Morto? Adormecido? Como andam o Pixuleco e seu dono, com Lula solto
Lula murchou e foi dobrado. Não o real, que voltou com força ao noticiário político. Quem anda meio sumido e quieto, ao menos por enquanto, é sua famosa versão de 15 metros de altura e meia tonelada.
Pixuleco, o boneco inflável de Lula, paira sobre indignadas multidões verde-amarelas desde 2015. Vestido de roupa de presidiário, é o ícone mais famoso das manifestações que clamaram pelo impeachment de Dilma Rousseff e pela prisão do ex-presidente.
Hoje, porém, o cenário mudou. Lula está solto e elegível. Sergio Moro viu sua imagem derreter como um picolé em Cuiabá, depois que o ministro Edson Fachin anulou sua sentença e o STF decidiu que o ex-juiz atuou de forma parcial na condenação. Seria este o ocaso de Pixuleco e seus criadores? Estaria o boneco destinado à prateleira, ao lado daquela miniatura do Fofão que, diz a lenda, vinha com uma faca de brinde?
Nada disso. Convicção e visões de mundo não murcham tão rápido quanto um pedaço de plástico cheio de gás. "Já tivemos os resultados. Para reverter, é muito difícil. Colegas e amigos analistas políticos me dizem que a história política do Brasil é 'antes e depois do Pixuleco'", diz o publicitário Paulo Gusmão.
Pixuleco 'escondido'
Dono de uma agência de comunicação em Aracaju (SE), ele esteve à frente do brainstorm (reunião para discussão e criação de projetos) que pariu Pixuleco em 2015. Tem 57 anos e se apresenta como o criador do boneco em suas redes sociais. Já foi citado e entrevistado algumas vezes, mas diz que sempre preferiu os bastidores. De fato, é bem difícil encontrar uma foto do criador ao lado da criatura.
"Ele (Pixuleco) está mais vivo do que nunca. Agora, escondido", avisa o publicitário. "É provável que ele retorne. Só não posso dar mais detalhes." Como um general cioso de suas armas estratégicas, Gusmão não conta quantos Pixulecos exatamente estão guardados por aí. Uma reportagem da Folha de S.Paulo de fevereiro de 2018 informa que, na época, sete bonecos estavam espalhados por seis estados e Distrito Federal. "As informações obedeciam ao momento", diz o publicitário, em tom misterioso.
O Pixuleco tem a inscrição 13-171 no uniforme de presidiário, uma referência à legenda do PT e ao artigo do Código Penal para o crime de estelionato. Sua expressão assustada é emoldurada por barba e cabelo grisalhos. É um clássico e bem-sucedido produto publicitário, aquele capaz de simbolizar as fantasias e desejos difusos na multidão. No caso, o de ver Lula atrás das grades.
O mesmo artigo da Folha informava que a cúpula do PT estava tão brava com o Pixuleco que o secretário de comunicação do partido, Carlos Árabe, afirmara que "o que nós (PT) esperamos é que toda pessoa que defenda a democracia transforme esses bonequinhos em pedacinhos de plástico". Em janeiro de 2018, a presidente nacional do PT, Gleisi Hoffmann, pediu "tolerância zero" aos correligionários contra o boneco inflável.
Pixuleco levou diversas facadas em manifestações, mas sempre foi costurado e ressurgiu antes que fosse feito em pedacinhos. "Enquanto ela (Gleisi) está pensando em ser intolerante com o Pixuleco, nós estamos pensando em ser intolerantes com os corruptos", respondeu Gusmão à época.
Não me conformo
"Eu não sou jurista", avisa o publicitário antes de prosseguir: "como brasileiro, eu não me conformo [com a soltura de Lula]. Se eu não utilizei formas corretas para fazer alguma coisa, que eu seja penalizado por isso. Agora, se alguém deixa de ter culpa por algo culposo (sic), é uma loucura", diz Gusmão.
Em outras palavras, ele não chega a negar que o devido processo legal foi desrespeitado, em relação ao ex-presidente. Mas argumenta que, mesmo nesse caso, a culpa de Lula "já estava provada" e a sentença não deveria ser anulada.
"O que estão comentando é que houve a intenção de que as coisas andassem para a pessoa [Lula] ser culpada e não ter como escapar. Foi isso que entendi", diz o criador do Pixuleco. Em seguida, volta a afirmar com convicção: "teve investigação, culpa, tudo comprovado!".
Na ruptura entre Sergio Moro e Jair Bolsonaro, Gusmão fica ao lado do presidente. Para ele, o ex-juiz e ex-ministro da Justiça tentou "ser maior do que o país". "Bolsonaro surgiu como o candidato que poderia acabar com essa história de corrupção", explica. Gusmão acredita que o presidente vem cumprindo com as expectativas. Mesmo que, por exemplo, seus quatro filhos estejam sob investigação. "Se tiver (algo errado), que se pague. Até agora, nada foi comprovado."
