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Exilado, ex-presidente do Equador Rafael Correa discursa no centro de SP

O ex-presidente do Equador Rafael Correa (no centro), em encontro com movimentos sociais no Armazém do Campo, em São Paulo - Daniel Lisboa/UOL
O ex-presidente do Equador Rafael Correa (no centro), em encontro com movimentos sociais no Armazém do Campo, em São Paulo Imagem: Daniel Lisboa/UOL

Daniel Lisboa

Colaboração para o TAB, de São Paulo

02/04/2023 04h01

"O Equador não é um país no qual se presta muita atenção", abriu o ex-presidente equatoriano Rafael Correa, ao tomar a palavra no galpão do Armazém do Campo, no centro de São Paulo, onde discursou para cerca de 200 ativistas na noite quente de quinta-feira (30). "É o segundo menor da América do Sul e nem sequer tem fronteira com o Brasil", acrescentou, lamentando a "indiferença" internacional à condição de seu país.

Presidente entre 2007 e 2017, inelegível e condenado a oito anos de prisão no Equador em 2020, julgado por envolvimento num esquema de propina que movimentou cerca de US$ 7 milhões, Corrêa atualmente vive exilado, na condição de asilo político na Bélgica. Cruzou o Atlântico para participar do Fórum Mundial de Direitos Humanos, em Buenos Aires, onde dirigentes do PSOL o convidaram para vir ao Brasil.

"Correa é um dos grandes. Está na prateleira especial de Hugo Chávez, Evo Morales, Lula e Cristina Kirchner", disse o presidente da legenda, Juliano Medeiros (PSOL-SP), referindo-se a outros líderes latino-americanos.

Medeiros considera o ex-presidente equatoriano alvo de "um dos mais graves casos de perseguição política e judicial na América do Sul". "A luta contra a corrupção vem sendo usada como instrumento de perseguição, no Brasil, na Argentina, no Equador e em outros países. E quem encarna a resistência hoje é o companheiro Rafael", afirmou. Correa e outros políticos foram condenados no processo, acusados de pedir dinheiro para empreiteiras em troca de contratos para projetos de infraestrutura.

"Rafael está vivendo uma injustiça tão profunda quanto a sofrida pelo companheiro Lula", acrescentou Frei Betto, no palco improvisado no Armazém do Campo, vinculado ao MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra), onde o clima festivo se alternou com cânticos de luta e certa solenidade.

No palco também estava João Pedro Stédile, líder do MST. Na plateia, o ex-senador Eduardo Suplicy (PT-SP), que presenteou o convidado com um livro de sua autoria, "Renda Básica de Cidadania". Para o ex-senador, a situação de Correa é "um pouco diferente" da que Lula enfrentou. "Ele está impedido de entrar no seu país. Tenho a confiança de que o povo equatoriano vai assegurar sua volta", disse.

Encontro de movimentos sociais com o ex-presidente do Equador Rafael Correa no Armazém do Campo, em São Paulo - Daniel Lisboa/UOL - Daniel Lisboa/UOL
Evento com movimentos sociais, estudantis e centrais sindicais teve clima de festa e solenidade
Imagem: Daniel Lisboa/UOL

Volver?

Rafael Correa subiu na prancha para surfar a "onda rosa" entre fins da década de 1990 e o início dos anos 2000, quando ascenderam diversos governos de esquerda na América Latina: Chávez na Venezuela, Evo na Bolívia e Lula no Brasil, entre outros. Quinze anos depois, Lula voltou à Presidência, o jovem Gabriel Boric governa o Chile, Alberto Fernández a Argentina, e Gustavo Petro a Colômbia.

"São processos bastante diferentes. Na primeira onda de governos progressistas, oriundos do Foro de São Paulo e das lutas democráticas dos anos 80 e 90, havia maior homogeneidade e identidade entre eles", Medeiros ponderou ao TAB.

"Já esta segunda onda se dá depois de uma crise profunda do neoliberalismo e de diversas experiências de governos de direita. É mais heterogênea e manifesta o surgimento de uma nova esquerda, em particular na Colômbia e no Chile. Traz consigo novas agendas, como a da questão ambiental, dos direitos humanos e da defesa da democracia, para além das agendas clássicas."

Encontro de movimentos sociais com o ex-presidente do Equador Rafael Correa no Armazém do Campo, em São Paulo - Daniel Lisboa/UOL - Daniel Lisboa/UOL
Imagem: Daniel Lisboa/UOL

No Equador, o atual presidente Guillermo Lasso, de direita, é alvo de protestos e pedidos de impeachment. A frente liderada por Correa, a Revolução Cidadã, conquistou sete prefeituras no último pleito. "Nunca havíamos vencido em Quito e Guaiaquil. E Guaiaquil foi governada pela direita por 31 anos. Era um bunker da direita."

Um retorno triunfante de Correa, entretanto, não parece provável no futuro mais imediato. Se voltar hoje ao país, o ex-presidente pode ser preso. "Não sou uma vítima. Vítima é o povo equatoriano destruído pelo neoliberalismo corrupto e entreguista", disse, no Armazém. "Vítimas são os companheiros exilados por conta da perseguição brutal ao 'correismo'."

Depois de passar pelo centro de São Paulo, Rafael Correa não divulgou quanto tempo ficará no Brasil. Ou quando espera voltar ao Equador.

O ex-presidente do Equador Rafael Correa, em encontro com movimentos sociais no Armazém do Campo, em São Paulo - Daniel Lisboa/UOL - Daniel Lisboa/UOL
Imagem: Daniel Lisboa/UOL