TAB acompanha rotina de UTI e extubação de paciente em Maceió
Ao chegar para seu plantão em uma das UTIs (Unidades de Terapia Intensiva) da Santa Casa de Maceió, às 13h de uma quinta-feira, o médico intensivista Fábio Lima, 51, foi recepcionado com uma boa notícia: um dos pacientes seria extubado, ou seja, sairia da intubação.
A reportagem do TAB acompanhou o trabalho do médico e sua equipe durante o plantão em uma UTI com 10 leitos ocupados por pacientes de covid-19. Há no hospital mais 30 leitos de terapia intensiva, todos ocupados desde o início de março.
Para retirar o tubo, é preciso antes retirar a sedação do paciente, reduzir a medicação e a ventilação mecânica. O convalescente tem de estar acordado para voltar a respirar sem aparelhos. Isso começa com a análise de exames, em especial da gasometria (que analisa se o pulmão está funcionando melhor). "Nesse paciente chegamos a usar 70%, e depois de seis dias, com a melhora, a gente foi baixando até 25% para fazer a extubação."
Fábio vai conversando baixinho, debruçado sobre a cama. "Eu vou trabalhar um pouco seu pulmão, preciso da sua ajuda." De volta, recebeu um sinal positivo do doente com o polegar. A retirada do tubo é feita de forma pausada, com cuidado.
"O paciente foi colaborativo, foi tranquilo", comemora Fábio após retirar o tubo e colocar a máscara de Hudson, um tipo de ventilação não invasiva, mas que faz pressão sob os pulmões e ajuda na recuperação.
Sem férias
O procedimento de extubação foi o único daquela tarde. "Começar o plantão assim é sempre bom. Esse paciente está comigo desde 18 de fevereiro, ainda na fase clínica; depois subiu para a UTI e ficou 13 dias intubado. Chegou a ser dialisado [passou por hemodiálise]. Era um 'combo' de comorbidades, mas se recuperou. Um caso desses recuperado vale um mês de trabalho pesado, de noites mal dormidas", conta Lima.
O médico está sem férias desde o início da pandemia. Lima dá plantão quatro vezes por semana na UTI Neurológica de Santa Casa — que este mês voltou a ser destinada ao tratamento de covid-19, após o aumento de casos em Alagoas. "Ela reabriu no domingo e, na terça, já lotou. Agora são pacientes mais jovens. A gente nunca viu nada do que está acontecendo."
Fábio Lima é médico há exatos 30 anos, sendo 28 deles dentro de UTIs. Casado, pai de dois filhos, diz que perdeu o pai de um grande amigo para a covid-19. "Aqui na equipe, quem teve, foi leve", conta ele, que não teve a doença e está vacinado já com a segunda dose.
As vagas da UTI visitada pela reportagem são ocupadas por pessoas de atendimento particular, convênio e SUS (Sistema Único de Saúde). "Todos têm o mesmo tratamento, não muda nada", ressalta Lima.
Passagem de plantão
Por regra da Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária), cada médico fica em uma UTI com até 10 pacientes. São necessários, ainda, um enfermeiro e cinco técnicos de enfermagem. Na UTI visitada, havia 10 plantonistas. Uma psicóloga e uma fisioterapeuta completam o trabalho multidisciplinar, que recebe a visita de outros profissionais, como nutricionista e fonoaudiólogo do hospital.
Já devidamente paramentado ao assumir o plantão, Fábio Lima lê o prontuário de cada um dos internados. É ele que mostra perdas e ganhos, o balanço hidroeletrolítico (que aponta taxas de substâncias como sódio, potássio, cálcio no sangue) e sinais vitais. "De duas em duas horas, fazemos anotações de cada alteração", explica.
A primeira paciente visitada após a extubação foi uma senhora de 65 anos, intubada em estado bem grave. "O que temos de fazer aqui é manter bons índices com a ventilação e medicamentos adequados. Veja que a saturação dela com todo esse aparato está em 100%."
Sons e sinais
Soa um alarme. É hora de rever uma medicação para manter o paciente estável. São por esses ruídos que a equipe sabe os detalhes e apontamentos para cuidar de cada pessoa internada.
"Sem essa quantidade de suporte, essa paciente teria morrido", explica ele, enquanto uma técnica dá água a uma mulher para que ela reaprenda a engolir. Em seu segundo dia fora do tubo de respiração, a paciente faz uso de um cateter de oxigênio e ainda precisa de uma sonda para alimentação.
Todo planejamento do dia ocorre às 8h, com o momento em que chama de round. "É quando fazemos a visita interdisciplinar. Ali se decide tudo, e vamos executando. Na noite e na madrugada, a equipe cuida apenas de intercorrências", diz.
Um dia de sorte
"Hoje você deu sorte, está realmente calmo", afirma Lima à reportagem.
No corredor da UTI, porém, um carrinho para reanimação está pronto para qualquer emergência, com todos os equipamentos e medicamentos necessários para uma ressuscitação.
Na UTI, havia pacientes em todos os estados possíveis da doença. Desde aquele intubado há dias — com ou sem melhora — até os que estão prestes a descer para a enfermaria, após sair do tubo. Também há pessoas na fase inflamatória, a mais crítica da doença, quando podem apresentar piora repentina. "Isso acontece muito, principalmente com jovens: a gente dá as costas e piora. Por isso, aqui, não se pode desligar um minuto."
Dos 10 pacientes internados, quatro tinham menos de 50 anos. Dois eram jovens com menos de 40 que estavam conscientes e conversavam com a equipe. Por volta das 15h, a enfermeira Sabrina Montemor foi ao leito de um deles e segurou sua mão. É ela quem trabalha diariamente fazendo o gerenciamento da UTI.
"Aqui temos que ter essa relação próxima porque nós viramos a família dele. A covid-19 tem isso, é uma doença solitária. No caso de pacientes que estão acordados, nós fazemos videochamadas diárias com a família, em substituição à visita (que é proibida)", diz Montemor ao TAB.
Tratar jovens é um novo aprendizado para a equipe. "Todos os sintomas são exacerbados no jovem. Antes, o paciente dava tempo para você pensar numa estratégia melhor. Agora, tudo muda em questão de horas. As nossas decisões, hoje, precisam sempre ser antecipadas. Uma UTI é assim por essência, mas nunca foi tão intenso", diz Lima.
Quando é necessária uma intubação, Lima conversa com o paciente para avisar sobre o procedimento. Ele admite que esse é um momento de apreensão. "Precisamos sempre dizer o que vamos fazer e nem todos recebem bem a informação. Intubar, sem dúvida, é o momento mais crítico, mas não é o mais difícil."
Ao fim do plantão, a equipe comemora um dia sem baixas, sem agravamento e com boas notícias. "Seguimos na fé de dias melhores", suspira Lima.
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