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'Nunca namorei na vida', diz Paulo Kogos, influencer com 126 mil seguidores

Paulo Kogos, sobre as roupas que usa: "É uma dupla homenagem, aos templários e aos bandeirantes paulistas" - Arquivo Pessoal
Paulo Kogos, sobre as roupas que usa: "É uma dupla homenagem, aos templários e aos bandeirantes paulistas" Imagem: Arquivo Pessoal

Paulo Sampaio

Do TAB

05/11/2020 04h00

Conhecido por suas extravagantes declarações políticas e por sua arrebatada admiração pelos Cavaleiros Templários, o economista e estudante de filosofia Paulo Kogos é um fenômeno no YouTube. Seu canal "Ocidente em Fúria", onde defende a Igreja e a sociedade contra a devastação moral, conta com 126 mil inscritos.

A tardia adolescência e seu heroísmo imaginário o fazem um sucesso entre os jovens nas mídias sociais. Definindo-se como católico fervoroso e conservador de direita, ele afirma que tem uma dificuldade gigantesca de se aproximar das mulheres. "Nunca namorei", diz, ensimesmado.

Para um homem com adiantados 33 anos ("a idade de Cristo"), revelados com muita insistência, vivendo em uma sociedade eminentemente machista, trata-se de uma confissão assaz corajosa -- para usar um advérbio típico do discurso "kogosista".
Com a mesma honestidade, ele declara que é portador de síndrome de Asperger (autismo leve), "em algum nível", sem nunca ter recebido um diagnóstico oficial.

Fora das redes sociais, Kogos costuma aparecer em manifestações em São Paulo paramentado com roupas de personagens do período medieval, que ele adquire em lojas especializadas em trajes temáticos. Lembra à reportagem de TAB que os Templários tinham por princípio "a defesa da fé, dos fracos, dos pobres, da Justiça e do bem", e que sai às ruas como um soldado para "defender comerciantes que não conseguem enfrentar o governo e suas imposições ditatoriais de quarentena".

Politicamente, Paulo Kogos se diz anarcocapitalista. Trata-se de uma vertente do conservadorismo que propõe, basicamente, a eliminação do Estado pela soberania do indivíduo. "É a submissão da governança ao livre mercado e à propriedade privada", afirma.

Nossa Senhora Aparecida

Ex-vítima de bullying por parte dos coleguinhas de escola, Paulo Kogos tem 1,68 m de altura e 80 kg de peso ("100 kg, na parte mais sombria da quarentena"). Matriculou-se em uma academia a fim de se entregar de coração ao que chama o "Projeto De Toni" de emagrecimento e fortalecimento muscular. Quer ter o porte do gladiador Gânico, escravo celta que se tornou um dos líderes da Terceira Guerra Servil na Roma Antiga, entre os anos 73 e 71 a.C.

Gladiador Gannicius, físico a ser alcançado no treino de musculação  - Reprodução  - Reprodução
Gladiador Gânico
Imagem: Reprodução

Enquanto o ano de 2020 é apontado em todo o planeta como o mais desastroso da história recente, Kogos não para de agradecer à Nossa Senhora. É devoto de alguns títulos. "Nossa Senhora das Dores me comove bastante e consegue evitar muitas vezes que eu peque; Nossa Senhora de Schoenstatt me lembra que a verdadeira devoção a Maria Santíssima é cristocêntrica."

Seu discurso enciclopédico, copioso, obcecado, se apoia no tripé religião, Idade Média e recato nos costumes. Para ele, fazer sexo antes do casamento é "um pecado grave".

Com um meio-sorriso, ele conta que alimenta uma paixão platônica pela deputada federal conservadora Caroline de Toni (PSL-SC). Diz que não perdeu as esperanças de conquistar a parlamentar, a quem dedicou um poema publicado em seu perfil no Instagram.

"Ó, borbotoante cabralina terra / De quem Vaz de Caminha bem declamou / Eulógio egrégio que porém não encerra / O esplendor com o qual Deus te agraciou" e "Pois com a Santa Missa fostes debutante / Guarda o véu de Aparecida o povo teu / Foi por isso, pela graça incessante / Que a guerreira Caroline aqui nasceu" são alguns deles.

A assessoria da deputada De Toni ficou de consultá-la a respeito de seu admirador, mas até o fechamento deste texto, não deu resposta.

O anarcocapitalista Paulo Kogos e Carol de Toni - Arquivo pessoal - Arquivo pessoal
O anarcocapitalista Paulo Kogos e Carol de Toni
Imagem: Arquivo pessoal

À direita da direita

Kogos afirma que seu canal recebeu, durante a quarentena, um acréscimo de 10 mil seguidores. Ao que parece, ele descobriu que mais vale otimizar um comportamento supostamente inusual do que escondê-lo.

Ele ficou famoso por protagonizar, em 13 de abril, o enterro simbólico do governador de São Paulo, João Doria Jr., durante uma manifestação contra as medidas de isolamento social impostas na pandemia.

"Espero que ele seja preso e apodreça na cadeia", reafirma Kogos ao TAB. Ele considera o coronavírus uma "criação biológica" ligada a interesses geopolíticos, manifesta-se contrário à quarentena e chama a máscara de proteção contra o vírus de "focinheira".

O Sars-Cov-2 não é uma criação e não há evidências de que tenha sido fabricado em laboratório.

Nem os eleitores de João Doria, nem os de Donald Trump, Celso Russomanno, Joice, Covas ou Jair Bolsonaro, todos alvos de seus ataques, podem contar com o conservadorismo de direita que ele prega.

