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TAB acompanha rotina de UTI e extubação de paciente em Maceió

Médico Fábio Lima, no atendimento da UTI na Santa Casa de Maceió - Beto Macário/UOL
Médico Fábio Lima, no atendimento da UTI na Santa Casa de Maceió
Imagem: Beto Macário/UOL

Carlos Madeiro

Colaboração para TAB, de Maceió

26/03/2021 04h01

Ao chegar para seu plantão em uma das UTIs (Unidades de Terapia Intensiva) da Santa Casa de Maceió, às 13h de uma quinta-feira, o médico intensivista Fábio Lima, 51, foi recepcionado com uma boa notícia: um dos pacientes seria extubado, ou seja, sairia da intubação.

A reportagem do TAB acompanhou o trabalho do médico e sua equipe durante o plantão em uma UTI com 10 leitos ocupados por pacientes de covid-19. Há no hospital mais 30 leitos de terapia intensiva, todos ocupados desde o início de março.

Para retirar o tubo, é preciso antes retirar a sedação do paciente, reduzir a medicação e a ventilação mecânica. O convalescente tem de estar acordado para voltar a respirar sem aparelhos. Isso começa com a análise de exames, em especial da gasometria (que analisa se o pulmão está funcionando melhor). "Nesse paciente chegamos a usar 70%, e depois de seis dias, com a melhora, a gente foi baixando até 25% para fazer a extubação."

Fábio vai conversando baixinho, debruçado sobre a cama. "Eu vou trabalhar um pouco seu pulmão, preciso da sua ajuda." De volta, recebeu um sinal positivo do doente com o polegar. A retirada do tubo é feita de forma pausada, com cuidado.

"O paciente foi colaborativo, foi tranquilo", comemora Fábio após retirar o tubo e colocar a máscara de Hudson, um tipo de ventilação não invasiva, mas que faz pressão sob os pulmões e ajuda na recuperação.

Sabrina Montemor Sebastião, enfermeira de UTI da Santa Casa de Misericórdia de Maceió  - Beto Macário/UOL - Beto Macário/UOL
Sabrina Montemor Sebastião, enfermeira de UTI da Santa Casa de Misericórdia de Maceió
Imagem: Beto Macário/UOL

Sem férias

O procedimento de extubação foi o único daquela tarde. "Começar o plantão assim é sempre bom. Esse paciente está comigo desde 18 de fevereiro, ainda na fase clínica; depois subiu para a UTI e ficou 13 dias intubado. Chegou a ser dialisado [passou por hemodiálise]. Era um 'combo' de comorbidades, mas se recuperou. Um caso desses recuperado vale um mês de trabalho pesado, de noites mal dormidas", conta Lima.

O médico está sem férias desde o início da pandemia. Lima dá plantão quatro vezes por semana na UTI Neurológica de Santa Casa — que este mês voltou a ser destinada ao tratamento de covid-19, após o aumento de casos em Alagoas. "Ela reabriu no domingo e, na terça, já lotou. Agora são pacientes mais jovens. A gente nunca viu nada do que está acontecendo."

Fábio Lima é médico há exatos 30 anos, sendo 28 deles dentro de UTIs. Casado, pai de dois filhos, diz que perdeu o pai de um grande amigo para a covid-19. "Aqui na equipe, quem teve, foi leve", conta ele, que não teve a doença e está vacinado já com a segunda dose.

As vagas da UTI visitada pela reportagem são ocupadas por pessoas de atendimento particular, convênio e SUS (Sistema Único de Saúde). "Todos têm o mesmo tratamento, não muda nada", ressalta Lima.

Equipe da UTI na Santa Casa de Misericórdia de Maceió - Beto Macário/UOL - Beto Macário/UOL
Equipe da UTI na Santa Casa de Misericórdia de Maceió
Imagem: Beto Macário/UOL

Passagem de plantão

Por regra da Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária), cada médico fica em uma UTI com até 10 pacientes. São necessários, ainda, um enfermeiro e cinco técnicos de enfermagem. Na UTI visitada, havia 10 plantonistas. Uma psicóloga e uma fisioterapeuta completam o trabalho multidisciplinar, que recebe a visita de outros profissionais, como nutricionista e fonoaudiólogo do hospital.

