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'Era nossa espinha dorsal': Edimburgo se prepara para o velório da rainha

Ensaio para velório e vigília do corpo da rainha Elizabeth 2ª, em frente à Catedral de St. Giles, em Edimburgo - Patrícia Dantas/UOL
Ensaio para velório e vigília do corpo da rainha Elizabeth 2ª, em frente à Catedral de St. Giles, em Edimburgo Imagem: Patrícia Dantas/UOL

Patrícia Dantas

Colaboração para o TAB, de Edimburgo

11/09/2022 10h23

Edimburgo tornou-se o centro das atenções do mundo a partir deste domingo (11). O caixão da rainha Elizabeth 2ª já deixou o Castelo de Balmoral — propriedade onde ela faleceu — rumo ao Palácio de Holyroodhouse.

As preparações para a cerimônia começaram na tarde de sexta-feira (9), com barreiras sendo colocadas ao longo da cidade.

Tudo foi pensado nos mínimos detalhes, desde selar os buracos nas ruas de pedra em frente à Catedral de St. Giles, onde o corpo será levado na segunda-feira (12) para o velório e vigília, até ensaios com bandas de marcha e batalhões de infantaria, como parte da Operação Unicórnio.

O clima na capital escocesa é um misto de curiosidade e emoção, além do famoso "vida que segue". Bares e restaurantes estão cheios, grupos fazem tours com guias turísticos ou por conta própria. Ouvem-se diversas línguas nas ruas. No entanto, o que pode ser observado em geral é o respeito e a admiração pela rainha Elizabeth.

"Quero estar aqui para fazer parte da conexão ao vivo, no local. Não só reverenciar alguém tão especial, mas sentir que se é parte de algo maior. Um momento histórico, que nunca pensei que iria experimentar em Edimburgo", disse a australiana Angie Disney, 61, que mora na Escócia há 11 anos.

O clima 'vida que segue' pelas ruas de Edimburgo, enquanto a cidade se prepara para receber o velório de Eizabeth 2ª - Patrícia Dantas/UOL - Patrícia Dantas/UOL
O clima 'vida que segue' pelas ruas de Edimburgo, enquanto a cidade se prepara para receber o velório de Eizabeth 2ª
Imagem: Patrícia Dantas/UOL

Flores e tributos

Nos portões do lado de fora do Palácio de Holyroodhouse, residência oficial da realeza na cidade, muitas pessoas têm deixado flores em homenagem à monarca. É o caso de Mary Moultrie, 54, nascida em Edimburgo.

"Não sou monarquista, mas ela era ótima. Alguém a descreveu como o 'concreto social' por trás do nosso país. Durante todos os tempos de problemas, ela estava lá. Ela era como uma espinha dorsal. Nunca foi exagerada. Era respeitável e tinha sabedoria e bondade."

Logo mais à frente, outra mulher se emociona ao observar as homenagens. "Sua morte é muito triste. Sinto que, seja você fã da monarquia ou não, ela é um consenso. Não tenho palavras. É como se fosse o fim de uma era. Mudar de outro país pra cá, quando você aprende sobre o Reino Unido? A rainha era o Reino Unido. Não consigo imaginá-lo sem ela", disse a alemã Jule Lenzen, 28, que mora em Edimburgo há 5 anos.

A escocesa Mary Moultrie deixa flores no Palácio de Holyrood, em Edimburgo - Patrícia Dantas/UOL - Patrícia Dantas/UOL
A escocesa Mary Moultrie deixa flores nos portões do Palácio de Holyrood
Imagem: Patrícia Dantas/UOL
A alemã Jule Lenzen mora em Edimburgo há 5 anos e prestou homenagem em frente ao Palácio de Holyroodhouse - Patrícia Dantas/UOL - Patrícia Dantas/UOL
A alemã Jule Lenzen vive em Edimburgo há 5 anos e deixou flores no Palácio de Holyrood
Imagem: Patrícia Dantas/UOL

Por ali também estão fotógrafos, equipes de TV, funcionários do palácio, além de famílias, crianças, idosos, jovens, alguns deles com histórias particulares para contar sobre a rainha.

