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Efeitos no cérebro: por que todo mundo está exausto de conversar por vídeo

Allie/Unsplash
Imagem: Allie/Unsplash

Luiza Pollo

Colaboração para o TAB

08/05/2020 04h00

Se você está respeitando as medidas de distanciamento social por conta do novo coronavírus, suas conversas com amigos, há pelo menos um mês, têm sido online. Além das diversas reuniões por vídeo (para quem pode trabalhar de casa), o happy hour, os encontros amorosos e até os aniversários têm sido na tela — com as carinhas de todo mundo bem pequenininhas, muitas vezes numa confusão de "você está me ouvindo?", "opa, desculpa te interromper", "seu vídeo travou", entre outras falhas de comunicação.

Sentir-se exausto depois de uma longa conversa por vídeo é normal, e a exaustão é basicamente proporcional ao número de participantes da reunião. "Quanto mais gente para ouvir e observar, mais cansado nosso cérebro fica", explica Ronald Fischer, psicólogo e pesquisador do Instituto D'Or de Pesquisa e Ensino (IDOR) e da Victoria University of Wellington, na Nova Zelândia. "A questão crucial é o número de pessoas que estão na conversa. Em um programa como o Zoom, Teams, Skype ou outro, ter muita informação visual na sua frente é cognitivamente cansativo", afirma.

Isso acontece porque o nosso cérebro está programado para ficar atento principalmente a pessoas e animais, explica Fischer. É uma questão de sobrevivência. Então, mesmo sem perceber, somos estimulados a prestar atenção às expressões faciais e aos movimentos de todos os colegas que estão ali, na nossa frente. Diferente de olhar para uma única pessoa falando por vez, no computador ou no celular, todos estão te encarando — ou, pelo menos, essa é a sensação.

Linguagem corporal

Outro ponto cansativo é a perda de pessoalidade em uma conversa online. Não há espaço para um papinho paralelo, um comentário baixinho para um amigo que está no bar com você ou um olhar atravessado para um colega de trabalho que vai te entender do outro lado da mesa. "Quando você chega numa reunião no escritório, tem aquele papo no café, tem um tititi antes. Esse tititi, em geral, nós perdemos [no online]. Não tem um social que envolve o trabalho, não tem como olhar na expressão das pessoas se aquilo causou algum incômodo ou tédio. Com tanta gente, você perde a individualidade", explica a psicóloga Maluh Duprat, pesquisadora do Janus (Laboratório de Estudos de Psicologia e Tecnologias da Informação e Comunicação) da PUC-SP.

Em papos online, a nossa capacidade de "medir a temperatura" do ambiente também diminui. Sem a possibilidade de uma leitura corporal — que fazemos automaticamente quando estamos com outras pessoas —, é difícil saber quando interromper, se sua fala é bem-vinda, entre outras decisões que tomamos com base na percepção do comportamento dos outros. Ainda assim, nosso cérebro tenta buscar essas "dicas", sem sucesso.

"Acho que a gente perde um pouco a diversidade daquele ambiente, das pessoas que estão ali, e que, de alguma maneira, a gente captava melhor no offline. Há uma empatia entre alguns personagens, e no virtual isso se perde", avalia Duprat.

Sem feedback

Se entre colegas de trabalho ou alunos em um curso falta essa sensação de troca em grupo, para os chefes e professores, a comunicação em vídeo também gera uma grande perda: o feedback. Sem poder "ler" a sala de aula (ou a equipe) para procurar expressões de entendimento, concordância ou mesmo tédio, quem está liderando uma videochamada pode ficar um pouco perdido e até sentir certa falta de propósito, diz Duprat.

"Como que naquela fotinho você vai sentir — me colocando no lugar do professor — o interesse das pessoas? É quase impossível. Você não tem como saber se o sujeito foi fazer outra coisa, o quanto dele está ali", afirma. "Deve ser sufocante, uma sensação de quase inutilidade, você não tem feedback nenhum. Aí, acho que a gente percebe a intensidade da relação entre professor e aluno — e a necessidade de adaptarmos o modelo."

Dia da Marmota

Parte do nosso esforço cognitivo, principalmente da memória, também está ligado ao ambiente em que estamos. No trabalho, na sala de aula ou num bar com os amigos, os estímulos externos à conversa são comuns a todos. Fischer explica que isso ajuda a manter a atenção e também a fixar as informações trocadas naquele espaço.

Está sentindo que nada aconteceu nesses últimos dois meses, que os dias são exatamente iguais, mesmo que você tenha realizado projetos diferentes e conversado com diversas pessoas? Parte do problema pode vir do fato de você ter feito tudo isso em casa.

"Há alguns estudos demonstrando que a memória funciona melhor quando você se liga a ambientes específicos. Nós gravamos informações periféricas no nosso cérebro — e quando voltamos àquele ambiente, ele nos ajuda a lembrar da experiência. Então, podemos imaginar que, tendo sempre o mesmo ambiente o tempo inteiro, fica mais difícil para o nosso cérebro guardar todas essas reuniões", explica Fischer.

Dá para melhorar

A verdade é que não temos muita solução por enquanto, e vamos precisar manter a comunicação restrita ao online até que seja seguro voltar a encontrar mais gente. A boa notícia é que dá para diminuir esse cansaço mental.

Antes de mais nada, Fischer defende pensar duas vezes se uma chamada em grupo é realmente necessária ou se vale aplicar o bordão "essa reunião poderia ter sido um email". Limitar o número de participantes também ajuda.

Outra possibilidade é passar recados e conversar apenas por áudio, principalmente quando a conexão do vídeo for muito ruim. O especialista relata que os delays — pequenos atrasos na fala ou no vídeo causados pela demora na conexão — afetam negativamente a forma como vemos uns aos outros. Uma pesquisa de 2014 aponta que um delay de 1.2 segundo já é capaz de trazer ao nosso inconsciente com mais frequência a impressão de que a outra pessoa é menos amigável, menos ativa, tem menos autodisciplina, entre outros. E as ligações por telefone costumam apresentar esse problema com menor frequência.

Se for um primeiro encontro virtual, então, o conselho dos autores parece ser de evitar o vídeo. "A esquisitice aumenta se as pessoas não estão familiarizadas uma com a outra. Elas não têm conhecimento prévio da personalidade do outro ou como ele fala", afirma a pesquisadora Katrin Schoenenberg em um artigo sobre o estudo.

Simplesmente desligar a câmera também ajuda, se a chamada for mais uma apresentação do que uma troca de informações. Quem estiver conduzindo a conversa pode também usar uma apresentação de slides e compartilhar a tela com todo o grupo, trazendo a atenção de todos para um mesmo ponto, sugere Fischer. "A ideia é criar um espaço de atenção compartilhada", explica o pesquisador. "Se todos focam na mesma informação, isso geralmente ajuda a criar uma sensação de pertencimento a um grupo e diminui o isolamento."