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O futuro é da empatia: guru da futurologia prevê onda coletivista no mundo

O futurologista holandês Christian Kromme - Ana Paula Grabois/UOL
O futurologista holandês Christian Kromme Imagem: Ana Paula Grabois/UOL

Ana Paula Grabois

Da Agência Eder Content, colaboração para o TAB, no Rio

28/08/2020 04h00

O futurologista holandês Christian Kromme pesquisava sobre uma doença genética da filha, em 2011, quando identificou um padrão no desenvolvimento das células e organismos vivos. Foi o ponto de partida para descobrir que o desenvolvimento tecnológico segue o mesmo padrão — e para decifrar o que seria a essência da inovação disruptiva.

Ao escrever sobre como usar essa descoberta para prever a próxima grande onda tecnológica, Kromme seguiu o conhecido caminho que leva autores de best-sellers ao rentável mercado de palestras sobre inovação.

Em passagem pelo Rio de Janeiro, em 2019, o futurologista disse a uma plateia de empresários reunidos na Casa Firjan que a próxima onda tecnológica vai priorizar o coletivo e valorizar qualidades intrinsecamente humanas. Com tanta automação, robótica e conectividade, qualidades como empatia e imaginação terão mais valor do que o próprio lucro.

Não, não pense que ele é um socialista. Requisitado para dar palestras para grandes multinacionais sobre as tendências do futuro, Kromme afirma que algumas empresas já começaram a trabalhar com essa mentalidade e que a virada se dará em pouco tempo: cerca de cinco anos. "O lucro será um efeito secundário nas empresas do futuro", profetiza o autor em entrevista ao TAB.

Autor do livro "Humanização - Vá para o digital, permaneça humano" (em tradução livre), o holandês prega que há um futuro brilhante à nossa frente, mas é preciso realinhar a sociedade com a natureza. "O mundo se tornou um lugar imprevisível e instável para morar, com um tsunami de disrupção e digitalização e um alto nível de estresse."

Por essa razão, Kromme afirma que o futuro das empresas e da sociedade é valorizar o aspecto humano no propósito do uso e do desenvolvimento das tecnologias. "Temas como privacidade e bem-estar digital são muito importantes. As empresas que não fizerem isso não vão sobreviver nas próximas décadas", alerta. No site, além de uma versão e-book para download gratuito do livro, também se encontra uma lista considerável de grandes corporações entre os clientes recentes das palestras de Kromme.

Para ele, questões de vigilância, fake news e uso de dados individuais por gigantes de tecnologia como Facebook e Google mostram que precisamos de empresas com mais confiança, em direção a um outro nível de organização da sociedade. "É preciso ter outros tipos de empresas em que não apenas o lucro seja importante. É como se alimentar três vezes ao dia e está tudo bem, mas não é a coisa mais importante da sua vida."

Sete ondas

O futurologista identificou sete ondas que podem ser aplicadas tanto a seres vivos quanto à tecnologia: a interação, a infraestrutura, a informação, o instinto, a imitação, a inteligência e a imaginação. Atualmente, diz ele, estamos para entrar na última onda: a da imaginação no mundo tecnológico, com as habilidades humanas, como empatia e criatividade entrando em cena. "Os grupos de células se comportam iguais aos seres humanos. Há uma autocura quando não tem estresse", resume.

Nesta sétima onda, segundo Kromme, estão em evidência tecnologias de realidade aumentada e o uso de imagens holográficas, chegando ao estágio em que a tecnologia será invisível, pois estará integrada ao mundo real. "A pergunta que se faz é o que eu estou fazendo com essa tecnologia, qual é o propósito. Nós podemos fazer o que quisermos com a tecnologia, mas como seria, como seres humanos? Na próxima onda, as pessoas serão muito importantes", afirma.

No mundo do futurologista holandês, as empresas que valorizam o lado social do comportamento humano se beneficiarão. Nesse caminho mais humano, as empresas serão mais sociais e mais empáticas. "As próximas empresas não estarão envolvidas com uma elite; estarão envolvidas com o coletivo, em sistemas mais equilibrados. O coletivo será mais importante do que o individual", prevê.

Kromme, que atuou na indústria de software por 15 anos, oferece uma ideia de mundo em que a tecnologia assume tons pastéis. "São meio bilhão de pessoas conectadas, cooperando em escala global. As empresas do futuro serão como uma orquestra e o algoritmo é o maestro para criar a harmonia", promete o holandês. "A tecnologia é o empoderamento para fazer coisas extraordinárias. Tem a ver com inteligência social, emocional e de trabalhar em ambientes complexos."

Por um lado, por outro lado

Antes de ser chamado de utópico ou ingênuo, o futurologista explica que esse mundo conectado vai mudar como organizamos a sociedade, como colaboramos uns com os outros e como usamos a tecnologia, com impactos diferentes aos de hoje. "Nos últimos 30 anos, tivemos que nos adaptar à tecnologia. E se a tecnologia se adaptar a nós?", pondera.

Como exemplo, basta lembrar que já estamos na era das máquinas que aprendem com a fala das pessoas e da tecnologia capaz de detectar doenças a partir da imagem do olho do paciente enviada pelo telefone celular.

Mas nem tudo é cor-de-rosa nesse mundo de Kromme: se as máquinas se tornam mais baratas, qual a importância do ser humano? Ele não hesita em reconhecer que o trabalho como conhecemos está se transformando. "Milhões de empregos vão desaparecer nos próximos cinco ou dez anos com a tecnologia e a robótica. Tudo que não for automatizável terá mais valor. Por isso, é importante investir na imaginação e na criatividade. Vai ser a era das habilidades humanas", antecipa.