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'Faria tudo de novo': fãs acamparam por 5 meses para show de Justin Bieber

Claudia Andrade (atrás da bandeira "Ghost"), Gabriela Quesado (de óculos, à esq.) e outros fãs que estavam nas barracas B6 e B7 em frente ao Allianz Parque, à espera do show de Justin Bieber em São Paulo - Beatriz Trevisan/UOL
Claudia Andrade (atrás da bandeira 'Ghost'), Gabriela Quesado (de óculos, à esq.) e outros fãs que estavam nas barracas B6 e B7 em frente ao Allianz Parque, à espera do show de Justin Bieber em São Paulo
Imagem: Beatriz Trevisan/UOL

Paola Churchill

Colaboração para o TAB, de São Paulo

09/09/2022 04h01

No Conjunto dos Metalúrgicos, na cidade de Osasco (SP), a diarista Claudia Andrade, 45, preparava a mala para voltar ao acampamento em frente ao Allianz Parque, na zona oeste de São Paulo, na tarde de domingo (4). Desde abril, ela e um grupo de 360 fãs de Justin Bieber, os "beliebers", estavam em uma força-tarefa para conseguir os melhores lugares nos shows marcados para 14 e 15 de setembro na capital paulista.

Por volta das 14h, o celular da diarista, conhecida como Tia Claudia, não parava de tocar. Foi conferir o que estava acontecendo e desatou a chorar: após a performance no Rock in Rio, Bieber, abalado pela síndrome de Ramsay Hunt, suspenderia os shows que faria no Allianz Parque por tempo indeterminado. O anúncio foi feito na terça (6).

Beliebers ficaram tristes por não poder ver o ídolo, mas muitos compreenderam. "Todo mundo do acampamento ficou triste. Aí choramos e choramos para tirar a dor do peito, a gente sabe que é pela saúde dele, que ele não queria decepcionar os fãs", conta Tia Claudia. "Foi uma dor como se eu tivesse perdido alguém."

Na internet, teve de tudo: raiva, tuítes maldosos e memes. E pipocou um comentário comum: "E como será que estão os fãs que estavam acampando na fila desde abril?".

Correr para a grade

O acampamento começou ainda antes de 20 de abril, dia em que os ingressos físicos foram disponibilizados na bilheteria do Memorial da América Latina, na zona oeste de São Paulo. Os ingressos online esgotaram em questão de minutos.

"O perrengue já começou aí", lembra a contadora Gabriela Quesado, 25. Isso porque, nos primeiros dias, eles não tinham barracas e se instalaram na frente do estádio dormindo no chão frio. "A gente não ia arriscar de não conseguir a pista premium", diz Tia Claudia.

Claudia Andrade, que ficou acampada em frente ao Allianz Parque, à espera do show de Justin Bieber em São Paulo - Claudia Andrade/Arquivo pessoal - Claudia Andrade/Arquivo pessoal
'Tia' Claudia era uma das administradoras do acampamento de fãs de Justin Bieber
Imagem: Claudia Andrade/Arquivo pessoal

Os fãs reunidos ali decidiram então unir forças. Após arranjar barracas (nove ao todo, com 25 a 40 beliebers em cada uma), traçaram uma estratégia, dividindo tarefas para ter sempre alguém no acampamento, a fim de garantir a todos do grupo um lugar na grade em frente ao palco. Gabriela e Claudia se conheceram durante a passagem de Bieber na turnê anterior, a Purpose Tour, em 2017, justamente assim: caçando um lugar na grade.

Gabriela se encantou pelo jovem canadense pelo visual e a música "Baby". Claudia descobriu o artista em 2012, através de sua filha, Adrielle, 24. "Em 2013, quando ele veio a primeira vez, eu não tinha dinheiro para comprar os ingressos, mas prometi que, quando ele viesse de novo, eu levaria minha filha, nem que tivesse que me ajoelhar e pedir com todas as minhas forças", conta.

