Brasil para Maiores - Extra: 'Tiro de .45 não foi fazer pornô, foi o bolsonarismo', diz Frota
Aos 59 anos, Alexandre Frota pode dizer que viveu muitas vidas. Fez dezenas de novelas, dirigiu e produziu programas de TV no SBT e na Record e, nos últimos anos, enveredou pela política, onde foi da direita conservadora ligada a Bolsonaro ao flerte com a esquerda - e ao apoio a Lula. Mas, por onde esse homem grande e corpulento passa, a lembrança da época em que protagonizou filmes pornô é sempre resgatada.
Durante o mandato de deputado federal era comum ele ser parado nos corredores da Câmara por algum político, confidenciando ter assistido a algum filme erótico daquela época.
"Sempre tem isso, até hoje. 'Ah, eu vi teus filmes, hein, não conta pra ninguém'. Tanto de homem, quanto de mulher, às vezes de pessoas que eu nem esperava", diz. "O cara consome, assiste, gosta e o cara te critica. Aí você vai na bio do Instagram ou Twitter dele e está lá: conservador, de família, cristão, ama a Pátria."
Não raro, em bate-bocas com outros políticos, esse detalhe na biografia era usado como arsenal. Foi assim com Eduardo Bolsonaro na CPMI das Fake News, em 2019 - Frota já tinha trocado de lado e atacava o então governo de Jair Bolsonaro. O filho do presidente foi na jugular: "Você era menos promíscuo quando só fazia filme pornô". Frota respondeu com um sorriso irônico: "É, você assistia muito, né? Eu sei que você gosta" (Ouça aqui)
"Eu sempre soube que em algum momento alguém ia falar alguma coisa relacionada a isso em Brasília. Eu andava com uma mala cheia dos DVDs, a coleção completa sem o DVD dentro, só as capas, pensando que, quando alguém falasse alguma coisa, eu ia virar: 'meu irmão, eu sempre soube que você é meu fã, trouxe a coleção pra você'. Mas aquele dia eu esqueci a mala, ia ser 'a' cena", se recorda.
Esse marco na carreira não é lembrado à toa. Frota é protagonista de uma era em que o pornô se tornou assunto nacional, muito pela entrada de celebridades do entretenimento no casting de produtoras de filmes adultos - principalmente a Brasileirinhas.
Essa fase moldou uma geração e a forma como o brasileiro consome pornografia - e o crédito tem que ser dado: tudo isso surgiu da cabeça de Frota em 2004. "Eu sempre gostei muito de sexo, eu estava tentando emplacar programas na televisão e era só 'não, não, não'. No momento em que eu estava sem nada pra fazer, pensei: 'vou fazer sexo, que eu gosto e faço bem'", diz.
Este é o mote do podcast "Brasil para Maiores", que investiga este período delirante no Brasil. A entrevista com Alexandre Frota é um episódio extra da série.
O papo em vídeo também pode ser assistido na íntegra no topo da página. Abaixo, alguns destaques:
Começo da carreira
Desde que comecei a fazer teatro, meu corpo sempre foi exposto para a plateia. Na peça 'Blue Jeans', eu tomava banho na frente da plateia, totalmente nu. Pra mim sempre foi muito tranquilo. Eu fui, depois do Mário Gomes, o cara que chegou de calça jeans, sem camisa. E aí depois veio Humberto Martins. Veio o [Marcos] Pasquim, Marcello Novaes? É um personagem que funciona, principalmente em novela das sete. O cara meio bad boy, meio sarado, burrão.
A entrada no pornô
Quando tudo aconteceu comigo - toda essa fase que eu fiquei amarradão, eu gostava muito de filmar, fotografar, vivia na noite -, eu não tinha família, morava sozinho, tinha dez namoradas, ia em festa, não tinha que dar satisfação pra ninguém. Eu vivi aquele mundo, gostava muito de fazer filmes, gosto muito de sexo, tinha obsessão por sexo. Hoje, não mais.
Mudança no mercado pornô
Eu exigia bufê, quartos separados, maquiador, uma série de coisas. Virou uma produção. Um filme que eles faziam com dez pessoas, de repente passaram a fazer com 60. Nunca teve profissionalismo [no pornô] até minha chegada, por isso que tem um mercado antes e o mercado depois.
