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'Esse dinheiro não é político': taxistas comentam auxílio de R$ 2 mil

"Não sou bolsonarista, mas também não sou lulista. Esse dinheiro não é nem político", diz o taxista José Vieira da Silva - João de Mari/UOL
'Não sou bolsonarista, mas também não sou lulista. Esse dinheiro não é nem político', diz o taxista José Vieira da Silva
Imagem: João de Mari/UOL

João de Mari

Colaboração para o TAB, de São Paulo

21/08/2022 04h01

José Vieira da Silva, 56, ri junto a outros cinco taxistas de terno, na quinta-feira (18), ao lado de carros de luxo próximos à avenida Paulista, em São Paulo. "Mês passado gastei mais de R$ 3.000 com combustível. Neste mês, não gasto nem metade", diz. "A manutenção do carro, que deixei de realizar na pandemia, farei agora. O auxílio veio em uma boa hora".

O motorista de táxis de luxo — modalidade em que as tarifas são mais caras, assim como os carros, e os profissionais são bilíngues — comemorava os R$ 2.000 que recebeu do benefício emergencial, o auxílio taxista. Segundo o governo federal, a ideia é compensar os efeitos do aumento no preço dos combustíveis, como foi feito com o auxílio caminhoneiro.

Vieira é taxista e caminhoneiro. Sacou o smartphone do bolso e mostrou uma foto de sua carreta, parada num posto de Araçatuba (SP).

"Nunca vi uma situação como a pandemia, não teve igual. Meu caminhão está parado. Prefiro o táxi, porque dá mais dinheiro — ou melhor, dá menos, mas sobra mais", afirma. "Agora, a gente já anda com as próprias pernas, mas o governo deu essa ajuda para compensar lá atrás, no pico da pandemia. Naquela época, não fez nada."

Para Vieira, o benefício não tem a ver com as eleições. "Se fosse outro governo, também dava para promover esse auxílio, porque nós pagamos muitos impostos, não vai pesar para o Brasil", pondera. "Não sou bolsonarista, mas também não sou lulista. Esse dinheiro não é nem político, porque ele vem para ajudar muita gente."

Segundo o Ministério do Trabalho e Previdência, têm direito ao benefício os motoristas de táxi com CNH válida e alvará para prestação do serviço cadastrado nas prefeituras em vigor no dia 31 de maio de 2022. Há 245.213 taxistas aptos a receber os R$ 2.000, o que totaliza R$ 490,4 milhões.

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'Brasileiro é complicado. Dá um docinho pra ele e o cara já muda de opinião. É estratégia', opina Luís Augusto
Imagem: João de Mari/UOL

Pendurar o alvará

Morador de Santo Amaro, na zona sul, o motorista Luís Augusto, 56, acordou às 5h da manhã para iniciar mais um dia de trabalho no Baixo Augusta. Às 9h, estava no décimo passageiro.

Por pouco, não precisou "pendurar" seu alvará de taxista na Prefeitura de São Paulo, durante a pandemia, conta. Hoje, prestes a ser obrigado a trocar seu Chevrolet Spin 2013 devido ao limite de dez anos imposto pela administração municipal, diz que não conseguiu acessar o auxílio taxista.

"Quem conseguiu se virar pagando combustível conseguiu, mas teve cara que vendeu até o carro. Que não conseguiu pagar a dívida e devolveu o alvará. No meu ponto, uns três já viraram motoboys, entregadores de aplicativos", relata, referindo-se ao ponto na rua Frei Caneca.

O semáforo ficou vermelho, Augusto parou o carro e abriu o porta-luvas para mostrar um maço com diversos documentos. "Para não perder o alvará, tem taxista que deposita o documento na Prefeitura. É igual entrar numa dívida da faculdade, você tranca até conseguir pegar outro carro para não perder a licença", explica.

"A gente [taxista] tem grupo no WhatsApp. Ficamos conversando para nos atualizar. O sistema está bem falho, porque um monte de cara pegou o auxílio já, mas tem uns que está dando pau."

Para Augusto, a liberação do auxílio taxista neste momento é "totalmente político". "Por que não deu naquela época que a gente estava precisando? Brasileiro é complicado. Dá um docinho pra ele e o cara já muda de opinião. É uma estratégia", avalia, antes de encerrar a viagem de cerca de 3 km que custou R$ 22.

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'Penso que tudo vem na hora certa', diz José Roberto David, sobre o auxílio
Imagem: João de Mari/UOL

Bandeiras

Segundo o Ministério do Trabalho e Previdência, os taxistas vão receber o benefício automaticamente no app Caixa Tem ou na agência da Caixa Econômica Federal. O governo não divulgou o número de beneficiados com o programa, pois isso depende de informações que serão fornecidas pelas prefeituras referentes aos profissionais com alvará para atuar nas cidades.

Parado sob uma árvore na Bela Vista, no centro, o taxista José Roberto David, 67, espera por uma passageira que deixou em um shopping center próximo dali. Diz ser contra o auxílio, mas afirma que está tentando conseguir acessar os R$ 2.000. A expectativa dele é ter o dinheiro na conta em até dez dias. "Mas não era o momento de dar dinheiro para taxistas, tinha que dar para caminhoneiros", comenta.

Caminhoneiros autônomos, outra categoria-chave para Jair Bolsonaro na disputa de 2018, também receberam auxílio — que, ao todo, deve beneficiar cerca de 900 mil transportadores autônomos de cargas, nos cálculos do governo.

"Na pandemia não tinha nem vacina, é difícil criticar o governo. É consequência do coronavírus. Abaixou o combustível depois de muita briga de Bolsonaro para os governadores abaixarem o ICMS", diz David.

"Atuo há 33 anos como taxista, e a pandemia não me atrapalhou em nada, não. Trabalhei, graças a Deus, e não peguei covid. Se você olha e pensa 'o governo deveria ter comprado vacina, abaixado os preços', eu penso que tudo vem na hora certa."

Dois taxistas não quiseram conversa. Um deles, parado num ponto na alameda Campinas, desceu do carro com bandeiras do Brasil na janela, hostilizou a reportagem e mandou o TAB embora.

Uber - João de Mari/UOL - João de Mari/UOL
'Tem muitas mudanças acontecendo devido à eleição', comenta Everton Silva
Imagem: João de Mari/UOL

'É tudo político'

"Não tenho nada contra taxistas", diz o motorista de aplicativos, Everton Silva, 26, enquanto dirige pelas ruas de Santa Cecília. Se eles pagam mais impostos, pondera, "têm mais direitos do que quem trabalha na Uber ou 99".

Morador de Ferraz de Vasconcelos (SP), ele estava rodando a capital paulista por horas. "Seria bom se a gente recebesse auxílio também. É difícil de acontecer, porque o taxista tem sindicato, e os motoristas de aplicativo, não", acrescenta.

Procurado pelo TAB, o Sindicato dos Taxistas Autônomos de São Paulo não retornou o pedido de entrevista.

"Tem muitas mudanças acontecendo devido à eleição. Os taxistas estão comemorando que o combustível abaixou, que ganharam o auxílio do governo, mas ano que vem vai estourar tudo de novo. É tudo político."