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Uso de drogas perto do Ver-o-Peso, em Belém, desafia cidade-sede da COP 30

Desde o anúncio de Belém como sede da 30ª Conferência da ONU sobre Mudanças Climáticas (COP 30), a cidade corre contra o tempo para se preparar para um evento dessa magnitude. Um primeiro teste foi a realização da Cúpula da Amazônia na cidade, neste início de agosto. Entretanto, no centro histórico da capital paraense, há algo difícil de solucionar: a concentração de usuários de drogas pelas ruas.

Eles circulam, dia e noite, pelos bairros de Reduto, Cidade Velha e Campina, e chamam atenção de quem visita o mercado Ver-o-Peso, especificamente na altura da rua Ladeira do Castelo, na Feira do Açaí. Alguns moradores da cidade já chamam aquela região de "cracolândia": cerca de 20 a 30 pessoas se concentram nas calçadas, embaixo de lonas, usando drogas.

A reportagem do TAB esteve lá para conversar com trabalhadores e frequentadores. O perfil predominante ali é do sexo masculino, negro, solteiro e com ensino fundamental incompleto.

Dois lojistas aceitaram conversar com a reportagem, desde que não fossem identificados. O primeiro afirmou que já viu assaltos na frente da loja. "Quando dá 17h, eles começam a andar aqui pela frente, abordam as pessoas, e isso acaba afastando clientes. Faz tempo que eles estão aí [rua Ladeira do Castelo], mas ninguém faz nada. Eles também ficam em grupo atrás da prefeitura [prédio isolado em reforma]."

Outro trabalhador de uma loja de tintas automotivas contou que o ponto comercial já teve um dos seus cadeados furtados na madrugada. Ele afirmou que os usuários caminham pelas ruas alucinados sob o efeito das drogas e praticam assaltos, geralmente com faca ou "no grito".

"Hoje mesmo um cliente falou para a gente que foi abordado, mas conseguiu correr. Quem vem visitar o Ver-o-Peso e a Feira do Açaí, principalmente à noite, não pode vir sozinho."

Um funcionário do mercado Ver-o-Peso afirma que também há concentração de usuários em áreas internas do complexo. "Eles só não fumam ali descaradamente porque os próprios traficantes às vezes proíbem."

Usuários de crack na região do mercado Ver-o-Peso, em Belém
Usuários de crack na região do mercado Ver-o-Peso, em Belém Imagem: Marx Vasconcelos/UOL

Origem da droga

Segundo o geógrafo Alan Pereira Dias, do Núcleo de Altos Estudos Amazônicos da UFPA (Universidade Federal do Pará), em geral os usuários da Feira do Açaí compram drogas, especialmente crack, em pequenas porções em bairros adjacentes.

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"Durante a pesquisa, ouvi depoimentos dizendo que a droga vem da Vila da Barca, que é relativamente próxima do centro histórico. Ou é trazida por 'aviõezinhos'", explicou.

A violência é um dos fatores responsáveis pela migração dos usuários para a região central da capital. "Em áreas controladas pelo narcotráfico [Comando Vermelho] como a Vila da Barca, há mais tranquilidade, pelo menos entre os usuários. Mas também identifiquei relatos de pessoas que foram ameaçadas pelo tráfico, fazendo com que elas migrem, seja dos seus bairros periféricos ou mesmo de outros lugares."

A dissertação de Alan Dias sobre o centro de Belém foi escrita a partir de suas pesquisas na região, entre 2019 e 2020. Como em outras "cracolândias", o problema do vício vem ancorado em outro. "As pessoas vão às ruas não por causa da droga, mas por problemas familiares", afirmou.

Concentração de usuários de crack na Ladeira do Castelo, próximo ao Ver-o-Peso, em Belém
Concentração de usuários de crack na Ladeira do Castelo, próximo ao Ver-o-Peso, em Belém Imagem: Marx Vasconcellos/UOL

"Hoje em dia, a Feira do Açaí é apontada como essa nova 'cracolândia', mas entre 2010 e 2012, [o ponto que concentrava usuários] era a [no cruzamento das ruas] Riachuelo com a 14 de Março, ou em frente à praça Dom Pedro, seguindo pela avenida 16 de Novembro. Também tem uma cena expressiva no entorno da avenida Pedro Álvares Cabral, próximo à Vila da Barca", ressaltou. Houve também casos de assassinatos nos últimos anos, envolvendo traficantes e usuários.

Em resposta à reportagem, a Secretaria de Segurança Pública e Defesa Social do Pará informou, via nota, que "realiza o combate ao tráfico de drogas por meio da Polícia Militar com rondas ostensivas na área, uso de câmeras do Ciop, além de desarticular grupos criminosos por meio de investigações da Polícia Civil, também retirando de circulação entorpecentes comercializados".

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Também em nota, a Guarda Municipal de Belém afirma que "cerca de 21 pontos turísticos recebem as rondas e base da GMB, por meio de seis motos e quatro viaturas, em escala de revezamento". Na área mencionada na matéria, a GMB disse que "realiza abordagens e busca pessoal e, quando necessário, a apreensão de produtos ilícitos e dispersão de pessoas que utilizam irregularmente o local". Além disso, "o espaço conta com câmeras de alta resolução, sendo monitoradas 24h pelo Sistema Integrado de Monitoramento da corporação".

Movimentação no mercado Ver-o-Peso, em Belém
Movimentação no mercado Ver-o-Peso, em Belém Imagem: Marx Vasconcellos/UOL

A Prefeitura de Belém destaca que a questão não desafia nem impede a realização de eventos como a COP-30 na cidade, e que toda a área do complexo do Ver-o-Peso será reformada e revitalizada, incluindo a Feira, os Mercados de Peixe e de Carne, a Feira do Açaí, além das ruas Santo Antônio e João Alfredo. "Hoje já existe ronda feita pela Guarda Municipal na região e em todo o centro histórico, inclusive com vídeomonitoramento", ressalta Luiz Araújo, coordenador do Comitê da COP-30 da Prefeitura de Belém.

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