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Inspirada em Pabllo Vittar, drag gaúcha participa de reality show na Suécia

Fontana, no "Drag Race Suécia" - Bruna Dellalibera Blumfeldt/UOL
Fontana, no 'Drag Race Suécia'
Imagem: Bruna Dellalibera Blumfeldt/UOL

Bruna Dellalibera Blumfeldt

Colaboração para o TAB, de Estocolmo

16/04/2023 04h01

Foi dentro do vagão do metrô, na cidade de Estocolmo, a caminho do trabalho como maquiador em uma loja de shopping, que Gabriel Fontana Teixeira, 29, recebeu a ligação de uma produtora dizendo que havia sido aprovado para participar do programa de "Drag Race Suécia", uma versão de "RuPaul's Drag Race", a maior competição de drag queens da TV.

Vencedor do "Ídolos Revanche" de 2015 e acostumado ao show business sueco, o brasileiro ficou tão impactado com o telefonema que precisou descer na parada seguinte: sabia que era a oportunidade de apresentar a drag Fontana para o mundo.

Gabriel conta que foi desencorajado por preconceito, na adolescência, no Brasil. Mais tarde, no mercado musical sueco que o queria como um garoto de "boy band". Só aos poucos foi construindo Fontana, com a conquista de uma bolsa de estudos de dança, subindo no salto alto e ajustando os cílios postiços e as laces coloridas para shows.

Fontana agora concorre ao título sueco de realeza drag e a um prêmio de 100 mil coroas suecas (equivalente a cerca de R$ 48 mil).

Fontana, Drag Race Suécia - Karl Nordlund/SVT/Divulgação - Karl Nordlund/SVT/Divulgação
Fontana participa da competição Drag Race Suécia
Imagem: Karl Nordlund/SVT/Divulgação

Na madrugada de um sábado, a drag queen chegou à casa de shows Biblioteket Live para se apresentar pela primeira vez após a estreia internacional do programa. Já maquiada com bocão contornado e sombras rosa e alaranjada, vestiu o figurino com a ajuda do cabeleireiro Hugo Freitas — um conjunto dourado com pedrarias e franjas brilhantes, com uma capa rosa choque com a letra F nas costas.

No camarim improvisado, Fontana se alongou, virando estrelas e abrindo espacates, num clima descontraído. Uma atmosfera bem diferente da que vivenciou aos dez anos, quando foi levado por um amigo da família para "sessões de exorcismo", algo que Gabriel não entendia então: "Nas minhas lembranças me recordo de gritos, pessoas se contorcendo no chão. Um show de horrores!", lembra, citando o medo que sentia por quererem mudar seu jeito de gesticular e até seus gostos musicais.

Fontana, Drag Race Suécia - Bruna Dellalibera Blumfeldt/UOL - Bruna Dellalibera Blumfeldt/UOL
Imagem: Bruna Dellalibera Blumfeldt/UOL
Fontana, Drag Race Suécia - Bruna Dellalibera Blumfeldt/UOL - Bruna Dellalibera Blumfeldt/UOL
Imagem: Bruna Dellalibera Blumfeldt/UOL

'My Way'

Gabriel cresceu com uma mãe solo, auxiliar de enfermagem, e os avós maternos em São Leopoldo (RS), a cerca de 35 km de Porto Alegre. Diz que sofreu bullying a ponto de precisar esperar sair antes da aula terminar para voltar para casa, para não apanhar na saída do colégio. Lembra até hoje da dolorida vez em que foi perseguido na rua e um tijolo acertou sua mochila, na sétima série.

Foi na adolescência, na boate leopoldense "My Way", o primeiro contato de Gabriel com um show drag. "Naquela época, ser drag queen era algo associado a prostituição e drogas", diz. Hoje, conta que compreende as atitudes das artistas de lá, com uma performance tão empoderada que ninguém mexia com elas nas ruas.

Aos 18 anos, Gabriel conheceu um sueco na internet. Trocavam mensagens que, com o tempo, evoluíram para conversas românticas. O sueco foi visitá-lo no Brasil, apresentado à família gaúcha como um amigo. Na despedida, publicaram uma foto dos dois se beijando — e a mãe disse que não o queria mais sob seu teto. Ele foi acolhido por duas amigas.

Eles continuaram um relacionamento à distância por mais de um ano, até que aconteceu um assalto na linha de ônibus que Gabriel sempre pegava para ir à faculdade de administração. O namorado à época pediu para ele se mudar para Skellefteå, no norte da Suécia, onde ele e a família o receberiam.

Mudou, então, ainda sem saber sueco e sem emprego, sustentando-se com apresentações da banda Mas Que Nada, cantando versões do grupo sueco Abba em bossa nova.

Fontana, Drag Race Suécia - Bruna Dellalibera Blumfeldt/UOL - Bruna Dellalibera Blumfeldt/UOL
Imagem: Bruna Dellalibera Blumfeldt/UOL

Revanche

Gabriel começou a carreira de celebridade sueca quando gravou um vídeo cantando "Amar Não é Pecado", de Luan Santana, para a inscrição no "Ídolos Suécia". Foi graças a uma repescagem que participou de um quadro do programa, o "Revanche" — venceu, assinou contrato com uma gravadora e, na final, subiu ao prestigiado palco do Avicci Arena com a música "Eu Sou Do Brasil".

Num momento decisivo para seu percurso artístico, terminou o relacionamento e se mudou para Estocolmo. Mesmo sob os holofotes suecos, trabalhava com limpeza e restaurante. Voltou à TV no programa "Got Talent", até a semifinal. "Ainda não era 'a Fontana', mas já existiam fragmentos dela", recorda Gabriel. Decidiu romper o contrato com a gravadora por querer, nas suas palavras, trilhar um caminho inspirado na brasileira Pabllo Vittar.

No palco, Fontana tem presença. Começa o show jogando beijos para os espectadores, dá chutes no ar e faz o "bate-cabelo", um movimento em que as drags rodam a cabeça e suas madeixas giram como hélices. É uma drag que segue o estilo "majestade" da beleza e compartilha tutoriais de maquiagem no YouTube.

No ar no reality show "Drag Race Suécia", Fontana diz que quis dar vazão a traumas. "Conto minha história para que meus sofrimentos não se repitam", diz. "Não entrei no programa para ficar famoso, já tinha seguidores nas redes sociais e tinha feito TV. Quero mostrar minha arte."