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Por que tantos ex-BBBs estão sorteando iPhones no Instagram?

Arthur Picoli, um dos ex-BBBs que sorteou iPhones após a eliminação no programa - Reprodução / Instagram
Arthur Picoli, um dos ex-BBBs que sorteou iPhones após a eliminação no programa Imagem: Reprodução / Instagram

Juliana Sayuri

Colaboração para o TAB, de Toyohashi (Japão)

11/05/2021 04h00

Pós-Big Brother Brasil, é do jogo capitalizar e fazer render, financeiramente, os 15 minutos de fama - muitas vezes recém-conquistada, principalmente entre os integrantes do núcleo "Pipoca" do reality show, o dos quase famosos.

Se nos tempos de Sabrina Sato (BBB 3) uma das maiores apostas eram ensaios nus para revistas como a Playboy, nos tempos de Juliette Freire (BBB 21) a estratégia mudou: com a visibilidade catapultada no programa, muitos têm investido nos seus perfis no Instagram como vitrines de outros objetos de desejo, sobretudo smartphones e smartwatches. Até agora, 10 dos 20 participantes da última edição já realizaram sorteios online, inclusive de iPhones - a mais recente foi Pocah, cujo sorteio está aberto até dia 12 de maio.

Mas o que está em jogo nessas ações?

Quem procura quem. Há diversas dinâmicas nos sorteios digitais: às vezes agências de influenciadores iniciantes procuram empresas; empresas e marcas procuram influenciadores diretamente; empresas e marcas procuram agências de influenciadores maiores e assim por diante. Há inclusive empresas que tentam triangular todo o processo, buscando produtos de determinada marca (um smartphone da Apple, por exemplo), bancados por patrocinadores (um ou muitos mais, que investem por cotas) e influenciadores (que fazem a propaganda). Para se ter ideia, a hashtag #sorteioiphone soma mais de 217 mil posts no Instagram - entre eles, anúncios buscando patronos para as ações. "Seja um patrocinador - sorteio relâmpago - ganho de 5k a 10k de seguidores", garante uma das publicações. "Quer crescer o seu Instagram aumentando o número de seguidores e a sua visibilidade? Venha ser um patrocinador do nosso próximo sorteio e tenha o seu Instagram nas regras para ser seguido!", escancara outra.

É do jogo? Em geral, alguém compra o iPhone para depois sorteá-lo. Esse alguém pode ser um patrocinador (uma empresa financia o "brinde", sob a condição de ser citada na ação e, assim, colher os follows do post) ou um influenciador, que paga do próprio bolso mesmo os celulares caros (um iPhone 12, o mais recente da gigante grife americana, custa cerca de R$ 10 mil). No saldo do sorteio, a expectativa é angariar seguidores, ter mais visibilidade, logo mais contratos e convites para campanhas publicitárias, as publis. "Pode parecer loucura que alguém compre um aparelho de R$ 10 mil para sortear, mas essa pessoa sabe que é um investimento. Tem influenciador que cobra R$ 50 mil para fazer um único stories. Então, o investimento mais que se paga", explica Renata Victal, diretora-executiva da empresa de marketing digital e de influência VCRP Tech. Em tese, é um jogo de ganha-ganha: influenciadores ganham novos seguidores e visibilidade; marcas, idem. Entretanto, o boom pode ser passageiro se eles não tiverem conteúdo a oferecer além das ações pontuais. "Pode-se perder tudo da noite para o dia. Tem uma máxima que diz 'conteúdo é rei' nas redes sociais e é preciso ter isso em mente. O que vai reter a audiência, os seguidores, o que vai garantir engajamento é um conteúdo de qualidade", destaca.

Quanto vale ou é por post. Um único sorteio pode render R$ 135 mil a um influenciador. Uma agência propôs um sorteio a uma das participantes "Pipoca" do BBB, com 8 milhões de seguidores, no qual cada patrocinador investiria R$ 4,5 mil para ser marcado na ação, reportou o jornalista Fernando Oliveira, do Buzzfeed Brasil. O ex-BBB Arthur Picoli recentemente sorteou seis iPhones 12 e, para participar, era preciso seguir a conta @premiosarthurpicoli e todos os perfis (os patrocinadores) por ela seguidos. Supondo que cada um dos 66 patrocinadores tenha desembolsado R$ 4,5 mil para ser marcado, isso renderia R$ 297 mil para um post que, dias depois, foi deletado da página oficial do influenciador. Na sexta (7) o resultado foi postado nos stories, que duram apenas 24 horas no ar; na segunda (10), o perfil @premiosarthurpicoli estava indisponível também. Além desses arranjos com patrocinadores, há influenciadores realizando sorteios via pagamentos feitos pelos seguidores via Pix. "Funciona como se fosse uma rifa virtual. Só que, antigamente, a gente sabia quantas pessoas estavam participando da rifa. Na internet, esse número é ilimitado. Então, se o influenciador faz um sorteio mediante um pagamento de R$ 5 via Pix e 50 mil pessoas participam, ele pode faturar R$ 250 mil. E, acredite, tem sorteio com muito mais de 50 mil participantes", diz Renata Victal, da VCRP Tech.

