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'Vai ser uma festa': com posse de Lula, Brasília vira destino de Réveillon

A servidora da Defensoria Pública Erica Meireles, que está viajando de carro de São Paulo a Brasília para ver a posse de Lula - Arquivo pessoal
A servidora da Defensoria Pública Erica Meireles, que está viajando de carro de São Paulo a Brasília para ver a posse de Lula Imagem: Arquivo pessoal

Do TAB, em Brasília

29/12/2022 04h01

A três dias da posse do presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva (PT), Brasília amanhece com ares de pré-festa, mas também de tensão. Alvo de atos golpistas e tentativa de atentado a bomba desde a derrota de Jair Bolsonaro (PL) nas urnas, a capital federal está com cerca de 95% dos 20 mil leitos de seus 400 hotéis ocupados, segundo estimativa do Sindhobar (Sindicato Patronal de Hotéis, Restaurantes, Bares e Similares de Brasília) — nas palavras do presidente do órgão, Jael Antônio da Silva, 76, "um movimento muito bom para a cidade", que não é especialmente famosa como destino de Réveillon.

Esta é a primeira vez que o professor da UnB (Universidade de Brasília) Daniel Carvalho, 33, passa as festas na capital. Na sua casa, um apartamento de 55 m² na Asa Norte, ele vai abrigar seis amigos, vindos de São Paulo e de Alagoas, para brindar a virada 2022-2023 e prestigiar neste domingo (1º) o Festival do Futuro, organizado pela futura primeira-dama, a socióloga Rosângela da Silva, a Janja. "Vai ser uma festa", aposta o anfitrião.

Assim como os amigos de Daniel, milhares de viajantes vão emendar Réveillon, posse presidencial e uns dias de férias na capital e arredores. "É um momento especial para todos nós que ficamos nas ruas os 45 dias de campanha sem arredar pé", diz o estudante universitário Cristiano Assis, 23, militante da Juventude do PT que desembarcou no Aeroporto Internacional de Brasília nesta quarta-feira (28) ao lado do advogado Ariston Costa, 37, professor convidado da pós-graduação da UFPE (Universidade Federal de Pernambuco). Os "namoridos", como eles se definem, vão virar o ano na República do Coentro, festa pernambucana que terá edição especial num clube na Asa Norte, e no dia seguinte vão para a Esplanada dos Ministérios.

Hotel foi impossível reservar a tempo, diz o casal; Airbnb (que não divulgou ao TAB os percentuais de ocupação na cidade), tampouco, devido aos altos valores das diárias. "As melhores opções já estavam esgotadas. Sorte que temos a casa de um amigo", conta Ariston, um pouco temeroso com o desenrolar de atos antidemocráticos no Cruzeiro (DF), onde estão hospedados. "Dizem que a capital está muito dividida e ficaremos num reduto de militares. Mas, no fim, com certeza será uma festa da democracia, que é o que o país precisa."

Os namorados Ariston Costa e Cristiano Assis, que vão viajar a Brasília para ver a posse de Lula - Arquivo pessoal - Arquivo pessoal
'O ano é 2022 e eu escolhi meu petista preferido', brinca o casal Ariston Costa e Cristiano Assis
Imagem: Arquivo pessoal

De São Paulo, a servidora da Defensoria Pública Erica Meireles, 32, integrante da ABJD (Associação Brasileira de Juristas pela Democracia) e do PSOL, nos últimos dias finalizou uma consultoria para a transição do novo governo, no grupo de acesso à justiça, coordenado pela advogada Sheila de Carvalho, e nesta madrugada partiu para uma viagem de cerca de mil km de carro para chegar a Brasília. Ela e amigos ativistas de direitos humanos vão se hospedar na casa de Deise Benedito, que trabalha na liderança do PSOL brasiliense e também está acolhendo viajantes.

"É um momento histórico", diz Erica. "Nós vamos com compromisso democrático, conscientes dos riscos [diante de atos golpistas] e bastante encorajados. A gente não vai se submeter a uma atmosfera de terror", acrescenta. "Viver é ter coragem."

A advogada Erica Meireles, que vai viajar a Brasília para ver a posse de Lula - Arquivo pessoal - Arquivo pessoal
'A gente não vai se submeter a uma atmosfera de terror', diz Erica Meireles, que atuou na transição de governo
Imagem: Arquivo pessoal

'Feliz 2023'

"Vai estar em Brasília para a posse do presidente Lula?", diz uma mensagem que vem sendo compartilhada no WhatsApp, com 13 dicas de segurança para os espectadores — entre elas, "não provoque e não responda a provocações: convide suas companheiras e companheiros para cantar ainda mais alto os gritos de ordem".

A expectativa é de festa para um "feliz 2023", mas é preciso "ficar atento", dizem o jornalista Danilo Gonçalves, 37, e o psicólogo João Vitor Borges, 26. A ideia de "lavar a alma" diante do que foi viver o governo Bolsonaro, principalmente no contexto da pandemia de covid-19, e celebrar um futuro que se imagina no governo Lula, foi o que motivou a viagem do casal.

Mensagem com dicas de segurança para posse de Lula que circula no WhatsApp - Reprodução - Reprodução
Trecho da mensagem com dicas de segurança para posse de Lula que circula no WhatsApp
Imagem: Reprodução

Danilo vem de uma família progressista do ABC paulista, "super sindicalista", e lembra até hoje de ouvir de uma tia a festa que foi a primeira posse de Lula, em 2003. "Ela me ligou para narrar o que estava acontecendo, o pessoal pulando nos lagos da Esplanada. Ficou marcado na memória."

Ela morreu de câncer, em 2014, e Danilo quer homenageá-la, ligando para a mãe e a avó para narrar a posse de 2023. "Hoje dá pra fazer 'live'", emenda o noivo, João, cuja família é de Garanhuns (PE), cidade natal de Lula — o avô, João Inácio da Silva, "jura" que é primo distante do futuro presidente, conta. "É muito importante para minha família ter alguém lá. É uma vitória. A gente vai para estar junto e representar."

Danilo e João estão com as passagens de ida marcadas há cerca de um mês: desembarcam nesta quinta (29), ficam dois dias na Chapada dos Veadeiros (GO) e só no domingo vão para Brasília — os hotéis na capital estavam caros "tipo Réveillon no Rio". A volta seria de ônibus, mas o trecho foi cancelado e eles ainda precisam decidir como vão voltar para casa, em São Paulo.

A historiadora Renata Rodrigues de Freitas, que vai viajar a Brasília para ver a posse de Lula - Arquivo pessoal - Arquivo pessoal
'Eu estava lá': historiadora, Renata Rodrigues de Freitas quer presenciar evento histórico
Imagem: Arquivo pessoal

"Vambora, nem que eu vá pedindo carona e precise acampar", pensou a historiadora Renata Rodrigues de Freitas, 38, que trocou a virada no Rio, onde mora, por Brasília. Ela arrematou duas passagens aéreas ("a Black Friday realizando pequenos sonhos do proletariado") e com uma amiga alugou um apartamento perto da Esplanada (R$ 1.800 para cinco dias, de 31 de dezembro a 4 de janeiro).

Há momentos que já nascem históricos, justifica ela. "Um dia, vou ver uma foto da multidão na posse num livro de história e vou poder dizer 'eu estava lá'", brinca.