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Como o OnlyFans e as redes estão mudando a forma como encaramos os fetiches

Unsplash/Lina Kraftsoff
Imagem: Unsplash/Lina Kraftsoff

Do TAB

30/05/2021 04h01

Talvez as listas de melhores amigos no seu Instagram sejam só para isso, mesmo — compartilhar conteúdo com pessoas mais próximas. Mas já tem gente usando essa função para distribuir conteúdo exclusivo e até pago.

Como era de se esperar, circulam por essas listas fechadas imagens sensuais, cujo acesso fica restrito a quem é convidado a vê-las. As formas de distribuir ou vender a intimidade vêm mudando: entre o pornográfico e o sugestivo, os tradicionais vídeos e os novos fetiches contemplados, redes sociais e sites como OnlyFans estão recheados de conteúdo para todos os desejos.

"Dentro de uma sociedade que quer controlar todas as suas vontades e fetiches, quando a gente tem a possibilidade de entrar em contato com a intimidade dos outros, eu posso te dizer que você pode; pode tudo, desde que pague", diz o antropólogo Michel Alcoforado no episódio de CAOScast veiculado esta semana em TAB. "A intimidade é uma das coisas de que a gente mais sentiu falta na pandemia, desde que o coronavírus transformou as nossas vidas. O isolamento social fez muita gente migrar para o digital, descobrir novas formas de se divertir, inclusive sexualmente. E isso fez com que um número grande de pessoas estivesse disposta a vender aquilo que elas resguardavam para os escolhidos" (ouça a partir de 0:50).

Os espaços são exclusivos, mas acessíveis a qualquer um com conexão à internet e dinheiro para pagar pelo conteúdo. Isso abre um leque muito mais amplo de demanda e consequentemente de produção. Quem achava que estava sozinho em seu fetiche diferentão percebeu que não é bem assim.

"O fetiche em si ainda é um tabu muito grande na nossa sociedade, ainda tem muito preconceito, muito constrangimento atrelado. Parece que esse movimento está trazendo uma virada de jogo, e eu particularmente acho que é um movimento muito saudável para reconectar a gente com o erotismo", opina o pesquisador Tiago Faria. "A indústria pornográfica fez um desserviço monumental à sexualidade das pessoas (...). O OnlyFans nada mais é do que um espaço livre de julgamento para quem faz e para quem consome. Se você tem fetiche por pés, por sovaco, o que seja, vai ter alguém nessa plataforma disposta a te fornecer isso" (a partir de 13:10).

A camgirl e ex-BBB Clara Aguilar participa do episódio e conta que percebe essa liberdade. "Tem muita gente que tem vergonha de realizar fetiches e aproveita que atrás das câmeras pode realizar no anonimato. Até casais, por exemplo, que querem fazer um ménage, que querem experimentar uma terceira pessoa, às vezes não sabem se querem fazer isso real e experimentam na webcam", conta ela (a partir de 23:25).

E para quem acha que discutir desejo e prazer não é lá uma atividade muito intelectual, a pesquisadora Rebeca de Moraes lembra que esses conceitos são importantíssimos na psicanálise. "Lacan fala que o nosso desejo é o desejo do outro, que o desejo do sujeito é o desejo do outro. Se a gente pensa nisso do ponto de vista imaginário, para não ficar falando 'psicanalitiquês' aqui, acho que isso fala um pouco sobre essa ideia de que a gente não tem uma identidade, como se entende no senso comum, escrita em pedra — eu sou x e você y pela vida toda. Ao longo da vida, é necessário que a gente vá se amparando em alguma coisa que está situada fora de si mesmo. Faz sentido quando a gente fala de querer ver essas imagens, ver pessoas fazendo coisas que você nunca fez, você nunca imaginou fazer. É também assim que a gente vai compondo nosso próprio desejo", diz a especialista (a partir de 27:43).

Para continuar fritando as ideias e se aprofundar ainda mais no tema da sexualidade mediada pelas telas em tempos de pandemia, não deixe de ouvir o episódio completo acima.

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