Quem faz o Choquei, perfil de fofoca que agora 'cobre' a guerra da Ucrânia
O fluxo de postagem no Choquei, um dos perfis de fofoca mais conhecidos do Brasil, seguia normalmente na quarta-feira (24). A eliminação de Brunna do "Big Brother Brasil", a briga do DJ Gabriel do Borel com um segurança de hotel e o novo visual de Whindersson Nunes eram as notícias mais recentes postadas pela equipe de conteúdo.
Naquela noite, o Choquei deveria virar a madrugada publicando fotos, vídeos e comentários sobre uma festa do BBB. De janeiro a meados de abril, o programa é pauta dominante no canal que tem mais de 16 milhões de seguidores no Instagram e mais de 1,4 milhão no Twitter. Às 21h17, um vídeo com o engenheiro Lucas Bissoli, o líder da semana, vestindo blazer e gravata rosa, dava a impressão de que tudo estava conforme o esperado, até o mundo mudar.
No mesmo minuto em que postou no Twitter o vídeo do rapaz dançando enquanto se arrumava, uma outra frequência entrou em "sintonia" no perfil de fofoca. Acostumada a acompanhar a vida e a carreira de celebridades e subcelebridades, a página interrompeu seu noticiário padrão para avisar que uma nova guerra estava prestes a acontecer. "Presidente da Ucrânia se pronuncia e diz que se forem atacados pela Rússia, vão defender à altura", lia-se, numa frase acompanhada com um símbolo de sirene, sugerindo urgência.
Começava ali a controversa e inusitada "cobertura de guerra" que viralizou no Brasil nestes últimos dias. O perfil de fofoca passou a publicar uma enorme quantidade de informações e imagens sobre o ataque da Rússia à Ucrânia — que já tem mais de 100 civis e 800 militares mortos, de acordo com o governo ucraniano — mudando bruscamente sua linha editorial.
'Brasileiro não gosta de ler'
O goiano Raphael Oliveira, 27, é quem comanda o Choquei. Formado em fotografia e publicidade, o rapaz decidiu, ainda durante a faculdade, não exercer nenhuma das duas profissões. Àquela altura, o perfil criado por ele no Instagram em 2014 como "uma brincadeira" havia ganhado proporções inesperadas.
No princípio, eram apenas "imagens fofas" de artistas, postadas pelo próprio Oliveira. "Mas começaram a viralizar", lembra. "Com o passar do tempo, o alcance foi aumentando e comecei a ter contato com artistas, a fazer publicidade de clipes e vídeos, cobertura de eventos", dizia ele, enquanto arrumava as malas para viajar ao Rio de Janeiro, onde deve cobrir festas privadas de Carnaval.
Os primeiros famosos a se aproximarem do influenciador goiano, segundo ele, foram Wesley Safadão, a dupla Simone e Simaria e o influenciador digital Carlinhos Maia. "Eles apoiaram mandando mensagem, incentivando."
Testando daqui e dali, ele acredita ter achado a receita para o sucesso: em oito anos, trocou legendas elogiosas por textos explicativos, depois condensou ainda mais as informações nas imagens, inserindo uma tarja com texto em cima das próprias fotos. "Cortei legenda grande porque brasileiro não gosta muito de ler."
A equipe do Choquei atualmente é formada por quatro "adms", como Raphael Oliveira se refere aos produtores de conteúdo. Ele lidera o grupo, que reúne um estudante de ciência política, dois publicitários e um jornalista. Oliveira conta ao TAB que o perfil do Choquei chega, semanalmente, a uma média de 50 milhões de visitas e 2 bilhões de visualizações. Apesar de não revelar quanto cobra por cada publicidade, explica que os valores variam de acordo com os produtos. A fama também leva o influenciador a ser sondado por familiares de participantes de reality shows, como o próprio BBB e a "A Fazenda", para "comprarem" a torcida do perfil.
"Tem página que aceita, mas eu não fecho, porque corre risco de isso vazar", afirma. "Mas nós já defendemos torcida, abertamente, quando a pessoa era nossa amiga. Isso foi na edição da Rafa. Somos amigos antes mesmo de ela entrar pro programa. A gente defendia ela, pedia voto quando ela estava no paredão. Esse ano, quero ficar mais quietinho mesmo."
Engajamento e fake news
Às 8h da quinta-feira (24), Raphael Oliveira convocou uma reunião de urgência com sua equipe para discutir a "cobertura" da guerra no Choquei. O engajamento das postagens havia aumentado consideravelmente desde que o perfil passou a publicar informações sobre a invasão russa à Ucrânia.
No Instagram, seguidores comentavam as imagens pedindo orações, outros usavam trechos proféticos da Bíblia. Mas no Twitter, ao contrário, as interações eram na grande maioria reativas: cobravam-se referências às fontes de onde vinham aquelas notícias massivamente compartilhadas pelo canal e aceleradamente replicadas.
A preocupação era justificável. Pouco antes da 1h, Choquei havia postado um vídeo mostrando uma explosão numa cidade, cuja legenda dizia se tratar de "regiões habitadas" na Ucrânia. A cena, porém, era falsa, como provou a Agência Lupa. Tratava-se do registro de um raio atingindo uma usina elétrica, em janeiro de 2021.
"Tenham cuidado com fake news e vídeo antigo. Nosso nome está em jogo", orientava o goiano, em reunião com seus três assistentes. As críticas ao longo da madrugada o assustaram. "Quando chamei para a reunião, os meninos pensaram logo: 'Meu Deus, aconteceu alguma merda'."
Oliveira garante que seus funcionários só publicaram notícias vindas de veículos de imprensa de confiança. "Eles me disseram que estavam acompanhando um jornal norte-americano. Só não querem divulgar o nome para não entregar à concorrência", explica. "Há duas horas, anunciamos que a Rússia estava tentando dominar Chernobyl. O pessoal dizia que era fake, mas minutos depois a imprensa brasileira confirmou. Demora pra chegar aqui? Pode ser."
"Eu concordo e discordo", pondera o influenciador, sobre as críticas que passaram a receber. "Não concordo quando essas críticas vêm de hater. Se você for ver, o perfil dela [de quem critica] só tem comentários falando mal do Choquei. Essa pessoa quer prejudicar a empresa. Concordo quando a crítica é de alguém que já está compartilhando muitas informações e análises, mas pede para a gente ter cuidado com as fontes."
Oliveira diz que a página deve seguir acompanhando a guerra, mas com um fluxo menor de postagens. Na sexta-feira (25), os textos passaram a incluir referência das fontes de apuração, entre parênteses.
Com a proximidade das eleições de 2022, Choquei também pretende entrar na cobertura política local? "É muito delicado, principalmente quando envolve Bolsonaro, porque tem muita gente que não apoia [o presidente] e muita gente que idolatra", tergiversa Raphael Oliveira. O risco é numérico, neste caso: em 2018, Choquei perdeu 10 mil seguidores em 13 minutos, logo após uma postagem no Instagram anunciando a vitória de Bolsonaro. "Era apenas dizendo que Jair Bolsonaro foi eleito presidente do Brasil."
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