O anarcocapitalista Paulo Kogos e o 'ucranizador' que trouxe a bandeira da extrema-direita para as manifestações - Arquivo pessoal - Arquivo pessoal
O anarcocapitalista Paulo Kogos e o 'ucranizador' que trouxe a bandeira da extrema-direita para as manifestações contra o isolamento social em São Paulo
Imagem: Arquivo pessoal

Seu conceito de direita estaria à direita do que se considera direita. Por WhatsApp, ele envia uma foto sua com o instrutor de segurança brasileiro Alex Silva, que vive na Ucrânia e trouxe a bandeira do Pravy Sektor, organização paramilitar considerada neofascista, para as manifestações de São Paulo. "Somos os verdadeiros antifascistas, pois o fascismo e o nazismo são de esquerda."

Fascismo e nazismo são ideologias de extrema-direita, paramilitares e ultranacionalistas.

Paulo Kogos exige boa vontade do ouvinte que tenta enxergar alguma coerência em sua oratória.

"Trump é intervencionista, protecionista, defende uma barreira comercial e arrochou a guerra contra as drogas. Sou a favor de liberá-las, porque prezo a liberdade individual", afirma, de forma contraditória. Mas gostou da indicação de Trump para a Suprema Corte, Amy Barrett, "uma católica fervorosa". "Sou islamofóbico? Sou. Por outro lado, Joe Biden é um demônio. A manifestação do mal."

Em relação à eleição municipal de São Paulo, cidade em que vive, mas não vota (por se definir como anarcocapitalista), diz que não sabe dizer quem é o pior candidato. "Apesar de tudo, eu diria categoricamente que o mais nefando é o Bruno Covas, lacaio do Doria. A vitória dele implica um acúmulo de poder muito grande do partido mais nocivo para São Paulo, que é o PSDB. Aqui, é pior que o PT."

O anarcocapitalista Paulo Kogos no 'enterro simbólico' de João Doria - Reprodução - Reprodução
O anarcocapitalista Paulo Kogos no 'enterro simbólico' de João Doria
Imagem: Reprodução

Vacina x propriedade privada

Cético em relação à polêmica CoronaVac, que cristalizou a cizânia entre Doria e o presidente Jair Bolsonaro, Kogos alega que a criação de uma vacina leva 14, 15 anos. Ele afirma que, por princípio, é contra a obrigatoriedade da vacina, "independentemente de ela funcionar ou não, e mesmo antes de se discutir a existência desse coronavírus". Em sua argumentação, Paulo Kogos evoca mais uma vez o anarcocapitalismo.

"Se o Estado decide o que injetar na gente, acabou toda a esperança de propriedade privada e liberdade individual. O lema das feministas, 'meu corpo, minhas regras', está correto nesse caso. O problema é que elas usam isso para matar bebezinhos, que não fazem parte dos corpos delas."

A maior parte das vacinas em desenvolvimento seguem todos os protocolos de segurança e as tradicionais fases de testes clínicos. A comunidade científica internacional busca obter resultados em tempo recorde, respeitando essas etapas.

Admiração mútua

O ataque a Doria teria levado a mãe de Kogos, a dermatologista Ligia Kogos, a enfrentar uma situação delicada com o governador. Considerada a "botoqueira oficial" da alta sociedade, Ligia teve o governador de São Paulo entre seus clientes e amigos. Paulo Kogos diz que a mãe pode até ter se mostrado intimidada, mas nega um constrangimento real.

"Ela sempre esteve do meu lado. Temos uma relação de admiração mútua", diz o economista, que estudou no prestigiado Insper (Instituto de Ensino e Pesquisa) e trabalha no escritório que comercializa a linha de produtos de Ligia, situado em um casarão no nobre Jardim Paulista, zona oeste da capital.

2018, Mendoza, Argentina: com os pais, Waldemar e Ligia, ambos médicos - Arquivo Pessoal - Arquivo Pessoal
Paulo Kogos com os pais, Waldemar e Ligia, em Mendoza, Argentina, em 2018
Imagem: Arquivo Pessoal

Paulinho é show

À reportagem, a dermatologista diz que a admiração é recíproca. Conversam muito, durante horas. "Paulinho é divertido, culto, conta casos como poucos, faz as vozes e os trejeitos dos personagens, é como assistir a uma peça de teatro ou a um show", afirma.

Paciente, ela própria, de elaborados procedimentos estéticos no rosto, Ligia faz ressalvas ao descaso com que filho se veste. "Aqueles abomináveis crocs, os cabelos despenteados, a barba por fazer são o pesadelo de qualquer mãe. Paulinho chegou a ser confundido com um pedinte, em um hotel de luxo em que estávamos hospedados em Punta del Este."

Máscara furada

No dia da entrevista, Kogos estava com uma calça jeans e uma camiseta polo Under Armour. Conta que é sua marca favorita. Pergunto se ele ganha alguma coisa para dizer isso. Ele responde, com um ar etéreo, como quem nunca aventou essa possibilidade, que não. Nos pés, tinha um par de tênis despretensioso. Usava uma máscara "furada", feita em tricô por uma militante antivacina, apenas para mostrar como ele circula em lugares onde é obrigado a usar a proteção.

A resistência em revelar a idade parece tradição de família. Paulo Kogos diz que não faz ideia de quantos anos tem sua mãe. Ninguém faz. "Minha avó jamais revelava a idade. Nem morta. Tivemos de providenciar uma lápide apenas com a data em que ela morreu."

Outro lado

Por meio de sua assessoria, o governador João Doria declarou: "em consideração aos pais de Paulo Kogos, Waldemar e Ligia, e também pelo fato de o mesmo ter pedido desculpas públicas em vídeo e áudio já amplamente divulgados, deixamos de registrar queixa-crime contra ele. E consideramos o fato encerrado."

Ao que tudo indica, Paulo Kogos vai ter de renovar seu pedido de desculpas.