Em shoppings de empresário bolsonarista, público não liga se houver golpe

"Lula só ganha se houver fraude grossa", teria publicado José Isaac Peres, acionista dos shoppings Multiplan, um dos integrantes do grupo "Empresários & Política" no WhatsApp que, conforme revelou reportagem do site Metrópoles, defendem um golpe caso o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) vença Jair Bolsonaro (PL) nas eleições de outubro de 2022. Nesta terça-feira (23), Peres e os outros empresários foram alvo de operação da Polícia Federal, dentro do chamado inquérito das milícias digitais.
"Bolsonaro ganha nos votos, mas pode perder nas urnas", também teria dito Peres, ao questionar a credibilidade das pesquisas de intenção de voto e das urnas eletrônicas. Políticos como Ciro Gomes (PDT) e Guilherme Boulos (PSOL) defenderam um boicote às empresas envolvidas no discurso golpista, mas, nos corredores de três shoppings paulistanos da rede Multiplan, um conglomerado de 20 unidades distribuídas entre seis estados e o Distrito Federal, com lucro líquido de R$ 171 milhões no primeiro trimestre, o zap dos poderosos fez sucesso.
"Antes um louco que um ladrão na Presidência", dizia uma rodinha de executivos engravatados que frequentam o Shopping Vila Olímpia, uma unidade cercada por edifícios corporativos e arranha-céus de alto padrão na zona sul de São Paulo. Um deles foi além: "Melhor golpe que ladrão".
Discretos, os empresários expressaram o horror diante de uma possível vitória de Lula ("cruz-credo" e "pesadelo", nas suas palavras), mas não quiseram se identificar - viram como um tipo de erro de principiante o sincericídio dos integrantes do grupo "Empresários & Política" num app. "Imagina, posso me queimar no trabalho", disse um deles.
DataFollowers
Desde abril, bolsonaristas vêm contestando a credibilidade das pesquisas de intenção de voto. O discurso, endossado por Peres no WhatsApp, também encontrou eco no MorumbiShopping, na zona sul, um dos mais tradicionais de São Paulo. Lá, as vitrines estão bombando com looks verde e amarelo, uma tendência pré-Copa do Mundo, mas também para as eleições, informou uma das lojistas.
No domingo (21), dia de corredores lotados de pets com pedigree, famílias e fake news, o gerente de tecnologia da informação Carlos Franco, 69, parou para tomar um café com um amigo arquiteto. Nenhum deles confia nos índices que dão liderança a Lula. "O Datafolha é tendencioso para o Partido dos Trabalhadores", disse Franco — fundado em 1983, o Datafolha é um instituto com histórico consolidado. Em 2018, indicava a vitória de Bolsonaro frente Haddad ao longo de todo o mês de outubro, pré-segundo turno.
A administradora de empresas Karen Gomes, 23, desconfia das pesquisas, pois diz que não conhece ninguém que já foi entrevistado nas enquetes. "Eu nunca respondi para o IBGE [Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística]", exemplificou a amiga, a administradora Jessica Araujo, 31.
No Shopping Anália Franco, na zona leste, o frequentador Jonnathan Guimarães, 30, também torceu o nariz para os institutos e indicou outra metodologia. "O melhor é você ver quantos seguidores [o candidato] tem na internet, isso demonstra o quanto aquele político tem de força. A internet não é manipulada porque é o próprio povo que faz tudo o que acontece por lá."
No ponto de ônibus em frente ao shopping center, o frequentador Celso Venâncio dos Santos, 28, foi mais flexível. "Tudo pode mudar nos 45 minutos do segundo tempo. As pessoas mudam de opinião e, conforme a música vai tocando, a dança muda."
O bancário Gilberto Dias, 41, afirmou que as pesquisas são "subjetivas". A seu lado, a namorada (que não quis se identificar) franziu a testa ao lembrar que a subjetividade dos entrevistados até agora tem indicado uma preferência por Lula.
As pesquisas consideradas confiáveis são realizadas com métodos de entrevista consistentes e transparência. Para garantir a qualidade das informações divulgadas, o TSE (Tribunal Superior Eleitoral) exige que o levantamento informe quantas pessoas foram ouvidas, quando e como elas foram abordadas, que perguntas foram feitas a elas e quem pagou pela pesquisa.
Nenhum deles se escandalizou com a possibilidade de um golpe tal qual foi defendido no grupo "Empresários & Política".
Política ou futebol?
Na noite de segunda-feira (22), nem golpe nem Bolsonaro fizeram os clientes cruzarem os talheres em uma unidade do Coco Bambu, rede de restaurantes fundada por Afrânio Barreira, empresário que deu "joinha" na famigerada mensagem de José Koury, do Shopping Barra World, no WhatsApp: "Prefiro golpe do que a volta do PT. Um milhão de vezes".
"Política não estava no menu", contou o jornalista Matheus Pichonelli, colunista do TAB, no Coco Bambu de um shopping de alto padrão em Campinas (SP).
Também foi assim nos bares da Vila Madalena, na zona oeste de São Paulo — as TVs de LED estavam sintonizadas no futebol. Um pagode alto abafou qualquer indício de panelaço prometido na cidade durante a entrevista de Bolsonaro para William Bonner e Renata Vasconcellos no "Jornal Nacional".
No Bar do Urso, a garçonete Sol ligou no JN a pedido da reportagem. Um punhado de jovens de 20 e poucos anos parou para assistir ao jornal. Riram muito, o tempo todo, mas não disseram se as gargalhadas eram para Bolsonaro ou Bonner.
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