Como é uma consulta de constelação veterinária para 'pais de pets'
Durante a pandemia, virei estatística: entrei para o clube dos "pais de pets" da quarentena. Lena é uma cachorra vira-lata simpática, com quem divido o teto desde meados de 2020.
Como todo indivíduo da sua espécie, Lena adora passear. Ela não pode me ver pegando a coleira que já fica agitada. Na rua, puxa muito a guia e late para todos os cachorros que encontra no caminho. Esse comportamento foi ficando mais intenso com o passar da nossa convivência e me trouxe um questionamento: de onde vem tanta ansiedade?
Sendo tutora de primeira viagem, fiquei com a pulga atrás da orelha e busquei ajuda profissional. Tentei adestrá-la seguindo vídeos pelo YouTube, mas Lena só aprendeu a sentar sob comando e influência dos petiscos; deitar e rolar ela acha que é brincadeira. A gritaria na rua também não cessou, mesmo quando encurto a guia a cada vez que ela perde as estribeiras. Na busca por soluções, encontrei a veterinária Ísis de Oliveira, 30, que se apresenta como facilitadora da constelação sistêmica veterinária — um tipo de constelação familiar que inclui os membros "não humanos" da família.
Constelando o pet
Sem nada a perder, encarei uma sessão de constelação remota, do conforto do meu lar, sentada na mesa de trabalho e com a Lena deitada tranquilamente a meus pés. Ísis telefonou pelo WhatsApp à noite, direto de sua casa — onde cria três gatos.
De dia, a veterinária faz atendimentos tradicionais em uma clínica de Formosa (GO), onde mora. As práticas alternativas são um trabalho à parte, em parceria com o grupo Reiki Veterinário. Além da constelação, Ísis também aplica reiki em seus pacientes.
Os atendimentos de Ísis estão sendo feitos online. Na abordagem, o pet não precisa estar junto, podendo ser representado por algum objeto.
A veterinária usa bonecos de EVA em uma bacia de água para representar o núcleo familiar do cliente. Na sessão, cada pessoa assume um papel dentro do sistema — como a mãe, o pai ou os irmãos do tutor analisado. Com a voz suave, Ísis me perguntou se meus pais são vivos e foi posicionando os membros da minha família em uma bacia com água. Minha mãe, meu pai, minha irmã, a Lena e, claro, eu mesma.
Conforme ela colocava os bonecos no meio da água, eles iam se mexendo. "A movimentação se dá pelo campo morfogenético, esse campo de informações onde as constelações acontecem e se mostram. Eu acesso o seu campo e ele se manifesta na água", explica.
Comento que parece esotérico, mas Ísis garante que não. "É uma comunicação que não está em nível material", diz. Não tem nada de espiritual nem religioso na prática. E também não deve ser encarada como uma cura. É quase como um conselho, um caminho para solucionar um problema.
Vez ou outra durante o atendimento de 60 minutos, Ísis tira uma das chamadas cartas sistêmicas, explicando que elas são peças para ajudar a entender os movimentos do campo naquele momento.
Cada carta vem com uma frase que visa a ajudar o cliente no processo de tomada de consciência sobre a própria vida. As frases que saíram para o meu atendimento faziam sentido dentro do contexto da conversa. No final da sessão, foi como ter feito terapia. Saí como uma mulher analisada e desconfiada de que, no fim, minha própria ansiedade também afeta a ansiedade da minha pet.
Pane no sistema
Antes do atendimento, conversei com Ísis por meia hora sobre o que é a constelação veterinária e pra que ela serve. A constelação familiar é um método terapêutico criado em 1978 pelo alemão Bert Hellinger. Assim como a psicanálise, ela divide opiniões de especialistas.
Alguns chamam a prática de pseudociência — pois faltam evidências científicas de sua eficácia e é difícil adaptá-la ao método científico tradicional. Já Ísis defende que a constelação tem base científica e fenomenológica, que pode ser observada na prática. "A gente vê o que o campo está mostrando", diz.
O chamado "campo" é o campo morfogenético, um conceito desenvolvido pelo biólogo inglês Rupert Sheldrake. "Quando uma espécie adquire um hábito, seja ele positivo ou limitante, imediatamente esse hábito se instala no sistema e as pessoas terão a tendência de reproduzi-lo. É quase como um inconsciente coletivo, digamos."
Na constelação veterinária, o objetivo seria investigar a origem de algum sintoma — seja ele físico ou comportamental — dos pets. "O sintoma é o que se manifesta, mas isso tem uma origem anterior", diz Ísis. Durante a constelação, o tutor leva um tema à facilitadora, que é investigado dentro do sistema familiar.
Antropomorfização
Então "pais de pet" existem? Isso causa um emaranhamento, afirma a veterinária. "Quando a gente trata como filho, a gente esquece que eles têm os pais deles, a gente tira essa força deles. Qual a necessidade de chamar de filho? Por que eu coloco eles nesse lugar? Quando a gente coloca eles nesse lugar, eles se conectam muito mais com as nossas questões", opina.
Tratar o pet como gente é muito comum. Eles dormem na nossa cama, comem da nossa comida, são chamados de filhos e, de acordo com Ísis, acabam tomando nossas dores para si. "Quando os animais não humanos ficavam só fora de casa, eles não adoeciam igual aos humanos. Doenças e questões comportamentais que a gente vê hoje não apareciam no consultório", afirma a veterinária. "Quanto mais eles foram sendo introduzidos em casa e participando das nossas vidas, mais se criou uma ligação muito forte entre o aparecimento de sintomas e os desequilíbrios do nosso sistema."
O sucesso de roupinhas, sapatinhos, capinhas de chuva, bolos e cervejas que parecem feitos para consumo humano, mas são dos pets, também parece levar ao acesso de terapias "de gente" a eles.
"A constelação na modalidade online funciona muito bem, muitas pessoas têm procurado", diz Ísis. O preço da consulta é R$ 400.
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