Topo

Novo advogado de Thiago Brennand já defendeu Nardoni, Salles, Dirceu e MST

Roberto Podval, o advogado que assumiu a defesa de Thiago Brennand, atualmente réu em nove processos no TJSP - Lucas Seixas/UOL
Roberto Podval, o advogado que assumiu a defesa de Thiago Brennand, atualmente réu em nove processos no TJSP
Imagem: Lucas Seixas/UOL

Do TAB, em São Paulo

18/07/2023 04h01

Não fosse um imprevisto, o empresário pernambucano Thiago Brennand, 43, e o advogado paulista Roberto Podval, 57, se cruzariam pela primeira vez no fim de 2020, na Copa São Paulo, uma das mais tradicionais competições de hipismo no Brasil. Os dois disputavam a categoria Master Top, voltada a cavaleiros e amazonas amadores acima de 40 anos, em saltos de 1,30m.

A competição começou pouco depois das 12h daquela sexta-feira 20 de novembro, Dia da Consciência Negra. Na ordem pré-estabelecida pelo evento, Brennand seria o primeiro a entrar na pista de areia com seu cavalo sela francês Viktor De Gree. Recém-chegado a São Paulo, o empresário não compareceu — perdeu por "forfait", como consta no relatório de resultado final da Federação Paulista de Hipismo. Já Podval ficou em quarto lugar no ranking.

Quase três anos depois, os dois se cruzaram em outra circunstância. Há um mês, o advogado assumiu a defesa de Brennand, atualmente réu em nove processos no TJSP (Tribunal de Justiça de São Paulo), acusado de estupro e sequestro, entre outros.

Da Granja Viana, na região metropolitana de São Paulo, Roberto Podval é um apaixonado por cavalos desde a adolescência. Deixou o esporte assim que se formou em direito, em 1988, mas decidiu voltar às pistas há sete anos, conta o cavaleiro Alberto Muylaert, 64, seu atual treinador. "Ele foi muito além da expectativa inicial. Queria saltar 1,10m, 1,20m, que é o que amador faz, mas já chegou a 1,40m, 1,45m", explica. "É um sujeito muito dedicado. Treina todos os dias, às 6h45."

O hipismo hoje é um hobby de Podval, um dos mais conhecidos criminalistas do Brasil. Um "outsider", como ele diz, sem sobrenome famoso de escritório tradicional. Filho de um corretor de imóveis, ele foi o primeiro advogado da família, graduado na FMU (Faculdades Metropolitanas Unidas), diferente de colegas renomados vindos da USP e da PUC.

Assim que obteve a licença para advogar, passou a despachar em uma salinha na rua Tabatinguera, no centro de São Paulo. Naquela época, ainda com uma carteira de clientes mirrada, recorria a amigos para ajudá-lo a conseguir novos casos. Às vezes fazia sentinela à noite na porta de cadeias à espera de trabalho: se chegasse um preso sem advogado, oferecia-lhe serviço.

Foram os colegas que o levaram ao Departamento Jurídico 11 de Agosto, da Faculdade de Direito da USP, escritório-escola que oferece assistência jurídica gratuita, onde passou a acompanhar audiências no Fórum da Barra Funda diariamente. Simpático e "desenrolado", aproximou-se de outros advogados, promotores e juízes, contam colegas e amigos ouvidos pelo TAB.

Uma delas, a promotora Tatiana Bicudo, levou Podval ao IBCCrim (Instituto Brasileiro de Ciências Criminais), que ele viria a presidir entre 2001 e 2002. Lá, ele estreitou relações com o ex-desembargador Alberto Silva Franco, de quem se tornou pupilo, e enveredou na academia — em 2002, defendeu o mestrado na Universidade de Coimbra, em Portugal.

"Era um mundo muito fora da minha realidade", lembra o advogado, no seu escritório atual, num edifício de luxo no cruzamento entre a rua Augusta e a alameda Santos, nos Jardins, bairro nobre de São Paulo. "Eu era um patinho feio."

Roberto Podval, que assumiu a defesa de Thiago Brennand - Lucas Seixas/UOL - Lucas Seixas/UOL
'Eu era um patinho feio', diz Podval, que se considerava um 'outsider' no meio jurídico
Imagem: Lucas Seixas/UOL

Pontes

Podval, conta um dos colegas, começou do zero. "É um cara que não foi recebido de braços abertos na profissão, mas que fez seu nome, fez dinheiro, adquiriu algum respeito e transita muito bem no Judiciário."

De baixa estatura, rosto arredondado, nariz proeminente e olhos claros, o advogado quase sempre mantém um meio-sorriso, que lhe confere ar de bom humor. Profissionais da área o consideram "diplomático", "um dos melhores de relacionamento", tanto que consegue transitar habilidosamente entre diferentes grupos políticos, da esquerda à direita.

