Projetos parados no Congresso propõem revogar bônus a advogados públicos

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Projetos de lei apresentados no Congresso entre 2019 e 2020 propuseram revogar regras que criaram um bônus mensal para advogados da União e procuradores federais.
Como o UOL mostrou, entre 2017 e 2024, a União transferiu R$ 14,4 bilhões para uma entidade que se define como "privada" — embora ligada à AGU (Advocacia-Geral da União) — fazer o rateio do bônus.
O bônus foi criado por uma lei federal de 2016. O dinheiro vem de taxas pagas por quem quita débitos na Dívida Ativa da União, além de honorários advocatícios pagos por quem perde ação contra órgãos federais. O nome técnico do bônus como um todo é "honorário de sucumbência".
Outra legislação relacionada ao bônus é o Código de Processo Civil de 2015, que definiu que advogados públicos também deveriam receber os honorários. Antes, o valor só era pago a advogados privados.
Assim, se uma pessoa perde uma ação contra o INSS, por exemplo, precisa pagar honorários para os advogados que defenderam o órgão — mesmo que eles já sejam remunerados com recursos públicos.

O que dizem os projetos de lei
O PL 6381/2019 propõe revogar o artigo do Código de Processo Civil sobre honorários para advogados públicos.
A última movimentação do projeto foi em setembro de 2024, quando teve relator designado na Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania.
Não se pode permitir esse absurdo concedido a uma categoria de servidores apenas porque se aproveitaram da situação de serem advogados (que, aliás, têm como clientes a própria cidadania, que já paga por seus vencimentos) com o propósito de distribuir vantagens inconstitucionais.
Marcel Van Hattem, deputado federal (Novo-RS), na justificativa do PL 6381/2019
Já o PL 1473/2020 propunha extinguir a entidade privada que recebe os recursos da União e paga o bônus, chamada CCHA (Conselho Curador dos Honorários Advocatícios).
Os recursos hoje repassados ao CCHA seriam redirecionados ao combate à pandemia de Covid-19.
A tramitação parou em 2021, após a mesa diretora da Câmara avaliar que tal medida caberia à Presidência da República — argumento que também foi usado por grupos que defendiam a permanência do bônus.
Associações de classe se mobilizaram contra
O "Movimento Nacional pela Advocacia Pública", formado por associações de classe, se mobilizou para frear a tramitação dos PLs.
O PL 6381/2019 era visto como a principal "ameaça" ao bônus. "Está correndo rápido num ambiente contrário a direitos de servidores e com padrinhos fortes, como Rodrigo Maia e Arthur Lira", disse, à época, a Associação Nacional dos Procuradores e Advogados Públicos Federais (ANPPREV).
A entidade alertava que o texto havia recebido "significativo apoio de lideranças, especialmente do Centrão", com coleta de assinaturas para votação em regime de urgência.
Manobras dos membros da AGU barraram a votação da urgência em dezembro/19 que, no entanto, pode ser retomada a partir de fevereiro/20.
Associação Nacional dos Procuradores e Advogados Públicos Federais, sobre tramitação de PL que podia acabar com o bônus
Para a associação, no entanto, o PL não acabaria com o bônus, já que revogava apenas o trecho do Código de Processo Civil, sem mexer na lei que criou o bônus.
O PL "pode até não acabar com o direito [ao bônus], mas o enfraquece e abre brechas para que governos, até aqui calmos, comecem a se mexer mudando suas leis para trazer os honorários pros cofres públicos", afirmou a associação.
Líderes partidários foram procurados pelo Movimento, que também elaborou cartilhas para defender a manutenção do bônus.
Um dos argumentos favoráveis era que o bônus atende aos "princípios da meritocracia", pois "premia aqueles que efetivamente trazem benefício econômico ao Estado".
Porém, o bônus é pago para todos os cerca de 12 mil advogados da União e procuradores federais, na ativa e aposentados, não só aqueles que geraram benefícios econômicos. Outras carreiras da AGU que auxiliam no trabalho não recebem o bônus.
Além disso, investigação do UOL mostrou que 75% do dinheiro transferido pela União para o bônus se refere a taxas da dívida.
A PGFN (Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional), um braço da AGU, atua na cobrança. Mas os valores arrecadados não são distribuídos apenas entre os membros da PGFN, que representam a minoria da carreira, mas entre todos os advogados da União e procuradores federais.
A ANPPREV disse, em nota, que o bônus é "resultado de uma década de luta dos advogados públicos federais e sua constitucionalidade foi reconhecida pelo STF. A associação afirma que confia no trabalho do Congresso Nacional, a quem compete a elaboração das leis em nosso País, e acredita que o PL supracitado não irá prosperar".
O que diz a AGU
A AGU argumenta que o bônus foi reconhecido pelo STF. E que os pagamentos contribuem para a produtividade e eficiência dos seus membros.
"O êxito crescente dos integrantes da instituição reflete-se no quanto foi arrecadado pelo Estado brasileiro e o que potencialmente a União deixou de pagar com a atuação da AGU", diz o órgão, em nota enviada ao UOL.
"O impacto econômico gerado pelo trabalho da instituição passou de R$ 496,4 bilhões, em 2019, para R$ 1,097 trilhão, em 2024. Ou seja, em apenas cinco anos, temos o dobro no impacto econômico", segue a AGU.
Já o CCHA afirma que "atua para garantir os direitos dos advogados públicos, promovendo a recomposição financeira da categoria e reconhecendo sua atuação essencial na defesa da União e do Estado brasileiro frente a grandes corporações e na luta contra a corrupção".
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