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Quem é Pri Leite, fenômeno do YouTube, dentro e fora do tapete de yoga

Pri Leite quer tornar mais acessível a prática de yoga por meio do YouTube  - Steven Shea/Divulgação
Pri Leite quer tornar mais acessível a prática de yoga por meio do YouTube
Imagem: Steven Shea/Divulgação

Letícia Naísa

Do TAB

21/03/2021 04h00

Quem estudou com a Priscilla Leite na quinta série do ensino fundamental não poderia imaginar que ela viraria professora de yoga. Pri nunca foi boa em nenhum esporte. Gostava de atividades físicas, mas não tinha flexibilidade nem era competitiva. As aulas de educação física eram um sofrimento, já que ela era sempre a última a ser escolhida nos times. Nascida e criada em Maracaju, interior do Mato Grosso do Sul, ela surpreende a todos hoje, aos 34 anos, realizando posturas de yoga complexas com naturalidade — mesmo com o barrigão de seis meses de gravidez.

Desde a primeira aula que deu, sentiu que havia encontrado a sua missão e descobriu o que realmente é: professora de yoga. Isso foi em 2014, quando se mudou por amor para Los Angeles, "a meca da yoga", como ela chama, nos Estados Unidos. Pouca gente botava fé no relacionamento entre Pri e seu atual marido, Darren, com quem tem um filho, Oliver, de 3 anos, e outro menino a caminho. "Muita gente me chamou de louca", conta.

A profissão do amado ela deixa em mistério. "Não quero ser associada a ele, não sou só 'a esposa de alguém'", declara com a voz firme do outro lado da tela. Os poucos detalhes que deixa passar na conversa sobre o relacionamento são onde se conheceram (em Londres, onde morou por um ano), a dificuldade de manter o namoro a distância numa época sem smartphones e redes sociais tão ativas, e como a rotina mudou com os dois trabalhando em casa por causa da pandemia.

Mas foi graças ao amor — tanto do consagrado quanto à prática de yoga — que Pri Leite se tornou um fenômeno na internet. No YouTube, suas 347 videoaulas já têm mais de 37 milhões de visualizações e o canal reúne 969 mil inscritos até o fechamento deste texto. Apesar dos pesares, foi a pandemia que deu visibilidade para a yogini. Antes do coronavírus, as coisas já iam bem. No canal, eram 310 mil inscritos em março de 2020, quando ela lançou uma plataforma, inicialmente chamada Girassol e que hoje é Yoga Co, para oferecer conteúdos exclusivos, como aulas mais longas, meditações e um podcast sobre bem-estar. O plano mensal custa R$ 39,90.

Pri Leite faz postura de yoga no Grand Canyon, nos EUA - Arquivo pessoal - Arquivo pessoal
Pri Leite faz postura de yoga no Grand Canyon, nos EUA
Imagem: Arquivo pessoal

Cientista social de formação, Pri está enfrentando um grande desafio com a popularização de seu canal. Ativa nas redes sociais, ela não se considera blogueira nem influencer. "Eu sou professora. Busco encontrar as pessoas onde elas estão e ensinar a prática de uma maneira que elas possam entender", afirma. No braço direito, carrega um lembrete: uma tatuagem com a frase "Bound to Others" (ligado aos outros, em português), tirada de uma frase do filme "A Viagem", das irmãs Wachowski. Fez a tatuagem quando se tornou professora em tempo integral, para não esquecer que tudo o que faz para os outros também é por si mesma. Na mão esquerda, tem estrelas em homenagem à saudação ao Sol (que também é uma estrela), uma das posturas da yoga.

Agora, além de professora e mãe, Pri também é empreendedora. A logística para manter o Yoga Co no ar tem sido uma das maiores dificuldades da nova fase da carreira. "Me tirou da zona de conforto", avalia.

Se o trabalho fosse apenas gravar as práticas, seria fácil para quem tem uma experiência de oito anos com aulas online. Um vídeo de mais ou menos 20 minutos toma de duas a três horas para ser gravado. Em 2021, ela teve apoio de uma equipe: alugou um estúdio onde posicionou duas câmeras — coisa que ela dizia ser seu sonho nos primeiros vídeos — e contratou uma pessoa para editar. Por isso, o cenário dos "21 Dias de Leveza" é diferente, assim como a qualidade. As outras séries do canal foram feitas em sua casa, sem pretensão, diz, por hobby. "YouTube não dá dinheiro", brinca a professora. "Não quero ficar fazendo propaganda de produto, quero que as pessoas sintam que estão fazendo uma aula de yoga e precisam apenas do corpo e de tempo."

