Uma noite no Jardim Botânico: como é observar animais noturnos no breu
Anoitecia no Instituto de Pesquisa Jardim Botânico, no Rio, e os visitantes eram sinalizados para a saída. Às 17h30, de sexta-feira (18), um casal tentou entrar, mas foi barrado pelo segurança: "Já fechamos". Uma hora depois, o parque voltou a receber o público, que previamente comprou ingressos por R$ 50 para um passeio noturno à pé. Ao menos 20 pessoas circulariam entre árvores, plantas e flores, nas ruas de areia, em busca de animais noturnos.
Enquanto aguardavam, pouco antes das 19h, o passeio pareceu começar — mesmo que improvisado por um morador. Um cachorro-do-mato jovem apareceu no Centro de Visitantes. Ao perceber que muita gente o via, correu. Depois da surpresa, a expectativa para a expedição só aumentou.
O roteiro é programado uma hora antes do passeio por uma equipe supervisionada pela bióloga Marina Bordin, 36. Além disso, durante a semana, o grupo avalia o comportamento e onde vive cada animal e espécie. Neste dia, a visitação seria voltada prioritariamente à fauna. Ou seja, o objetivo foi encontrar animais noturnos moradores das regiões da Mata Atlântica e Amazônica. Dentre eles, sapos, gambás, cachorros-do-mato, guaxinins e corujas.
A bióloga repetiu diversas vezes, antes de sair, que era fundamental o uso mínimo possível da luz artificial para que a experiência noturna fosse ainda melhor.
Sapo cururu na beira do lago
Já no início da caminhada, a ausência de luz prejudicou os apaixonados por registros fotográficos. Os desacostumados ao breu esbarravam uns nos outros e corriam o risco de cair. Não demorou muito, no entanto, para que os olhos se acostumassem a ver no escuro.
Um pisca pisca no meio do mato encantou um visitante: "Nossa, que incrível". E uma voluntária explicou: "São vagalumes".
A percepção auditiva também ficou aguçada. Numa escada no mato, próximo ao cactário, o barulho de sapos era ensurdecedor. A primeira parada foi ali. Flores de ninfeia brancas e rosas, que florescem por completo de noite, embelezam o lago. O canto dos anfíbios tornava o lugar semelhante a um cenário de desenho animado.
Os anfíbios sem rabo (como são denominados sapos, rãs e pererecas) vistos no passeio são de diversas espécies. Verdes e marrons. Grandes ou minúsculos — a ponto de correrem o risco de serem esmagados. O mais visto é o cururu, a Boana faber (rã martelo) e a Boana albomarginata (verdinha).
Mais adiante, em meia hora de passeio, no "parquinho" (área do café com espaço de brinquedos para as crianças), a vocalização dos anfíbios aumenta. Desta vez, uma Boana albomarginata é capturada por um estudante, que entrega-a à supervisora. Ela dá uma aula sobre o comportamento e hábitos de sobrevivência do bicho, que parece gelatinoso.
De acordo com Marina, a introdução de anfíbios na área ocorre dentro das bromélias, "quando ela é transportada de um lugar ao outro". Sua variedade vai depender da flora local. Uns vão se sobressair em relação aos outros.
A bióloga, neste momento, puxa a perna do anfíbio para explicar suas habilidades de fuga quando caçado. O sapo, agoniado, grita e tenta pular. A luta só acaba quando a pesquisadora, com cuidado, o solta no lago.
A 'caça' ao cachorro-do-mato
Um pouco antes de chegar à região do parquinho, em uma rua de terra, o olfato dos visitantes é aguçado por um cheiro forte e doce. É a dama da noite escondida entre as árvores. Como o próprio nome indica, o perfume é exalado pela flor apenas ao anoitecer, e some durante o dia.
Ainda neste local, com a permissão de Marina, os visitantes acendem suas lanternas do celular com o objetivo de procurar rastros de pequenos animais. Três pegadas do Mão Pelada — também conhecido como primo do Pati — chama a atenção. Metros depois, um gambá pequeno é visto jantando um sapo. Pouca gente vê, pois ele foge assim que uma lanterna é apontada em sua direção.
"Olhem para cima". A continuidade do passeio se deu com a iluminação da lua. Do orquidário até o Chafariz, a lua substituiu a luz superficial das lanternas. "Aproveitem a oportunidade para apreciar as estrelas em seu brilho natural".
Depois do prédio da administração, a equipe de voluntários fica em alerta. É território de um dos cachorros-do-mato. Entre o bromeliário e o orquidário, um vulto é avistado. A emoção dos graduandos era grande. A bióloga justificou a empolgação: "Antes da pandemia, eles eram vistos apenas pelas câmeras de segurança".
A teoria dos pesquisadores é de que, no período em que a visitação noturna foi suspensa, a espécie possivelmente se sentiu segura para circular e houve uma variação de comportamento. Sua alimentação é onívora, ou seja, come pequenos frutos e animais como o tatu.
Além dos peludos vistos antes e durante o passeio, um outro seguiu o grupo pelo mato, mas não deu o ar da graça para agradar os que queriam fotografá-lo à luz do luar.
Acredita-se que quatro deles vivam no parque — um casal com um filhote na região Amazônica, próximo ao jardim japonês, e outro na região do orquidário, Mata Atlântica. "Como foram vistos em lugares distintos, a gente tem quase certeza de que são animais diferentes. Cada um no seu habitat".
O canto da coruja
Próximo do fim, a última parada do circuito acontece na rua das Palmeiras Imperiais, um passeio de terra largo, ladeado por palmeiras gigantes como muros. A guia liga uma caixa de som pequena com a reprodução do barulho da coruja Murucututu. O objetivo é chamá-la para perto do grupo e avistá-la.
E não é que a coruja realmente apareceu? Sobrevoando as copas das palmeiras de um lado ao outro, um vulto marrom amarelado surgiu. Territorialista, é a única moradora de sua espécie. Além dela, a Mocho é outro tipo de coruja na região, mas que bate as asas apenas fora do parque, na Mata Atlântica vizinha.
Em uma área de 54 hectares, os animais vivem livres. Diante disso, a pesquisa com os animais é realizada apenas a partir da observação de seu comportamento e hábitos alimentares para levantamento e preservação. "Eles vivem aqui como em qualquer outro espaço aberto e de florestas", finaliza Marina.
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