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Centenário da cinofilia: evento reúne 4 mil cachorros e seus fãs em SP

World Dog Show, evento internacional de criadores de cães, ocorre pela terceira vez no Brasil - André Porto/UOL
World Dog Show, evento internacional de criadores de cães, ocorre pela terceira vez no Brasil
Imagem: André Porto/UOL

Do TAB, em São Paulo

10/12/2022 04h01

Num quadrilátero de chão azul, uma espécie de arena cercada de gente curiosa, Walter Coutinho, 61, avaliava cerca de 15 jovens rottweilers, pontuando a qualidade de cada um deles. "Já passei o olho rapidamente e vi dois aqui que são excelentes", sussurrava o juiz, para que os competidores não o ouvissem.

Os bichos de jeito turrão, perfilados lado a lado, esperavam para desfilar um trajeto circular em torno de Coutinho. Guiados por homens elegantemente vestidos, eles marchavam diante dos olhos atentos do jurado. "Têm que ter a cabeça triangular, o peito forte, que vai até embaixo", explicava, enumerando as características que leva em conta na classificação.

A origem dos rottweilers remonta à antiguidade clássica, quando as legiões romanas utilizavam esses animais para a guarda e o cuidado com os seus rebanhos. Esses bichos, entretanto, atravessaram os Alpes e, na cidade de Rottweil, na Alemanha, após diversos cruzamentos e miscigenações, foram adotados por açougueiros, para fins mais triviais de exibição e companhia. Mas essas espécies jamais perderam as características originais que valeram seu reconhecimento oficial, em 1910, como uma raça ideal para o trabalho policial.

Um rottweiler é, por essência, robusto, ágil e resistente. E era isso que Coutinho procurava nos concorrentes. Da seleção, quatro ficaram para disputar a final. Destes, apenas um seria chamado de "excelente" e, no final da feira, concorre com outras espécies de seu porte. "Aqui ninguém vende cachorro; escolhe o melhor", dizia um rapaz que acompanhava o evento na quinta-feira (8), num dos pavilhões da Expo Center Norte, em São Paulo.

Aquela competição de rottweilers é apenas uma das várias disputas que ocorrem durante o World Dog Show, um encontro mundial de criadores de cachorros, pela terceira vez realizado no Brasil.

Evento inclui competição entre espécies, como a de rotweiller - André Porto/UOL - André Porto/UOL
Evento inclui competição entre raças de cães, como rotweillers
Imagem: André Porto/UOL

'Patrimônio histórico'

Faz cem anos que criadores se reuniram pela primeira vez, no Brasil, para, entre outras coisas, comparar o pedigree de cada bicho e escolher quem dentre eles é o mais perfeito representante de cada espécie. Um evento assim, explicam os participantes, serve para a manutenção genética das espécies e do "patrimônio histórico" em torno da criação dos bichos.

"Daquela primeira vez, era uma exposição pequena, com 40 cães. Hoje estamos fazendo esta aqui, cem vezes maior", contava Fábio Amorim, 48, presidente da CBKC (Confederação Brasileira de Cinofilia), responsável por organizar esta edição do World Dog Show. O centenário da cinofilia no Brasil é justamente o tema do evento.

O encontro ocupou até domingo (11) dois pavilhões de centro de exposição, com mais de 4.000 animais vindos de 50 países — entre eles, raças raríssimas e outras novas, como o pastor da Mantiqueira, recém-reconhecido pela confederação brasileira. Décima espécie 100% nacional, ele é chamado também de Policialzinho.

Os bichos desfilam nos ringues azuis e também participam de atividades ligadas a beleza, esportes caninos e adestramento. Há também estandes com produtos de alimentação e acessórios. Como todos os animais são adestrados, eles ficam comportados e não se ouve nenhum latido.

Mais de 4 mil cães participam do evento; na foto, cachorro da raça spitz alemão - André Porto/UOL - André Porto/UOL
Mais de 4 mil cães participam do evento; na foto, cachorro da raça spitz alemão
Imagem: André Porto/UOL

Camarim

A veterinária România Ramalho caminhava apressada na entrada no segundo pavilhão ocupado pelo evento. Ela é diretora de bem-estar do World Dog Show e cumpre uma tarefa indispensável ali: observar se todos os animais estão sendo bem tratados e cuidados.

Apesar da mega estrutura no espaço principal da feira, onde acontecem as atividades do encontro, é naquele segundo ambiente que as atenções são sempre redobradas. O espaço climatizado, limpo e vigiado é um "hotel" provisório para os cachorros. O galpão serve de camarim e descanso para os bichos e seus cuidadores.

Há ainda espaço para banho e uma equipe de veterinários de plantão para atender os bichos, em caso de alguma necessidade.

Peludos e boiadeiros

Thais Rodrigues e seus cachorros da raça australian catlle dog - André Porto/UOL - André Porto/UOL
Thais Rodrigues e seus cachorros da raça australian catlle dog
Imagem: André Porto/UOL

Embora seja um espaço de competição, o World Dog Show reúne um grupo de apaixonados por cachorros.

Foi a paixão à primeira vista, por exemplo, que fez Thais Rodrigues, 35, de Brasília, desistir de cavalos e se dedicar à criação de "australian cattle dog", os boiadeiros australianos, uma espécie de pelo belíssimo, liso, assentado e duro, resistentes à chuva, que tem em sua genética o cruzamento com dálmatas.

"Eu era criança, competia com cavalos, e vi um cachorro desses no rodeio", lembrava ela, enquanto segurava pela coleira três deles, que tinham acabado de participar de uma competição. "Passei anos à procura, até que comprei um." Há 15 anos, ela é criadora dessa espécie e mantém um canil.

A pediatra Fernanda Romagnoli, 37, não tem cachorro em casa ("ainda"), mas foi também o amor por animais que a atraiu ao evento: a filha, Lara, de 7 anos, ama bichos e pediu para ir à exposição. "Ela adora cachorro, mas ainda estamos organizando o momento de ter um em casa", explicava. As duas assistiam ao concurso de melhor corte de pelos, com dez tosadores disputando. Enquanto achava engraçado a forma que os profissionais manuseiam os "cabelos" dos animais, Lara já tinha escolhido o que queria: "Um desses, bem peludos."