'Fiquei arrasada': mãe de autista excluído da formatura pede retratação
Em casa, num apartamento localizado na região de Águas Claras (DF), Robertinho, como é chamado pela família, recepciona a reportagem com um largo sorriso. Acompanhado da mãe, o adolescente de 15 anos avisa: "Cuidado com o Luke. Eu não posso deixá-lo sozinho, ele está doente." Ele aponta para o seu cãozinho, um Lulu da Pomerânia — seu melhor amigo, diz.
Diagnosticado com autismo, o garoto está ainda mais apegado ao pet depois de ter sido excluído da própria festa de formatura no 9º ano no Sigma Águas Claras, uma instituição privada. O estudante soube do evento que aconteceu no último sábado (26) pelas redes sociais, ao ver os colegas de turma compartilhando as fotos.
Roberto Silva Naziozeno Filho nasceu em Crixás, interior de Goiás. A mãe, Ana Luiza Cabral Naziozeno, estava grávida de sete meses quando deu à luz seu segundo filho. Por causa do parto prematuro, o garoto nasceu com uma lesão que atingiu 70% do cérebro. Aos 5 anos, veio outro diagnóstico: Robertinho também tinha autismo. Os sinais que surgiram na primeira infância batiam com o resultado: repetição de palavras, hiperatividade, obsessão em brincar com os mesmos bonecos.
Desde o diagnóstico de Robertinho, a família se preocupou com a inclusão do garoto. A primeira dificuldade sofrida foi quando os pais decidiram procurar uma escola para ele. "A diretora disse que se meu filho fosse matriculado em uma turma de 20 alunos, 10 pediriam para sair. Aí começa a nossa luta. A gente se cala, engole o preconceito", desabafa Ana Luiza.
Escola de alto padrão
Depois de muita procura, a família encontrou um bom colégio em Goiânia. No ano passado, porém, a família se mudou para Brasília e aceitou então a indicação da diretora: o Sigma Águas Claras. A escola, considerada de alto padrão no DF, tem mensalidades de até R$ 3.000. Durante todo o ano de 2021, o garoto estudou em casa, devido a pandemia da covid-19 — ainda mais pelo fato de que, além do autismo, ele sofre de alergias e problemas respiratórios.
"No outro colégio ele era super acolhido por todos, desde a direção até os professores e alunos. Por isso, optamos por matriculá-lo no Sigma, que fazia parte da mesma rede. Durante todo o ano passado, enquanto estudou em casa, ele foi acompanhado por uma neuropsicopedagoga que vinha todos os dias. Ele ficou encantado com tudo e estava muito feliz", conta a mãe do garoto.
Os problemas começaram depois que a escola voltou ao presencial. A mãe conta que o filho sofreu bullying de alguns colegas de classe, que chegaram a prendê-lo no banheiro. Robertinho também era excluído constantemente no grupo de WhatsApp da turma. Ana Luiza tentou intervir, sem sucesso.
"Meu filho é apaixonado pelo desenho Ladybug, aquela heroína que se veste de joaninha. Por isso, sempre mandava figurinhas dela no grupo. É como se ele tivesse presenteando os colegas, sabe? Mas o chamavam de chato e o excluíam. Até que um dia, eu peguei o telefone celular e enviei uma mensagem para os colegas, explicando as dificuldades e os convidando para um lanche aqui. Ninguém apareceu, e as mães também nunca me acolheram", lembra ela.
Descuido ou exclusão?
Comemorar a formatura era um sonho declarado pelo menino, conta a mãe. A comunicação com a escola era feita por e-mail, agenda escolar, reuniões feitas esporadicamente e por um aplicativo do colégio — ao qual Ana Luiza não tinha acesso e diz ter avisado a direção do fato.
