 1999. A Anac (Agência Nacional de Aviação Civil), em 2005.
Uma agência reguladora é uma autarquia com regime especial que deve ser marcada por autonomia, independência e técnica.
Autonomia é para ter blindagem política para tomar decisões que digam respeito à vida das pessoas: se elas têm acesso ou não ao serviço, se o serviço é de qualidade, se a tarifa é alta demais ou se é permissiva. Decisões muito importantes para os dirigentes ficarem à mercê de investida política. Juliana Palma professora associada da FGV Direito SP
Para João Gabriel Buonavita, presidente do Sindsep (Sindicato dos Trabalhadores na Administração Pública e Autarquias no Município de São Paulo), é preciso contratar mais servidores mediante concurso público.
Faltam servidores com autonomia técnica e jurídica para fiscalizar uma série de contratos que são de interesse público. É um trabalho importante, que não pode ficar nas mãos de indicados políticos ou trabalhadores terceirizados. João Gabriel Buonavita presidente do Sindsep
Desde agosto do ano passado, a SP Regula passa por auditoria programada do TCM (Tribunal de Contas do Município), sobre "sua natureza jurídica, competência regulatória e administrativa, autonomia decisória, financeira e fiscalizatória", entre outros pontos.
Um dos conselheiros do TCM hoje é Ricardo Torres, ex-diretor da SP Regula.
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