Assim, colecionou casos midiáticos ao longo da carreira. Defendeu o empresário Sérgio Gomes da Silva, suspeito de mandar matar o ex-prefeito de Santo André (SP) Celso Daniel, em 2002; o médico Farah Jorge Farah, condenado por matar e esquartejar a ex-amante Maria do Carmo Alves, em 2003; o casal Alexandre Nardoni e Anna Carolina Jatobá, condenados pela morte da menina Isabella, em 2008; e o ex-ministro José Dirceu, durante as investigações da Lava Jato.

Além dos casos famosos, advoga gratuitamente para clientes em situação de vulnerabilidade social. Desde a década de 1990, também atua na defesa do MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra) e, atualmente, tem como cliente o deputado federal Ricardo Salles (PL), ex-ministro de Jair Bolsonaro (PL). Fazer "pontes", diz Podval, é seu trunfo.

"Mas [Podval] pessoalmente tem um compromisso, como nós, com um projeto de país", pondera o advogado Marco Aurélio de Carvalho, coordenador do Prerrogativas, grupo de juristas, juízes e advogados (a maioria de esquerda), referindo-se a um compromisso de defesa da democracia.

Ao mesmo tempo, foi no apartamento de Podval que, na noite de 20 de maio, o Prerrô (como o grupo é carinhosamente chamado) realizou um jantar para André Mendonça, o ministro "terrivelmente evangélico" indicado por Bolsonaro para ocupar o lugar de Marco Aurélio Mello no STF (Supremo Tribunal Federal).

Segundo Carvalho, o "perfil agregador" de Podval tem também influência da advogada Ritienne Soglio Podval, com quem é casado desde 2011. O casamento ocorreu na ilha de Capri, na Itália — na época, eles ofereceram hospedagem num hotel cinco estrelas aos cerca de 200 convidados, entre eles, o ministro do STF Dias Toffoli.

Roberto Podval, que assumiu a defesa de Thiago Brennand - Lucas Seixas/UOL - Lucas Seixas/UOL
'Diplomático', o advogado transita entre diferentes grupos políticos, da esquerda à direita
Imagem: Lucas Seixas/UOL

'Isso te humaniza'

No dia a dia do escritório, Podval é conhecido por seu jeito "enérgico". "Também sou assim, apesar de não tão dura, então esse perfil dele nunca me incomodou", conta a ex-deputada federal Janaína Paschoal (PRTB), que começou a carreira de advogada na equipe dele. "Sempre tive chefes bravos", ri.

Paschoal trabalhou com Podval entre 1995 e 2000, quando ainda era estudante de direito na USP. Primeiro, num conjunto na rua Barão de Itapetininga, no centro. Depois, num escritório na rua Bela Cintra. "Por gostar de direito penal, fui junto. Ele ficava com a parte mais comercial, e eu, com a parte mais técnica. A partir dali, o escritório dele começou a crescer."

Ela o considera "um advogado dedicado e independente de ideologias", embora "tenha uma tendência mais esquerdista": "Era engraçado, o chefe esquerdista e a funcionária da zona leste, direitista desde sempre".

Podval diz que o direito penal o ensinou a entender os outros. "Isso te humaniza. Você está lidando com o pior lado das pessoas. Por outro lado, você percebe que as pessoas também podem ser generosas, também têm histórias maravilhosas."

No início de junho, o advogado assumiu a defesa de Thiago Brennand, caso que considera de interesse público também por uma questão de classe social. "Não sei se teria tanta atenção se fossem pessoas de classes mais baixas, o que é ruim", diz. "Agora, a gente está caminhando para proteção maior para pessoas mais frágeis, as mulheres, e é bom que seja assim. Obviamente, dá mais ibope, dá mais interesse."

Podval pegou, por enquanto, os primeiros processos contra Brennand, duas denúncias de estupros que teriam ocorrido em Porto Feliz (SP). O advogado afirma que o empresário é inocente. Num caso, argumenta o defensor, Brennand foi convidado a voltar à casa da denunciante quase um mês depois. "Isso está comprovado nos autos", relata. "[Ele] pode ter tratado [ela] mal, pode ter agredido fisicamente, pode até ter xingado. Mas não tenho como comprovar que não houve um estupro naquele dia, assim como também não há nenhuma prova de que houve."

O outro é o caso de uma americana que relatou ter sido mantida em cárcere privado por Brennand ao longo de três dias. Segundo ela, o empresário a agrediu e a estuprou.

Podval considera o relato "assustador". "Horrível realmente", comenta. Porém, dias depois do ocorrido, pondera o advogado, Thiago e a mulher se reencontraram no Recife: "Ela foi buscar ele no aeroporto junto com o filho dele", diz. "E depois vai jantar com os pais dele, depois com os pais dela e vão para um hotel e dormem juntos."

O advogado conta que se surpreendeu ao conhecer o empresário. "O que foi passado para mim, e tem muitas histórias, é de uma pessoa muito bruta, muito insensível, machista. Mas o que eu posso dizer é o que eu vi. Comigo, ele foi de uma gentileza, de uma cultura impressionante. Talvez amanhã eu veja outra coisa."

Roberto Podval, que assumiu a defesa de Thiago Brennand - Lucas Seixas/UOL - Lucas Seixas/UOL
Imagem: Lucas Seixas/UOL