'Ditadura socialista'
O pai do Pixuleco segue à risca a cartilha dos seguidores do presidente. Acredita que o crescimento econômico do governo Lula escondia um plano para impor uma ditadura socialista e dá a entender que o regime militar não foi bem uma ditadura. "Lemos aquele monte de livros contando uma história da ditadura militar, aquela coisa toda. Mas o que se sabe daquela época é que existia a implantação de uma ditadura do proletariado. Foi quando barraram essa situação. E ele (Bolsonaro) foi a favor disso. Não é que ele era a favor da ditadura", esclarece Gusmão.
Ele também diz que o "STF proibiu Bolsonaro de agir" na pandemia (versão já desmentida diversas vezes) e é a favor do "tratamento precoce" da covid-19. Sobre absolutamente nenhum país além do Brasil adotá-la e de a OMS (Organização Mundial da Saúde) já ter desmentido sua suposta eficácia, Gusmão explica que prefere crer "num grupo de médicos e cientistas que acredita no tratamento precoce, e prova que funciona, no que em um grupo de médicos e cientistas que politizaram essa questão". Ou seja: praticamente todos os médicos e cientistas do resto do planeta, além da própria OMS, estão juntos num complô contra o presidente Jair Bolsonaro.
O publicitário também é adepto da tese de que prefeitos e governadores são os maiores responsáveis pela situação da pandemia no Brasil. Questiona o porquê de alguns hospitais de campanha terem sido desativados. Não menciona que o Governo Federal, até agora, só construiu uma estrutura do tipo, em Goiás.
Avenida Bolsonaro
Pensado por Gusmão junto com colegas do "Movimento Brasil", o Pixuleco foi registrado na Biblioteca Nacional em outubro de 2017. Além da versão original, gigante, ganhou "filhotes" nas mais variadas versões: dez metros ou três metros de altura, de pelúcia, além de muitos outros, já que não há controle sobre sua fabricação e comercialização. "Acredito que já fizeram no mínimo 100 mil Pixulecos. Eu não tenho mais controle, as pessoas praticamente tomaram conta da produção", explica o publicitário.
A "Loja Oficial do Pixuleco", por exemplo, nada tem a ver com o Movimento Brasil, segundo Gusmão. O site com cara de blog vende Pixulecos em miniatura por R$ 20, além de camisetas e adesivos estampados com o boneco.
O produto em destaque, no entanto, é a "placa Avenida Bolsonaro". De acordo com o site, é um "contraponto à placa daquela ex-vereadora do mesmo partido do marginal que tentou matar nosso presidente Jair Bolsonaro, que, por ser uma completa desconhecida antes de ser morta, mereceria quando muito o nome de uma travessa ou beco na Favela da Maré!".
É uma referência à vereadora Marielle Franco, assassinada no Rio de Janeiro em março de 2018.
Apesar de a própria Polícia Federal já ter investigado o atentado e concluído que Adélio Bispo agiu sozinho, o publicitário não bota fé nessa possibilidade. Gusmão "não tem nenhum laudo para comprovar" sua hipótese. "Eu posso dizer o que se comenta. Tem até um vídeo de uns advogados fazendo uma denúncia."
Se você não sabe é porque não te contaram
O Movimento Brasil deixou de vender Pixulecos diretamente. Em sua página no Facebook, o grupo se define como defensor da democracia, liberdade econômica e dos "valores judaico-cristãos". Tem postagens contra a corrupção, em defesa do deputado Daniel Silveira (preso a pedido do STF depois de gravar um vídeo cheio de ameaças) e sobre "marxismo cultural".
Outros posts comemoram o 31 de março (aniversário do golpe militar de 1964), pedem a saída dos "ditadores do STF" e espalham distorções e mentiras como "Chanceler da Alemanha, Angela Merkel, assume o desastre causado pelo lockdown" e "Brasil assume 5° lugar entre os 193 países que mais vacinam".
No caso da Alemanha, Angela Merkel voltou atrás porque considerou que o lockdown precisava de mais tempo para ser implementado. Não criticou a medida. Já sobre o ranking da vacinação, o Brasil é apenas o 46º que mais vacinou quando se leva em conta o que interessa: a proporção de vacinados em relação ao tamanho da população.
Gusmão tem basicamente uma única crítica ao governo Jair Bolsonaro. Ele acredita que a comunicação do presidente é falha em mostrar as coisas boas de sua gestão. "O governo fez muito pelo país. Está fazendo." O quê, exatamente? "Ele faz muito mais do que você pensa. Se você não sabe, é porque não foi comunicado."
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