Quatro anos depois, a diarista cumpriu a promessa que fez para Adrielle e lhe deu um ingresso. Ela acompanhava a filha adolescente à época num acampamento para conseguir ver o ídolo de perto. Ali conheceu outros fãs na fila, por quem passou a nutrir muito carinho. Deles, Tia Claudia ganhou um ingresso de presente. "Deus sempre sabe o que faz. Na Purpose Tour, eu estava com depressão profunda, pesava 49 kg. Ouvi-lo ao vivo me deu ânimo, um 'propósito', como diz o nome da turnê. Prometi que iria nos próximos shows dele, nem que fosse de bengala", brinca.

Fãs 'revezantes'

No Allianz, Claudia foi uma das administradoras do acampamento de fãs, que se dividiam em dois grupos: financeiro e "revezantes". Cabia a ela a função de coordenar as barracas B6 e B7. Ia lá cinco dias por semana, menos às segundas e quartas, quando vai trabalhar. "Passava mais tempo na fila do que na minha casa."

Gabriela, braço direito de Tia Claudia, fazia parte do financeiro. A jovem contadora organizava a escala dos integrantes das B6 e B7. Era obrigatório que cada um dos participantes ficassem lá pelo menos cinco horas na semana, para não perder o lugar. "Sabe, muita gente acha que é só pegar uma barraca e ir para lá. Mas não é assim", comenta.

Fãs que estavam acampados em frente ao Allianz Parque, à espera do show de Justin Bieber em São Paulo - Gabriela Quesado/Arquivo pessoal - Gabriela Quesado/Arquivo pessoal
'Muita gente acha que é só pegar uma barraca e ir para lá. Mas não é assim', diz Gabriela
Imagem: Gabriela Quesado/Arquivo pessoal

Os revezadores precisavam somar o número de horas, de abril a setembro — no fim, quem tivesse mais horas no banco tinha direito a um lugar melhor na fila. Os fãs de fora da cidade, ou que não podiam ficar na fila por tempo, trabalho ou estudo, ficavam alocados no financeiro, contribuindo com água, alimentação e dinheiro para sustentar o acampamento.

Às vezes, eles ajudavam a custear Uber, pois as barracas eventualmente eram desmontadas e levadas para a casa de Claudia, por exemplo, nas noites muito frias ou nos dias de jogo — como eram nove barracas apenas, cada um já sabia a ordem onde deveria voltar, sem brigas. No último fim de semana, eles desmontaram o acampamento por causa do frio e, não fosse o cancelamento oficial do show, voltariam na terça.

Investimento de R$ 3 mil

Entre acampamento, ingressos do show no Allianz Parque e no Rock in Rio, passagens e hospedagens no Rio, Gabriela investiu cerca de R$ 3.000. Apesar do show cancelado, garante que fará tudo de novo. "Não me arrependo", destaca.

Assim como muitos fãs acampados, ela aposta que o artista voltará logo ao Brasil. Pelo que viu da performance do cantor no palco do Rock in Rio, diz que sabia que algo não estava bem.

"Justin deu o melhor de si, mas parecia cansado. A gente cantava o mais alto possível para tentar animá-lo. Durante a música 'Lonely', os beliebers combinaram de acender a lanterna. Ele sabia, tanto que esse vídeo foi o que respostou no Instagram", frisa.

"Ele é um ser humano, não é um robô. É fácil ir à internet xingar ou fazer memes, mas todos têm dias ruins. Não é porque é famoso que ele precisa estar bem o tempo todo."

Se na música "Lonely" Justin conta como se sente sozinho no mundo, os fãs dizem fazer de tudo para que ele não se sinta assim. Também tentam acolher uns aos outros: os 360 beliebers que passaram cinco meses acampados no Allianz Parque, sob sol e chuva, vão se reunir nos dias 14 e 15 para prestar uma homenagem ao ídolo.

"Justin nos uniu. A gente encontrou uma turma bacana na fila. Compartilhamos muitos meses juntos e, no Dia das Mães, até recebi flores do pessoal. Chorei muito", lembra Tia Claudia. "Sei que ele vai voltar, e estaremos lá na fila de novo. Tudo que a gente faz é por ele."