Filme com Bianca Soares, uma mulher trans
Adorei fazer o filme. Metade dos meus amigos de luta, da academia sumiram, muita gente ficou chocada. (...) Sentei com meu filho, quando estava com 11 anos, pra trocar uma ideia. Ele ia acabar uma hora esbarrando na rede social, então tive de ter uma conversa muito séria com ele. Agora me preparo pra ter essa conversa com minha filha, que hoje tem quatro anos de idade (...) No Brasil, quando você faz pornô, isso toma outra proporção. Parece que tudo que fiz lá atrás deixou de existir.
Fase sem freio
Eu estava sem freio, vivendo tudo que você puder imaginar: cocaína, bala, ecstasy. Ainda tomava um Cialis. Fiz tudo junto e fiz mais, porque na hora de dormir eu tomava Dormonid. Você está olhando para um cara que está vivo por um milagre. Estou há quase 12 anos limpo, virei outra pessoa. Aquele Alexandre Frota que existiu era outra coisa. Não conheço mais ninguém que tenha associado cocaína ao sexo e se dado bem. (...) Não tinha amanhã. (...) Vivia em curto-circuito.
Medo de morrer
Depois do que aconteceu com o Chorão, pensei: 'caraca, será que vai ter uma hora que minha mãe vai ligar a televisão e vai ver a notícia que o filho dela foi encontrado morto num hotel de quinta categoria com overdose?'. Pensei várias vezes em me internar, chorava, olhava e todo mundo tava casado, com namorada, uma família. E eu não. Foram escolhas minhas e fui caminhando para esse buraco. (...) Essa coisa do sexo, das drogas, das noites, da sensualidade, eu me envolvi muito e fui muito envolvido por tudo isso. (...) Eu surfei nessa onda, fui prejudicado em muitas coisas, as pessoas por outro lado adoravam. Quando você está numa pegada dessa, você não entende que vai envelhecer.
Sacanagem em Brasília
Não sou nem um pouco político, não gosto de sentar pra jantar com aqueles caras. Não é que eu não sei [histórias sobre sexo], tem a putaria, mas eu não vou (...) A verdadeira putaria está em Brasília. Em Brasília, o couro come em todos os sentidos. Mexe com poder e muito dinheiro, [o sexo] está presente sempre. (...) Peguei um casal de deputados transando na Câmara, abri a porta e o couro estava comendo lá dentro (...) As pessoas me perguntam se era mais difícil Brasília ou a carreira artística. Ambas mexem com traição, sedução, com a puxada de tapete, com poder, com dinheiro.
Tropa de choque bolsonarista
O tiro de 45 não foi fazer pornô, foi o bolsonarismo (...) Tive muitos embates nas redes sociais, fui muito processado e fui sendo condenado. A maioria desses processos foi defendendo a porra do Bolsonaro. Quando eu chego e sento com ele, eu digo: 'cara, estou com muito processo aqui. Eu preciso que o partido me ajude, ou você'. E aí eu ouvi: 'a boca é sua, você falou, você se vira'. (...) Fui processado pela música popular brasileira, pelo Caetano, Gil e Chico e são todos meus amigos. Entrei em confronto com eles e perdi todas. E não tive ajuda. Eu passei esses últimos anos pagando um monte de coisa, mas foi em função de uma ideologia que hoje eu vejo completamente equivocada.
Frota aos 59
Eu hoje, com quase 60 anos, não tenho mais o mesmo vigor (...) Quando eu olho pra trás, eu penso: 'caraca, sobrevivi'. É como se eu tivesse ido remar contra uma onda de Nazaré [praia de ondas gigantes em Portugal]. Minha vida foi isso, fracasso, vitórias, fiquei rico, fiquei pobre, amei, chorei, vivi, viajei, porra, saí com todo mundo que eu podia sair e com quem eu não queria também, sabe? Fiz tudo que pude fazer. Eu devo ter uns 300 e vinte anos. (...) Cheguei aos 59, estou de boas, quero ficar vivo, quero ver minha filha completar 15 anos, procuro andar na linha. Perdi a vontade de fazer academia. Essa coisa de suplemento? eu fui escravo do corpo durante mais de vinte anos, não pode ter barriga, não pode não sei o que. O dia que eu fiquei com cabelo branco, falei: 'vou deixar ficar grisalho'. Não quero saber de porra nenhuma, quero comer pão com manteiga, quero viver.
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