De fato, quando comecei a acompanhar o canal da Pri, um tapete gasto de EVA no meio da sala e uma roupa confortável foi tudo o que precisei para incluir a prática na rotina, além da força de vontade. "As pessoas falam que a pandemia foi ótima pro canal, mas me pegou totalmente de surpresa esse boom", confessa. Ela garante que também está vivendo a pandemia com todas as dificuldades envolvidas. "A gente perdeu muito dinheiro. Somos privilegiados, porque tínhamos uma reserva, mas é um estresse ver o dinheiro indo embora tão rápido."

Pri Leite e o marido, Darren, em Londres quando ainda namoravam - Arquivo pessoal - Arquivo pessoal
Pri Leite e o marido, Darren, em Londres quando ainda namoravam
Imagem: Arquivo pessoal

Ouvindo Pri rindo e falando de forma tão suave, é difícil supor que ela passe por muitos momentos de estresse. "As pessoas confundem. Acham que, por eu estar trabalhando com yoga, estou sempre calma. Não é verdade". A professora descreve os dias em que o filho não quer tomar banho ou não quer comer e os problemas da plataforma — que a deixam muito brava —, somados ao desconforto da gravidez, como os mais difíceis. Confessa, também, que teve crises de choro durante as gravações da famosa série de práticas "21 Dias de Transformação". Foi aí que decidiu contratar uma pessoa para editar as aulas.

Para amenizar o estresse da pandemia, o casal decidiu colocar Oliver numa escola. Quatro vezes por semana, durante seis horas, ela diz que encontra espaço para se reconhecer fora do papel de mãe. "É o meu tempo como adulta". Nesses momentos, ela também faz sua prática pessoal de yoga — que dura cerca de 30 minutos por dia.

Outra mudança durante a pandemia foi a de endereço. O espectador atento do canal reparou na mudança de cenário dos últimos vídeos. A janela ao fundo sumiu. Era da casa antiga. Hoje, ela grava em seu quarto e tem mais privacidade. Ninguém aparece descendo ou subindo a escada que dava para ver da janela e ela não é interrompida pela Sky, sua cachorra SRD de 8 anos, que dormia tranquilamente na cama enquanto ela conversava com o TAB.

A professora conta que a gestação também lhe trouxe paz, que o bebê a caminho foi planejado e que a experiência desta gravidez tem sido completamente diferente da primeira. Caçula de uma família com quatro filhos, ela queria que Oliver tivesse um irmão. "Mas esse é o último", promete, rindo e dizendo que o filho está fascinado pela barriga dela. Por causa da pandemia, Pri planeja um parto domiciliar. "No começo da gestação, eu estava apreensiva, mas é um processo tão devagar que tem me trazido tranquilidade e confiança, mostra que tudo tem seu tempo, a natureza é sábia", reflete.

Do Brasil, ela sente falta das filas preferenciais para gestantes. E, claro, da família e do clima tropical. Com o filho, fala a maior parte do tempo em português e cozinha pratos brasileiros. Em um ano de pandemia, visitou a família apenas uma vez, em janeiro. Diz que a preocupação com os pais é constante e que perdeu um primo para a covid-19 no final do ano passado. "Ninguém estava preparado pra isso que a gente vivendo, todo o mundo foi afetado, mas a pandemia é um lembrete da nossa humanidade", completa.

Aos 20 e poucos anos, tudo o que Pri Leite queria com a yoga era esquecer de sua condição humana. Ela relata que buscava nas posturas e na meditação atingir o nirvana. Fugir de si. Foi durante uma viagem para a Índia em 2012 que sua percepção mudou. Descobriu que a yoga não servia para escapar, mas sim para se encontrar. Por isso, termina suas aulas no YouTube sempre mandando um beijo e dizendo "do meu coração para o seu", tentando humanizar os dois lados da tela e lembrar que todos têm um coração. "É muito importante o momento de autocuidado, yoga não é uma moda", afirma. "Se for, está na moda há 5 mil anos, mas só agora as pessoas estão descobrindo."