Os bastidores da 'saga Herbie', mini-fusca de R$ 12,5 mil guinchado em SC
Neste verão, a família de Maria Eduarda, 7, resolveu fazer algo de diferente. Saiu do condomínio fechado onde circula com o mini-fusca Herbie, em São José dos Pinhais (PR), para Itapoá (SC), na divisa dos estados. Na caçamba da caminhonete, levou o pequeno possante -- que acabou estampando manchetes de jornais após circular em perímetro urbano pilotado pela menina e o pai, Ademir Sviaguinson, 41.
A polícia militar apreendeu o veículo por falta de licenciamento e a saga viralizou nas redes, provocando discussões acaloradas sobre o incidente.
Se o Herbie de Maria falasse, contaria que viveu momentos intensos nessas férias, passando do anonimato ao apogeu, guincho e regresso ao seio da família.
Um brinquedo para lá de especial
Em janeiro de 1959, nascia no Brasil o primeiro Fusca com 54% de peças nacionais. O modelo da alemã Volkswagen não só virou verbete tupiniquim nesses 63 anos como ganhou a pequena versão motorizada, projetada para crianças. A Volks não tem relação com esta modalidade de automóvel e não permite o uso do nome por fabricantes de brinquedos -- mas miniaturas como Herbie fazem a alegria de crianças agraciadas com o mimo, que custa em torno de R$ 19 mil. À época da compra, em 2020, o fusquinha de Maria Eduarda custou R$ 12.500.
Em um dos anúncios de TV do século passado, o Fusca da VW supera obstáculos no interior do Brasil ao som dos versos "Minha vida é andar por este país/ Pra ver se um dia descanso feliz", de Luiz Gonzaga. Em 2022, a versão mini de Maria Eduarda é branca, toca músicas de Rick e Renner no som acoplado, leva um adesivo com o número 53 no capô e conta com bancos de couro que acomodam duas pessoas.
Com 2,27 metros de comprimento e 98 cm de largura, Herbie chega à velocidade máxima de 50 km/h e atrai olhares curiosos por onde passa. Não foi diferente na praia de Itapoá: dezenas de passantes pediam para tirar fotos do brinquedo. Segundo Simone França, 41, mãe de Maria, uma baliza realizada pela criança provocou aplausos de quem assistia. "Todo mundo queria filmar, nem conseguimos descansar", contou ao TAB sobre as férias no litoral catarinense.
A paixão da família por carros parece ter influência de Simone, que é dona de uma revendedora de veículos -- para adultos. Mas ela não tem um Fusca. "Gosto mais de Land Rover", admite à reportagem. Simone tem um Mercedes.
A empresária também é mãe de Gabriel, 15, de Bruna, de 23, e avó de Miguel, um bebê de seis meses. Casada há 16 anos com Ademir, que também trabalha no setor automobilístico, Simone é uma mulher sarada, loira e bronzeada. Traz no pescoço um pingente de serpente enrolada ao bastão de Esculápio, que entrega um sonho: ser médica ou enfermeira. "É sempre tempo de sonhar".
Ela conta que, em 2020, "a filha cismou que queria um mini-fusca como presente de Dia das Crianças após assistir vídeos no YouTube". A mãe insistiu em outros presentes, mas a menina não cedeu. O brinquedo encontrou a dona pela primeira vez embrulhado num laço cor-de-rosa com temática infantil.
Maria, que também adora Opalas e Kombis, agora sonha com uma capota para seu brinquedo. Além de carrinhos, ela gosta de brincar com seu bebê Reborn. Passeia com a boneca atada ao banco do Herbie com cinto de segurança e tudo.
José Cantoni, 67, fabricante que vendeu o Herbie para a família, explica que modelos como os de Maria têm quatro pedais: um freio e um acelerador para quem está à esquerda e outro freio e outro acelerador para quem está à direita. É o tal do comando duplo -- uma garantia de segurança para que o controle seja exercido por um adulto enquanto a criança simula dirigir. "Como nos carros de autoescola", explica o entusiasta dos brinquedos e, segundo ele, primeiro fabricante de mini-veículos do Brasil.
"Mini-carros agradam do desmamando ao caducando", comenta. Ele investiu na ideia em 2008 e montou uma fábrica que revende versões em miniatura de automóveis clássicos. No YouTube, já apresenta o mini-fusca modelo 2022. Diz ao TAB que as crianças adoram, mas são os adultos que querem brincar. Chegam para observar no estilo "é para meu amigo".
A repercussão
No TikTok, o vídeo de Maria Eduarda aos prantos vendo seu brinquedo partir no guincho viralizou e, segundo Simone, foi alvo de todo tipo de comentário. "Menina, ganhei tanto seguidor que tô até perdida. Acordo e tem cento e tantas mensagens porque muita gente torceu pra Maria recuperar o fusquinha". Quanto às críticas recebidas pelo risco que o passeio poderia oferecer à menina e aos transeuntes, ela diz que absorveu para criar forças e recuperar o carrinho.
Simone reclama de alguns repórteres que "usaram informações falsas, erraram nomes e fizeram juízo de valor sobre o caso". Também ficou cismada com fabricantes que usaram o episódio para promover seus miniveículos. "Guria do céu, queria que você visse alguns tentando se promover, querendo mídia. Foi um momento muito triste pra minha filha", afirma.
Enquanto o vídeo da apreensão de Herbie se espalhava pelas redes sociais, a empresária contratou Marcelo Araújo, advogado especialista em leis de trânsito.
Em 2006, Araújo escreveu um artigo sobre mini veículos emitindo um parecer sobre o que é um automotor -- veículo que se move por seus próprios meios e não se presta a circulação em via pública. "Existe nota fiscal. É um objeto lícito", argumenta. O advogado não contestou a PM judicialmente, mas o capitão Richardson Lima, em tratativa direta com Araújo, decidiu liberar Herbie como veículo de carga.
"Contagiante", descreveu o advogado sobre a alegria da criança. Agradecida, a menina tratou de colocar o homem de 1,80 m no banco de passageiro para tirar fotos enquanto circulava -- desta vez, no condomínio fechado.
Sobre a circulação do mini-veículo em via pública, Araújo explica que, ao não ter licenciamento e Renavan, Herbie também não recebe multas. O pai de Maria Eduarda, contudo, ainda pode responder criminalmente pelo incidente. A família e o advogado aguardam os próximos passos da Justiça.
A vida depois do guincho
No 10 de janeiro, em São José dos Pinhais, Herbie voltou. "O que tinha de gente parando na beira da calçada olhando, buzinando na BR, dando tchau pro Fusquinha?", emociona-se Simone.
Com categoria, bracinho no banco e de olho no retrovisor, Maria não esperou. Subiu no guincho para retirá-lo de ré. Comemorou fazendo o sinal da cruz e, depois, verificou se estava tudo certinho com o mini-fusca, que recebeu um banho na garagem de casa.
Do capitão Lima, da polícia militar catarinense, Maria ganhou um leãozinho de pelúcia da Proerd (Programa Educacional de Resistência às Drogas).
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