Ao lado dos pais Karen e Robert, Iona O'Brien, 10, fala com orgulho da carta que enviou à monarca há dois anos sobre o meio ambiente, pela qual recebeu uma resposta e ficou muito emocionada. Para prestar sua homenagem, trouxe flores e um cartão que dizia: "Obrigada, Sua Majestade".

Sharon MC Farlane, 51, deposita dois buquês de flores com duas cartas. Uma dela e outra de sua mãe, que é portadora de deficiência e não pode vir pessoalmente.

"Minha avó cresceu em Balmoral, onde a rainha passou muitas férias, a segunda casa dela. Quando a Primeira Guerra Mundial começou, todos os médicos foram enviados para o conflito. E foi um médico da realeza que fez o parto da minha avó. E anos depois, a rainha mandou um telegrama para minha avó, quando ela completou 100 anos. Sempre gostei da família real, e da rainha, em particular", contou Farlane, orgulhosa.

Comoção do lado de fora do Palácio de Holyrood, em Edimburgo, na noite de sábado (10) - Patrícia Dantas/UOL - Patrícia Dantas/UOL
Comoção do lado de fora do Palácio de Holyrood na noite de sábado (10)
Imagem: Patrícia Dantas/UOL

Brinde à rainha

Além de trazer flores, o piloto inglês Paul Singleton, 53, trouxe um frasco de uísque para propor um brinde à rainha. "Sláinte", diz ele, ao tomar um gole, explicando que significa "saúde" em gaélico escocês.

"Estive no Exército, então fiz um juramento de lealdade à rainha quando tinha 22 anos. Por isso vim pagar meus respeitos. Muitos militares têm um vínculo próximo com a rainha", acrescentou Paul, que serviu por 13 anos na Royal Air Force e mora há 15 anos em Edimburgo.

Atrações turísticas fechadas

Caminhando pela Royal Mile, uma das principais ruas da cidade, uma família brasileira de Florianópolis diz que seus planos de turismo foram interrompidos com a morte da rainha. Por causa dos preparativos dos cerimoniais, muitas atrações foram fechadas e eles não puderam visitar os locais que planejavam, como o Castelo de Edimburgo.

"[Na quinta-feira] ficamos sabendo da notícia por amigos do Brasil pelo WhatsApp, de que ela estava sendo cuidada por médicos. Estávamos no 'modo turista'. Quando a morte foi anunciada, um cara gritou na rua: 'A rainha morreu, aleluia!'. Estamos na Escócia, né?'", disse a historiadora Felícia Campos, 29, que chegou à capital no início desta semana para fazer um doutorado em estudos do Oriente Médio.

"Aqui é diferente de Londres, pois estamos em um território que quer ser independente há muito tempo. Talvez isso enfraqueça um pouco a monarquia, temos de ver os desdobramentos."

A historiadora Felícia Campos e sua família: a irmã Vitória, o cunhado venezuelano Benjamin Becerra, e os pais Juarez Beltrão e Rosângela Campos - Patrícia Dantas/UOL - Patrícia Dantas/UOL
A historiadora Felícia Campos e sua família: a irmã Vitória, o cunhado venezuelano Benjamin Becerra, e os pais Juarez Beltrão e Rosângela Campos
Imagem: Patrícia Dantas/UOL

Escócia independente

Em uma caminhada pelo parque Princes Street Gardens, que separa a cidade antiga da cidade nova, Haydyn Adams, 76, vestia uma camiseta com os dizeres: "Independent Scotland".

"Sinto muito pela morte da rainha, desejo o melhor para a família e todos. Dadas as circunstâncias que existem agora, acho que é o momento para a Escócia escolher a independência. Acho, tristemente, que os governos de Westminster têm sido terríveis para a Escócia, o País de Gales e a Irlanda do Norte. Estou usando a camiseta para apoiar a causa e defender o sentimento de que queremos ser independentes."

Um segundo referendo sobre a independência da Escócia do Reino Unido foi proposto pela primeira-ministra escocesa Nicola Sturgeon para 19 de outubro de 2023, embora o processo precise passar por várias etapas antes de ser marcado.

Durante a transição da monarquia para as mãos de Charles 3º, muita coisa pode acontecer. Por ora, o Reino Unido executa o protocolo para a despedida da monarca mais longeva da história britânica. Edimburgo está pronta para dizer seu adeus.