"Eu recebia todos os e-mails da escola. Sobre feiras, projetos. Nunca recebi nada sobre formatura. O assunto nunca foi tocado em reuniões, por exemplo. Fora que eles tinham meu celular. Quando soubemos da formatura, questionei várias vezes a direção, sem sucesso. Até que decidi fazer uma postagem nas redes sociais relatando o ocorrido", lembra.
A postagem teve mais de 120 mil visualizações e Ana recebeu mensagens do país inteiro. Uma delas foi da direção do colégio, que rebateu, afirmando que a festa havia sido informada no aplicativo da escola e para o próprio menino.
"O Robertinho tem autismo e vários problemas de saúde, como assim informaram pra ele? Isso tinha que ter sido acordado comigo. Fora que é um evento pago, eles não perceberam que a gente não tinha entrado em contato? A direção me perguntou depois do ocorrido, o que eu queria que eles fizessem. Eu disse: uma retratação nas redes sociais. Mas não fizeram, sequer me pediram desculpas. Apenas disseram que foi uma falha de comunicação."
Crises de ansiedade e febre
Depois do ocorrido, Robertinho teve crises de ansiedade, choro constante e febre. Um dos colegas de classe ainda o chamou de "burro" por não ter avisado a mãe sobre a festa. As idas ao psicólogo, antes feitas uma vez por semana, se intensificaram. Agora, pelo menos três consultas semanais acontecem.
"Estamos tendo dias difíceis. Fiquei completamente arrasada e Deus sabe como chorei, até mesmo me culpando. Mas não sou uma mãe negligente, sempre busquei a escola. Eles sabiam como me encontrar, já que eu sempre mandava mensagens. O que houve foi negligência, maldade, exclusão", emociona-se Ana Luiza.
Enquanto a mãe conversa com a reportagem, Robertinho olha atentamente para um boneco de porcelana com uma beca de formatura, segurando um diploma. Foi um presente dado por mães que organizaram a formatura dos alunos do 5º ano do Colégio Marista Taquatinga. O adolescente também foi até a festa e participou, como se fosse um dos formandos, na última sexta (3).
Robertinho contou que foi um dia especial, de muita brincadeira, alegria e principalmente uma ocasião para fazer novos amigos. Para a mãe, um momento de reestabelecimento da autoestima do filho.
Em busca de retratação
Ana Luiza afirma que não pretende entrar na Justiça contra o Sigma, nem receber qualquer indenização. Mas procurou o Ministério Público com o objetivo de fazer com que a escola reconheça o erro e mude a forma de comunicação da escola.
"Queremos que a escola tire a inclusão do papel, da teoria, e faça jus ao significado de uma palavra tão importante. Não quero que outros pais e alunos sofram o mesmo que nós. Também desejamos que haja uma reciclagem na escola, em que todos aprendam sobre as diferenças e o que o bullying pode causar numa pessoa, ainda mais em um adolescente especial", diz.
Procurada pela reportagem do TAB, o Sigma Águas Claras disse que o evento era "optativo" e "por adesão" e que, ao longo de todo o ano, alunos e responsáveis receberam quatro comunicados com as devidas orientações pelo canal oficial da escola, o aplicativo.
A escola garante que todo o atendimento e acolhimento à família de Robertinho estão sendo providenciados pela direção e pelas coordenadoras educacionais.
"Com intuito de reafirmar o compromisso com uma educação pautada no respeito mútuo e nos ideais de justiça, agendas presenciais têm sido marcadas com a mãe na busca do acolhimento de toda a família. Reforçamos a nossa responsabilidade com o respeito, a empatia e a inclusão e seguimos abertos ao diálogo. Em 39 anos, o Sigma prima por uma educação de excelência que vai muito além do conteúdo acadêmico e imprime um olhar cuidadoso e inclusivo para o acolhimento e o desenvolvimento socioemocional dos nossos estudantes. Acolher a diferença é um valor inegociável para a nossa escola desde antes da obrigatoriedade legal, assim como o respeito a cada um dos nossos estudantes e suas famílias, sem nenhuma distinção", afirma a nota.
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