Agroboys e 'tias do zap' se reúnem na 'Casa Bolsonaro', nos Jardins (SP)
Entre mansões e lojas de luxo no Jardim América, um dos bairros nobres da zona oeste de São Paulo, um sobrado se destaca em uma esquina da rua Colômbia. O casarão, com fachada verde e amarela, virou ponto de encontro da direita brasileira, apelidado de "Casa Bolsonaro". O anfitrião do dia é o ex-ministro do Meio Ambiente e atual candidato a deputado federal Ricardo Salles (PL-SP).
Na quarta-feira (7) de céu nublado, frio de 15°C e chuva impiedosa, a casa abrigou o "esquenta" para as comemorações do 7 de Setembro na avenida Paulista — e o TAB aproveitou o convite lançado por Salles para seus seguidores nos stories do Instagram para conhecer o endereço.
Construída na década de 1920, a casa tem na entrada duas esculturas brancas de cachorros com os olhos pintados (um de verde, outro de amarelo). A julgar pelos casarões similares na rua, estima-se que o aluguel ali custaria até R$ 80 mil por mês.
Árvores frondosas, um tanto estranguladas entre emaranhados de tecidos decorativos dando voltas nos seus caules, adornam a calçada disputadíssima por carros de luxo.
Um deles, um jipe de jeitão militar, levava uma enorme caixa de som colorida por luzes de LED — é nele que Salles iria conduzir os convidados até a Paulista.
Muitos convidados vieram do interior de São Paulo. Ao entrar, logo receberam capas de chuva descartáveis. O estafe simpático de Salles distribuiu sorrisos e santinhos, e deixou todos à vontade.
Uma das funcionárias exibia orgulhosa uma meia estampada com o rosto do presidente Jair Bolsonaro (PL). Não estava à venda. "Ganhei de presente do Salles", ela disse, feliz da vida.
Versátil, o item também foi visto nos pés do ex-ministro e de sua companheira, a modelo Gisela Estella Salles, que adotou um visual mais "esporte chique" para o dia.
Petit comité
Do lado de dentro, se a Casa Bolsonaro tem inspiração na vida do presidente, deve ser pela residência em Eldorado Paulista, no interior de São Paulo, onde o presidente morou por sete anos, num estilo mais simples. Lembra pouco o império imobiliário do clã Bolsonaro — que, desde a década de 1990, arrematou 107 imóveis, dos quais pelo menos 51 foram adquiridos total ou parcialmente com dinheiro vivo, segundo revelou o UOL.
Os vizinhos são só elogios ao petit comité, pois, segundo eles, "gera empregos" para panfleteiros de campanha. Não há reclamações referentes a movimentações ou barulho. Curiosamente, o QG frequentado pelo ex-ministro, que deixou o cargo após ser alvo de investigação sobre apoio ao desmatamento ilegal e de operações da Polícia Federal como Akuanduba e Handroanthus, fica no endereço onde um dia funcionou o restaurante "Amazônico". No fim de 2021, o empreendimento foi interditado e lacrado por falta de licenciamento, após diversas autuações da fiscalização da Subprefeitura de Pinheiros.
A maioria dos cômodos da casa está vazia. Diversos quartos foram adaptados como escritórios, com mesas típicas de repartição pública. Uma sala branca foi ocupada por uma mesa apinhada de santinhos e demais materiais de campanha de Salles e de outros candidatos, Capitão Alisson (PL), Delegado Olim (Progressistas), Lucas Bove (PL) e Tomé Abduch (Republicanos).
Na concentração não tinha coquetel para as visitas, mas tinha lanche (suco de caixinha e bolacha) para o pessoal da panfletagem — mas dava para pedir um café para a equipe. Sem fogão à vista, a cozinha tem uma saída em formato de arcos para o quintal, cujo chão de azulejos briga com as plantas que resistem nos poucos pontos não aterrados quebrando as peças com suas raízes.
Orquídeas dão um ar bucólico ao sobrado, presas em uma das paredes, que serviu de cenário para foto com todos os presentes dirigida por Salles e seu fiel escudeiro, Bove, candidato a deputado estadual que estava com o ex-ministro na polêmica roda de conversa na ESPM na noite de 1° de setembro.
Na sequência, as mulheres foram convocadas para uma foto só delas, a pedido de Gisela.
'Tias do zap'
Aos poucos, aterrissou uma legião de chapéu, botas e bonés estampados com os dizeres "agro 22"; na camiseta, bois com a bandeira brasileira. Para eles, o anfitrião foi o "melhor ministro do Meio Ambiente que o Brasil já teve".
Eram os integrantes do trio elétrico do agronegócio, que mais tarde levaria à avenida Paulista um boneco inflável imenso de Bolsonaro num cavalo. Presa por um guindaste e um trator, a peça foi assinada por Sindicato dos Produtores Rurais de Paragominas, no Pará, Grupo Pátria Amada Brasil e Frente "Amazônia Brasileira é Nossa".
Nas rodinhas de conversa, os convidados bolsonaristas demonstravam preocupação com os indicadores de intenção de voto, e já confabulavam "previsões" de apoio para Bolsonaro num eventual segundo turno. "Mesmo que Ciro [Gomes, candidato do PDT] ajude, ele traz pouco voto", um agroboy disse desanimado na conversa, selada pela frase: "Mas também não confio nas pesquisas, tem muita fake news".
Noutra roda, senhoras produzidas e orgulhosamente intituladas de "tias do zap" elogiavam a beleza arquitetônica da Casa Bolsonaro. Um senhor de bota de cowboy e camiseta "agro" interrompeu a conversa para se gabar de criar a "Casa Bolsonaro", que, além da capital, teria unidades no interior paulista (Araçatuba, Andradina, Birigui e Valparaíso), todas vinculadas a Salles. "Já fui em todas, são maravilhosas", comentou uma das senhoras.
Procurada pelo TAB, a assessoria de imprensa de Salles não informou qual é o vínculo oficial do candidato com as "Casas Bolsonaro", quantas unidades há e quem as aluga. "As Casas Bolsonaro são comitês eleitorais de deputados estaduais e federais que apoiam o Presidente Bolsonaro", respondeu, no WhatsApp.
O Hino Nacional engasgou na caixa de som e a chuva não deu trégua, mas era a hora de partir. Quem não estava "a caráter" podia pegar camisetas emprestadas para desfilar na Paulista. Segundo as regras do TSE (Tribunal Superior Eleitoral), não é permitido distribuir o item gratuitamente, daí o empréstimo. É necessário assinar um termo identificando-se como voluntário e voltar para devolver a camiseta ao comitê, um tipo de "after party" nos Jardins.
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