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Economia comportamental explica quem (ou o quê) controla as suas decisões

Você é o que você come, mas o que você come é decidido por dezenas fatores exteriores: a economia comportamental explica - Nicolás Celaya/Xinhua
Você é o que você come, mas o que você come é decidido por dezenas fatores exteriores: a economia comportamental explica Imagem: Nicolás Celaya/Xinhua

Luiza Pollo

Da agência Eder Content em colaboração para o TAB

17/05/2019 04h01

O que você comeu hoje na hora do almoço? Foi a um restaurante por quilo perto do trabalho, passou no fast food, ou levou uma marmita de casa? Seja qual for a resposta, por que fez essa opção?

A escolha parece ser simples. Mas é complicadíssima, pelo menos de acordo com a economia comportamental. Para começo de conversa, é biológica (o que o seu estômago diz), financeira (quanto o seu bolso permite gastar), e cronológica (tempo para cozinhar e para comer). Entram na equação seus princípios (se você é vegetariano, vegano) e seus gostos estéticos (a apresentação de um cardápio ou de um prato).

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O exemplo acima é simples, mas a área de estudo, que mistura psicologia, economia, sociologia e neurociência permeia nossas decisões em nível pessoal, social, empresarial e até governamental. Tanto que rendeu um prêmio Nobel de Economia ao israelense Daniel Kahneman em 2002, e será também assunto da palestra de Lígia Gonçalves que vai rolar no Festival Path, principal evento de inovação e criatividade do Brasil que é apresentado pelo TAB em 2019.

"O ser humano é menos racional do que as pessoas acreditam ser", diz Lígia, que é formada em Administração e se interessou pela economia comportamental ao fazer cursos sobre o tema nas universidades de Yale e Harvard, nos Estados Unidos. "[Na palestra], vou falar um pouco de quais são os vieses e os problemas que estão por trás das decisões tomadas pelo nosso sistema intuitivo, que fazem com que nem sempre a gente escolha o que é melhor. E como lidar com isso."

Se você se acha consciente de suas escolhas, pode se surpreender ao saber que a economia comportamental já mapeou ao menos 120 vieses cognitivos e motivacionais que influenciam a nossa tomada de decisões. Há uma lista com vários deles até mesmo na Wikipedia. São estereótipos, costumes, cultura e vários outros pontos te fazer escolher um fast food em vez de um restaurante vegetariano, até alterar a decisão de um executivo na hora de decidir qual funcionário vai promover.

Lígia, que já trabalhou na área de marketing - inclusive como executiva - em empresas como Ambev, BRF e Philip Morris, explica que aplica a economia comportamental no trabalho diariamente. "Sou curiosa do comportamento humano. Se você quer influenciar a decisão do público no marketing, nada melhor do que entender como ela é tomada."

"Isso tem aplicações infinitas", defende a especialista. "Políticas públicas, recursos humanos, marketing, finanças, vida pessoal? Estamos sempre tomando decisões, e, se você entende os vieses aos quais está sujeito, consegue fazer escolhas mais conscientes." Então vamos a eles.

Uma âncora decisiva

Um dos vieses mais comuns, diz Lígia, é o que se chama na economia comportamental de ancoragem. Nossa mente sempre vai buscar referências na hora de tomar decisões novas, e nem sempre essas referências fazem sentido ou são benéficas para a decisão final.

Por exemplo: se você recebesse uma garrafa de vinho sem rótulo e tivesse que colocar um preço nela sem saber nada sobre o produto (sabor, origem, idade?), qual preço daria?

Lígia cita um experimento do MIT que testou como números totalmente aleatórios poderiam influenciar nessa escolha. Um grupo de pessoas foi chamado para simular um leilão, precificando caixas de chocolate de diferentes tamanhos. Antes de começar, no entanto, tiveram que escrever num papel os dois últimos dígitos de seus números de Social Security (o equivalente ao nosso CPF) e dizer se pagariam aquela quantia por uma caixa de chocolates.

Adivinha só? Durante o leilão, quem tinha números mais altos consistentemente ofereceu mais dinheiro pelos itens, e quem tinha números mais baixos ofereceu menos. "Não tem nada a ver com o que está sendo proposto na decisão, mas afeta o que você faz", diz Lígia. Os pesquisadores ainda perceberam que, mesmo depois de explicar a ancoragem a cada participante e permitir que ele ou ela mudasse o valor estimado pela caixa, o efeito ainda persistia.

Uma lição de vida?

Acontecimentos que são muito comentados (mesmo que não sejam necessariamente tão comuns) normalmente deixam as pessoas mais sensibilizadas. É o viés da disponibilidade.

Se até agora falamos em exemplos light, vamos a um mais grave. Lígia explica que grupos terroristas se aproveitam da sensibilidade da população a esse tema para alimentar o medo. "Os governos gastam milhões na prevenção de ataques desse tipo, e a população exige isso porque esses ataques ganham bastante cobertura, relevância e geram muita emoção."

Não que eles não mereçam atenção do poder público ou comoção da sociedade, mas outras ações com maior impacto na redução do número de mortes (prevenção de acidentes de trânsito, por exemplo) acabam ganhando menos destaque.

Outro exemplo são as "histórias de superação". Você com certeza já ouviu falar de alguém que, apesar de todas as adversidades - pobreza, falta de estrutura familiar, entre outros - conseguiu estudar e se dar muito bem na vida. Esses casos são raros, mas costumam ganhar destaque. E aí podemos inconscientemente achar que qualquer um é capaz de chegar lá, basta "esforço".

O primeiro passo para arquitetar decisões melhores, diz Lígia, é saber dos nossos vieses. A partir daí, a economia comportamental trabalha com nudges, os empurrõezinhos para um caminho melhor.

Richard Thaler, da Universidade de Chicago, é um dos maiores nomes dessa teoria e autor do livro "Nudge: Como tomar melhores decisões sobre saúde, dinheiro e felicidade", escrito em parceria com o colega Cass Sunstein. "O nudge é feito por uma pessoa que chamamos de arquiteto de decisões. Esse é um termo chique para qualquer um que influencie as escolhas que você faz", diz Thaler em um vídeo da Universidade de Chicago.

O exemplo que ele dá é o da lanchonete da universidade. Lá, a salada fica antes do hambúrguer, aumentando as chances de acabar no prato de cliente. Ele explica que alguém precisou tomar essa decisão e, nesse caso, escolheu a opção saudável. Nas empresas, nos governos e na vida pessoal de cada um, estar ciente dessas escolhas pode ajudar a torná-las mais positivas, segundo a economia comportamental.

"A ideia é entender como você estrutura o processo de tomada de decisões, apresentar opções e avaliar de forma a evitar que esses vieses te influenciem, ou minimizar o impacto deles nas escolhas", afirma Lígia.

Põe aí na sua agenda: o Festival Path acontecerá nos dias 1 e 2 de junho, em São Paulo. Pela primeira vez em seis anos, o evento vai ocupar diversos espaços da Avenida Paulista com atividades que incluem palestras, shows, filmes, workshops e feiras.