Encontre meu smartphone. O influencer paulista João Ferreira, o @JaoFerreira, já divulgou sorteio de smartphone e outros produtos a seu 1,5 milhão de seguidores, contratado por uma empresa, que foi a responsável por adquirir e entregar os prêmios. "A marca ganha um valor de cada patrocinador. Um exemplo: de 3 a 10k [seguidores] seria R$ 350; 70 patrocinadores daria R$ 25 mil; a marca investe R$ 5 a 10 [mil] de produto, R$ 5 [mil] do influencer, dá R$ 15 [mil] de lucro", ilustra o jovem músico sobre os bastidores de uma ação do tipo, cujo valor é negociado de acordo com o tempo na timeline dele. "Assim que o organizador faz o pagamento, você [influenciador] faz uma foto, que pode ser em uma mesa vazia", conta. Quer dizer, às vezes eles podem posar apenas com as caixas, outras nem isso: os produtos são incluídos a posteriori, na edição da imagem. "Não é que o prêmio não existe, o prêmio existe, só que está na casa do criador do sorteio", explica Jão, que incentiva organizadores a gravar um vídeo mostrando que o prêmio é real. Quem o auxilia a conferir a idoneidade dos contratantes é o estrategista digital e consultor artístico Raphael Hoffman, da New Beat Music. "Não é uma transação simples, precisa de muito cuidado. Muitas vezes, o influenciador é cobrado por promessas oferecidas pelo contratante. Caso o prêmio não seja entregue [ao vencedor] ou a expectativa do número de seguidores [ao patrocinador] não seja atingida, acaba gerando danos à reputação e imagem do influenciador", diz Hoffman.

É legal? Depende. "Sorteio é uma forma muito interessante de promover interação e engajamento. As pessoas adoram. Porém, é preciso entender que qualquer prática dessa modalidade deve estar sujeita à legislação", diz Isis Vasques, diretora-executiva da Agência Ecco.

- 1º: segundo a Lei 5.768, pessoa física não pode realizar sorteios, só pode pessoa jurídica.
- 2º: de acordo com a Secretaria Especial do Ministério da Fazenda, é preciso conseguir uma autorização para realizar as ações junto ao Sistema de Controle de Promoção Comercial, mediante o pagamento de taxa de fiscalização que varia de R$ 27 a R$ 66 mil.
- 3º: há prazo para a autorização da Sefel (Secretaria de Acompanhamento Fiscal, Energia e Loteria), que varia de 40 a 120 dias antes do início da promoção.
- 4º: depois do sorteio, é preciso prestar contas, o que inclui ata detalhada do processo e recibos assinados pelos ganhadores.
- 5º: a Lei 13.709, que estipula diretrizes para transações online, regula o uso de informações pessoais como CPF e RG, que às vezes são pedidos nessas ações comerciais.
- 6º: além das leis brasileiras, o Instagram tem suas próprias regras e uma delas diz que é proibido "incentivar usuários a marcar conteúdo de maneira inadequada".
Se o sorteio está dentro disso tudo, não é ilegal. Se está fora, empresas podem ser penalizadas, proibidas de realizar outras promoções comerciais por 2 anos e ficam sujeitas a multa de até 100% do valor total dos prêmios ofertados. O primeiro sinal de que uma ação está fora das regras é a ausência do número de certificado da Sefel, que deve estar visível nos posts, diz Vasques. Basta zapear o Instagram para conferir que a imensa maioria dos posts não inclui nenhum número de autorização. "Na maioria dos casos, não há má intenção e mesmo quem promove nem está ciente de todas essas regras", pondera. "Se for um influenciador que você siga e admire, vale primeiramente um questionamento, pois, muitas vezes, ela desconhece as regras. No caso de marcas, em ações nas quais o consumidor sinta-se lesado, é o caso de denunciar à Sefel."

Dados viciados. Para Luísa Barwinski, professora do curso de marketing da PUC-PR (Pontifícia Universidade Católica do Paraná), sorteio é um tipo de estratégia "artificial" para aumentar o número de seguidores, que muitas vezes deram follow de olho no prêmio - e não do conteúdo dos influencers. "Ex-BBBs que estão fazendo sorteios de iPhone estão caindo em uma velha pegadinha do mercado. Como pretendem capitalizar a fama que conquistaram a partir da participação no programa — e também tendo por base o fenômeno Juliette neste quesito — eles tentam aumentar o número de seguidores com ações artificiais", critica. "Sorteios sempre geram movimento nas redes. Mas fazer um sorteio de iPhone mostra que o influenciador não está preparado no momento e não tem um planejamento de presença digital e conteúdo para dar sequência no engajamento do seu público", acrescenta. As especialistas ouvidas pela reportagem do TAB destacam que as personalidades devem se inteirar das leis junto a equipes especializadas, incluindo assistência jurídica e agências de publicidade. Cada um, afinal, sabe onde o calo aperta.