Já devidamente paramentado ao assumir o plantão, Fábio Lima lê o prontuário de cada um dos internados. É ele que mostra perdas e ganhos, o balanço hidroeletrolítico (que aponta taxas de substâncias como sódio, potássio, cálcio no sangue) e sinais vitais. "De duas em duas horas, fazemos anotações de cada alteração", explica.

A primeira paciente visitada após a extubação foi uma senhora de 65 anos, intubada em estado bem grave. "O que temos de fazer aqui é manter bons índices com a ventilação e medicamentos adequados. Veja que a saturação dela com todo esse aparato está em 100%."

A UTI da Santa Casa de Misericórdia, em Maceió - Beto Macário/UOL - Beto Macário/UOL
Imagem: Beto Macário/UOL

Sons e sinais

Soa um alarme. É hora de rever uma medicação para manter o paciente estável. São por esses ruídos que a equipe sabe os detalhes e apontamentos para cuidar de cada pessoa internada.

"Sem essa quantidade de suporte, essa paciente teria morrido", explica ele, enquanto uma técnica dá água a uma mulher para que ela reaprenda a engolir. Em seu segundo dia fora do tubo de respiração, a paciente faz uso de um cateter de oxigênio e ainda precisa de uma sonda para alimentação.

Todo planejamento do dia ocorre às 8h, com o momento em que chama de round. "É quando fazemos a visita interdisciplinar. Ali se decide tudo, e vamos executando. Na noite e na madrugada, a equipe cuida apenas de intercorrências", diz.

Equipamentos que mantêm vivos os pacientes da Santa Casa de Misericórdia, em Maceió - Beto Macário/UOL - Beto Macário/UOL
Equipamentos que mantêm vivos os pacientes da Santa Casa de Misericórdia, em Maceió
Imagem: Beto Macário/UOL

Um dia de sorte

"Hoje você deu sorte, está realmente calmo", afirma Lima à reportagem.

No corredor da UTI, porém, um carrinho para reanimação está pronto para qualquer emergência, com todos os equipamentos e medicamentos necessários para uma ressuscitação.

Na UTI, havia pacientes em todos os estados possíveis da doença. Desde aquele intubado há dias — com ou sem melhora — até os que estão prestes a descer para a enfermaria, após sair do tubo. Também há pessoas na fase inflamatória, a mais crítica da doença, quando podem apresentar piora repentina. "Isso acontece muito, principalmente com jovens: a gente dá as costas e piora. Por isso, aqui, não se pode desligar um minuto."

Dos 10 pacientes internados, quatro tinham menos de 50 anos. Dois eram jovens com menos de 40 que estavam conscientes e conversavam com a equipe. Por volta das 15h, a enfermeira Sabrina Montemor foi ao leito de um deles e segurou sua mão. É ela quem trabalha diariamente fazendo o gerenciamento da UTI.

"Aqui temos que ter essa relação próxima porque nós viramos a família dele. A covid-19 tem isso, é uma doença solitária. No caso de pacientes que estão acordados, nós fazemos videochamadas diárias com a família, em substituição à visita (que é proibida)", diz Montemor ao TAB.

Tratar jovens é um novo aprendizado para a equipe. "Todos os sintomas são exacerbados no jovem. Antes, o paciente dava tempo para você pensar numa estratégia melhor. Agora, tudo muda em questão de horas. As nossas decisões, hoje, precisam sempre ser antecipadas. Uma UTI é assim por essência, mas nunca foi tão intenso", diz Lima.

Quando é necessária uma intubação, Lima conversa com o paciente para avisar sobre o procedimento. Ele admite que esse é um momento de apreensão. "Precisamos sempre dizer o que vamos fazer e nem todos recebem bem a informação. Intubar, sem dúvida, é o momento mais crítico, mas não é o mais difícil."

Ao fim do plantão, a equipe comemora um dia sem baixas, sem agravamento e com boas notícias. "Seguimos na fé de dias melhores", suspira Lima.