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Peritos correm contra o tempo para identificar as vítimas em São Sebastião

À esq., Maurício Freire, delegado da Polícia Civil, e o diretor do centro de perícias do IML Enrico Andrade, na tenda montada para identificação dos corpos, em São Sebastião (SP) - Keiny Andrade/UOL
À esq., Maurício Freire, delegado da Polícia Civil, e o diretor do centro de perícias do IML Enrico Andrade, na tenda montada para identificação dos corpos, em São Sebastião (SP)
Imagem: Keiny Andrade/UOL

Cláudia Castelo Branco

Colaboração para o TAB, de São Sebastião (SP)

23/02/2023 10h31

Chovia em Caraguatatuba (SP) na tarde de segunda-feira (20) quando o delegado Maurício Freire, 56, reapareceu à frente de uma estrutura armada com lonas brancas e cercada por policiais.

No interior da estrutura, um carro do IML e uma cortina que separa a equipe chefiada pelo delegado: 12 papiloscopistas do IIRGD (Instituto de Identificação Ricardo Gumbleton Daunt), além de investigadores concentrados em descobrir, o mais rápido possível, a identidade de quem perdeu a vida há quatro dias. De longe, o visual da tenda passaria por um posto de vacinação, mas o clima é de morte e o silêncio só é cortado por sirenes e trovões.

A equipe faz inúmeras vezes o caminho entre o IML de Caraguatatuba e o SVO (Serviço de Verificação de Óbito) de Ubatuba. "Se eu sentar eu vou dormir, porque eu tô direto. Prefiro ficar de pé", disse Maurício ao TAB, nesta quarta (22).

A estrutura montada faz parte do Protocolo de Atendimento de Acidente de Massa — quando múltiplas vítimas precisam de atendimento em situações de desastres. No domingo, Freire foi designado a colocar em prática uma delas. Estava em São Paulo e desceu para o litoral para fazer o atendimento.

Quem mora por ali foi orientado a não filmar e fotografar os movimentos constantes de carros do IML e da Polícia Civil que entram e saem, a cada 30 minutos. A lona da estrutura é coberta 100% para não chamar a atenção. O cheiro, apesar de controlado, é forte.

Segundo o médico-legista Enrico Andrade, 55, diretor do centro de perícias do IML, os corpos já chegaram em estágio de decomposição. Quanto mais destroços, mais complicado identificar.

Tenda da Polícia Civil de SP para identificação das vítimas dos desabamentos na cidade de São Sebastião (SP) - Keiny Andrade/UOL - Keiny Andrade/UOL
Tenda da Polícia Civil de SP para identificação das vítimas
Imagem: Keiny Andrade/UOL

O processo de identificação

A estrutura foi montada no domingo à tarde, e recebia os corpos encontrados pelo helicóptero da Marinha que já passaram pelo IML. "Fazemos a necropsia aqui em Caraguatatuba. Depois, eles são levados por carros funerários para a funerária de São Sebastião. Os corpos identificados são então entregues para as famílias lá", explica Enrico. Esse é o trâmite, e não é simples. Por ser uma situação de calamidade, esse processo operacional inicialmente era feito na Santa Casa de São Sebastião.

"A impressão digital vai sumindo, conforme o tempo passa. Aí é que entra nosso pessoal especializado em fazer a chamada 'luva cadavérica'; eles conseguem recompor o tecido e fazer a impressão digital. Qualquer um dos fragmentos de um dos dedos pode determinar a identificação. Se houver determinado número de pontos, já identifica."

Fachada da Funerária Campo Vale, onde familiares estão identificando os mortos nos desabamentos em São Sebastião (SP) - Keiny Andrade/UOL - Keiny Andrade/UOL
Fachada da Funerária Campo Vale, onde familiares fazem a identificação dos corpos
Imagem: Keiny Andrade/UOL

Segundo boletim da Defesa Civil, até a noite de quinta-feira (22) 38 corpos já tinham sido identificados e liberados para o sepultamento. São 13 homens adultos, 12 mulheres adultas e 13 crianças -- cinco do estado de São Paulo. O desastre contabiliza, até agora, 49 mortes. "É outra dificuldade que a gente tem. Num acidente aéreo no qual se tem a identificação de quem embarcou, compara-se um a um. Agora estamos comparando uma digital para 60 milhões. Multiplica por 10: são 600 milhões de impressões digitais", diz Enrico.

Os dados digitais coletados são enviados para o suposto estado de origem e lá uma outra equipe cruza os dados. "Por exemplo: você é minha vizinha, sei que você é do Piauí e que foi para o litoral de SP", explica o delegado, com 45 anos de experiência. "Se lá não bateu, vamos mandando para outras cidades." Todas as vítimas, até agora, foram identificadas por meio das digitais.